
A dádiva
Desconfio que, pela primeira vez no ofício de cronista, sou obrigado a dar razão a todos na questão do rio São Francisco. Antes de pensar em transpor um rio, há que haver rio e, do jeito que está, em breve não haverá o que transpor.
Desconfio que, pela primeira vez no ofício de cronista, sou obrigado a dar razão a todos na questão do rio São Francisco. Antes de pensar em transpor um rio, há que haver rio e, do jeito que está, em breve não haverá o que transpor.
Não costumo adotar decisões radicais para uso próprio, mas as aprecio nos outros. Tive um amigo de juventude que iniciou greve de fome para convencer uma vizinha a dar para ele, quase ia conseguindo, mas desistiu na última hora, não sei até hoje por qual motivo.
Acontinuarmos a romaria do anticlímax do mensalão, a Polícia Federal pede mais tempo para chegar a conclusões sobre o toma-lá-dá-cá dos parlamentares denunciados. As CPIs, por seu lado, querem prazos indeterminados, também, para completar as suas investigações. E o ex-deputado Roberto Jefferson insiste na retirada da denúncia contra José Dirceu, estopim da crise. Fique o dito pelo não-dito.
Nova York . Viajar não é somente conhecer, é também reconhecer. Há 45 anos, visitei os Estados Unidos pela primeira vez, como observador na 16ª Assembléia Geral das Nações Unidas. Era o tempo da descolonização. Caía o velho sistema dos impérios, com países explorados por outros, ricos, quase todos na Europa, os segundos, e os primeiros na África. No Oriente Médio, os ingleses, ganhadores da Segunda Guerra Mundial, viam cair os seus protetorados, encharcados em bacias gigantescas de petróleo.
Deus é testemunha -gosto de invocar o Todo Poderoso, no qual às vezes creio, às vezes não, de acordo com o tempo, o modo e a circunstância. Sobretudo quando estou mentindo, o que não é o caso, principalmente agora, quando a verdade não vale e, se valesse, dava na mesma. A invocação é para afirmar que não aprecio solenidades, sejam quais forem. Houve época em que havia solenidade em tudo, principalmente nos enterros, quando Estado e Igreja não haviam se separado pelos ideais e costumes republicanos.
Não votarei no plebiscito sobre a proibição das armas de fogo. Se fosse obrigado ao voto, o anularia propositadamente, e lucidamente. Trata-se de um escapismo, uma forma que a tal sociedade ética e transparente encontrou para, mais uma vez, empurrar com a barriga um dos problemas mais agudos de nosso tempo: a violência. Com pequenas alterações, pode-se usar a comparação do termômetro. Proíba-se a compra e o uso dos termômetros e não haverá mais febre no país.
Austregésilo de Athayde, hoje sepultado no glorioso Mausoléu que ele mesmo, com o seu pragmatismo e vocação de grandeza, construiu para a nossa tranqüilidade pessoal, foi um acadêmico perfeito. Para ele, o ato de morrer deve ter sido uma desagradável surpresa, já que só acreditava na morte dos outros, especialmente na dos seus pares.
Dom Luiz Cappio, o bispo franciscano de Barra, na Bahia, iniciou há oito dias greve de fome para paralisar o projeto de inversão das águas do São Francisco, que ora começa em Cabrobó. Só bebe água do rio, mantém ainda inalteráveis os sinais orgânicos e sentado numa cadeira branca de plástico, abençoa os romeiros chegados ao seu pastor em trinta anos de presença abnegada junto à população ribeirinha.
A saudável vida universitária proporciona permanentemente novos conhecimentos. Foi o que ocorreu no campus Ibirapuera da UniFMU, quando o professor Edevaldo Alves da Silva reuniu o neurologista José Salomão Schvartzman e a médica e pesquisadora Ana Beatriz Barbosa Silva (ambos da Academia das Ciências de Nova York) para discutir um tema de grande atualidade: transtornos devidos aos déficits de atenção.
Um dos salmos mais conhecidos (e bonitos) atribuídos ao rei Davi é o 137, que chegou a ser musicado por alguns compositores profanos. "Junto aos rios de Babilônia nos sentávamos e chorávamos, nos lembrando de ti, oh, Sião! E nos ciprestes pendurávamos as nossas harpas. Os que nos levaram cativos pediam uma canção para que os alegrássemos, dizendo: "Cantai uma canção de Sião". Como cantaremos a canção do Senhor em terras estranhas?".
Há mais de meio século escrevi uma série de artigos sobre um tema que me apaixonava: Jornalismo e Literatura. Trabalhava eu, naquele tempo, em jornal, onde cheguei a fazer de tudo: editorial, crítica literária, crítica de teatro e de cinema, crônica, reportagem, inquéritos, coluna social, cobertura de futebol (fiz artigos diários no decorrer da Copa de 50) e até um consultório sentimental.
No final dos anos 60, passei uma temporada em Cuba e de lá escrevi, por vias transversas, uma carta ao meu editor Ênio Silveira, da Civilização Brasileira, um dos poucos amigos que sabia onde eu estava. Na carta, deixei escapar um comentário que o próprio Ênio divulgou entre os iniciados que freqüentavam sua editora naquele tempo e circunstância.
Vovós tiram a roupa por hospital infantil. Doze senhoras decidem posar nuas em calendário para levantar recursos destinados a um hospital de câncer infantil. O grupo de voluntárias inspirou-se no filme "Garotas do Calendário", do diretor Nigel Cole, e decidiu tirar a roupa para levantar fundos para a instituição. Nuas e segurando flores, fizeram fotos para o calendário. Folha Cotidiano, 25.09.2005
Pouquíssimas vezes fui obrigado a concordar tanto e tamanhamente com o presidente Lula. Sua Excelência declarou, na semana passada, que é a favor da reforma política e, sobretudo, que é necessário, para início dos trabalhos, "moralizar a base".
A proteção de bens imateriais, ou seja, aqueles que não são físicos, como prédios e esculturas, tem sido defendida há muitos anos no Brasil, e atende à preocupação de entidades internacionais, que têm se dedicado com afinco ao tema. A Unesco, por exemplo, através de sua "Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial", de 17 de outubro de 2003, considera incluídas nesta categoria as "práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante do seu patrimônio cultural". Em 1936, quando produzia, a pedido de Gustavo Capanema, o texto do anteprojeto que criaria o então Serviço de Proteção do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), o escritor Mário de Andrade já falava da importância de se preservar as manifestações culturais. Por essa iniciativa, ele é considerado um dos precursores do tema no país. Com base no preceito constitucional, algumas manifestações não-materiais já estariam devidamente protegidas. Mas, na verdade, falta a regulamentação, para que se saiba realmente o que deve ser amparado. Em 1996, em função das comemorações dos 500 anos do Descobrimento do Brasil, foi criado, através de decreto, o Museu Aberto do Descobrimento, no Monte Pascoal, na Bahia, o primeiro local avistado no Brasil pelos portugueses da fragata de Pedro Álvares Cabral. O decreto assinado em 22 de abril de 1996 era ambicioso: rios, povos indígenas e paisagens fariam a composição de um espaço que abrigaria toda a costa do descobrimento, uma área de 1,2 mil quilômetros quadrados. A idéia não vingou. No dia 4 de agosto de 2000, o então presidente Fernando Henrique Cardoso assinou o decreto 3.551, instituindo a proteção legal para patrimônios não-materiais, que seriam os elementos do nosso folclore, as festas, as danças e as diversas manifestações culturais e religiosas. Pelo decreto, o bem não seria propriamente tombado, mas sim registrado em quatro livros diferentes: dos Saberes, de Celebrações, das Formas de Expressão e de Lugares.