Essa publicação faz parte da coleção Revista Brasileira

Editorial
Rosiska Darcy de Oliveira
Ocupante da Cadeira 10 na Academia Brasileira de Letras.
É fácil reconhecê-lo. A mesma face assustadora, embora maquiada com a ajuda poderosa de novas tecnologias e de velhos expedientes, que usam instrumentos da democracia para miná-la. Essa perversão tem a digital do autoritarismo, que se amplia rapidamente nas democracias ocidentais. O fantasma volta a assombrar quem insiste em pensar pela própria cabeça. Atenta à ameaça, o autoritarismo entra em pauta na Revista Brasileira.
“Manter as luzes acesas até que o dia amanheça”, aconselha o Ministro Luís Roberto Barroso, em seu artigo.
Sim, somos gente de letras, o que nos ilumina são as luzes da cultura, a liberdade e a esperança.
Intelectuais, escritores, jornalistas e artistas costumam ser os mais agredidos pelo dedo em riste de quem aponta os “culpados” por tudo que o autoritarismo abomina e insiste em proibir. A liberdade assusta e é por medo que sobre a criação se desencadeia a fúria autoritária.
Um retrato de Ferreira Gullar revive o poeta, um exilado pelo autoritarismo, que o pisar tantos chãos fez cada vez mais livre e mais brasileiro. Foi na aflição do exilio que ele escreveu o Poema sujo contra a poesia bem-comportada. É Gullar quem nos protege contra as intolerâncias de todo gênero. E que se mostra indelével para outros poetas igualmente inquietos, presentes aqui: Leminski e Antonio Cicero. A poesia, com certeza, mantém a luz acesa.
Na contramão do autoritarismo, o cinema de João Moreira Salles se pergunta sobre o seu direito de filmar em nome dos que não têm câmera e inova o documentário com a coautoria do
coletivo indígena Lakapoy. Conversando com João e Txai Suruí aprende-se que lutar contra o autoritarismo é também prestar atenção ao outro, ao diferente, exercício de escuta que, introjetado, garante o respeito mútuo.
A sociedade brasileira é surpreendente e avança por encontros improváveis. A alta literatura desfila na Avenida, vestida com a fantasia das camadas menos letradas e são elas que melhor comunicam a um público amplo e entusiasta o sentido profundo de nossas grandes obras, que contam nossa história. Milagres do irreverente Carnaval, bem conhecidos de Luiz Antonio Simas.
Esse ano, o Rio de Janeiro é a Capital Mundial do Livro, escolha significativa que honra e alegra a cidade. Vamos aos livros e autores que iluminam o Rio e o Brasil.
A Academia Brasileira de Letras está na linha de frente dessas comemorações da arte da escrita e do prazer da leitura. “O Rio de Janeiro continua lendo.” Junte-se a nós. Daqui para frente ofereça um livro de que você gostou a alguém de quem você gosta. Sempre. Oferecer um livro é convidar para uma viagem, propor uma discussão, alargar o campo do possível. É acender uma luz.
Fantasmas gostam de trevas. É preciso manter a luz acesa.