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Artigos

  • Sobre a Comissão da Verdade

    A Comissão Nacional da Verdade, cujos qualificados membros foram empossados na semana passada, insere-se no âmbito do que se denomina justiça de transição, que diz respeito aos modos como, na passagem de regimes autoritários para a democracia, uma sociedade lida com um passado de repressão e violência. Comissões de Verdade são uma instância ad hoc com objetivo básico de apurar, num prazo determinado (dois anos no caso desta), fatos sobre graves violações de direitos humanos. Partem do pressuposto de que podem oferecer mais benefícios para a consolidação da vida democrática de uma sociedade do que a judicialização de processos políticos. A Comissão da Verdade não é o marco zero da justiça de transição no Brasil. Tem como antecedentes a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos, do governo Fernando Henrique Cardoso, bem-sucedida experiência de reparação aos familiares de mortos e desaparecidos entre 1961 e 1985, e a Comissão de Anistia, que desde o governo Lula propicia medidas indenizatórias de reparação apessoas atingidas por atos arbitrários cometidos antes da promulgação da Constituição de 1988. A Comissão da Verdade deverá examinar e esclarecer graves violações de direitos humanos a fim de efetivar um direito à memória e à verdade histórica. Suas atividades não terão caráter jurisdicional ou punitivo. Ou seja, ela nem pune, pois não é justiça de transição retributiva (em consonância com a Lei da Anistia de 1979, que o STF considerou válida), nem indeniza, até porque da justiça de transição de reparação trataram as duas comissões acima mencionadas. Seu foco recairá sobre as circunstâncias que cercaram a vigência do regime autoritário e deverá cumprir papel de relevo para a afirmação dos valores democráticos, que é a sua razão de ser. No que diz respeito à função da justiça, lembro que a comissão poderá receber testemunhos. A amplitude desses testemunhos lhe permitirá fazer uma justiça asseguradora das múltiplas vozes do sofrimento das vítimas e de seus familiares, a quem restituirá institucionalmente dignidade, por obra, para falar com Hannah Arendt, do poder redentor da narrativa e da diferença entre o descrever e o ouvir. O papel da comissão não se confunde com o da anistia. Anistia, palavra de origem grega, significa esquecimento e tem proximidade semântica, e não apenas fonética, com amnésia. A anistia coloca-se desde Atenas, depois da vitória da democracia sobre a sangrenta oligarquia dos 30, sob o signo da utilidade política de apaziguamento das tensões de uma sociedade, e não sob o signo da verdade. Não é um perdão. É um esquecimento, juridicamente comandado, de atos cometidos de natureza penal. Esse esquecimento comandado, que alcança atos do governo e dos que a ele resistiram, foi, nesses termos, juridicamente reconhecido como válido pelo STF. Não exclui, no entanto, a afirmação de um direito de titularidade coletiva da cidadania brasileira, a memória da verdade factual de graves violações de direitos humanos. Para assegurar este direito a comissão foi criada.

  • O Brasil, sua gente e o Oriente Médio

    O Itamaraty realizou em 10 de julho mesa-redonda sobre a construção da paz no Oriente Médio, a partir do ângulo dos insumos criativos que a esse processo possam dar expoentes das comunidades de origem árabe e judaica de países do Mercosul. O chanceler Antonio Patriota teve a gentileza de me convidar para participar do debate, mas a ele não pude comparecer por estar no mesmo dia em Washington com o presidente Fernando Henrique Cardoso, que ali recebeu o prestigioso Prêmio Kluge. Mas gostaria de aqui registrar algumas reflexões sobre o tema, que são basicamente as que tive a oportunidade de transmitir ao chanceler.

  • Visões da crise

    O Instituto Fernando Henrique Cardoso colocou no You Tube (http://bit.ly/YweALT) um debate fechado realizado em setembro do ano passado sobre o livro do economista José Roberto Affonso “Keynes, Crise e Política Fiscal”, com a participação do ex-presidente e do ex-ministro Delfim Netto, além de vários economistas de diferentes correntes: Roberto Macedo, professor da USP e da FAAP, próximo dos tucanos; Julio Gomes de Almeida, professor da UNICAMP, primeiro secretário de política econômica de Guido Mantega, e orientador da tese de doutorado de Affonso que originou o livro; José Carlos Braga, também da UNICAMP, irmão do senador Eduardo Braga, identificado com o PT e Samuel Pessoa, é pesquisador da FGV, que foi assessor do ex-senador Tasso Jereissatti, também presente ao encontro.

  • Visão social

    Um dos temas mais interessantes do debate promovido pelo Instituto Fernando Henrique Cardoso em torno da atualidade do economista britânico John Maynard Keynes (1883-1946) diante da crise financeira que se abate sobre o mundo desde 1998 foi o destaque dado ao lado social de suas teorias, ressaltado pelo ex-ministro Delfim Netto e por Julio Gomes de Almeida, professor da UNICAMP.

  • A casa do "soft power"

    Ao definir a Academia Brasileira de Letras como “a Casa do “soft power”, na abertura de mais um ciclo de debates, o historiador José Murilo de Carvalho deu a dimensão exata do papel que a ABL está assumindo na cultura nacional. A presidente da ABL, escritora Ana Maria Machado, disse que o ciclo é uma maneira de a Academia tratar a cultura ligando tradição e futuro. O ciclo “Futuros do presente: o Brasil imaginado” começou na última terça-feira com uma palestra do ex-presidente e acadêmico eleito Fernando Henrique Cardoso sobre “o futuro nacional do Brasil”, onde ele ressaltou a importância da cultura brasileira no relacionamento do país com a globalização, destacando que no mundo multipolar atual, o “soft power” é mais importante do que as guerras tradicionais.

  • Reinventar a democracia

    Definido pelo acadêmico Celso Lafer, seu amigo e ex-ministro, no discurso de recepção à Academia Brasileira de Letras como quem “preocupado com a igualdade não dissociada da liberdade, e impelido pelo amor ao Brasil, construiu um novo patamar de possibilidades para o nosso país e a nossa sociedade”, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso aproveitou o discurso de posse na cadeira 36 para revelar sua preocupação com o momento por que passa o país, um “sentimento de incompletude” que tem em relação à nossa democracia, afirmando que “se a arquitetura institucional está quase acabada (ainda se vêem andaimes), falta o essencial: a alma democrática”.

  • PSDB na rede

    Ainda muito atrasado em relação ao PT no uso das novas tecnologias de comunicação, o PSDB tem em Fernando Henrique Cardoso, seu presidente de honra, um entusiasta das novas redes sociais como instrumento político. Amigo do sociólogo Manuel Castells, talvez o maior especialista em novas mídias, o ex-presidente critica os partidos políticos que “se acomodaram às práticas, desdenham da relação direta com as comunidades”, sem se darem conta de que estamos assistindo aos primórdios da fusão entre a “opinião pública” e a “opinião nacional”.

  • Sinais alarmantes

    Finalmente fez-se justiça no caso do mensalão. Escrevo sem júbilo: é triste ver na cadeia gente que em outras épocas lutou com desprendimento. Estão presos ao lado de outros que se dedicaram a encher os bolsos ou a pagar suas campanhas à custa do dinheiro público. Mais melancólico ainda é ver pessoas que outrora se jogavam por ideais — mesmo que controversos — erguerem os punhos como se vivessem uma situação revolucionária, no mesmo instante em que juram fidelidade à Constituição. Onde está a Revolução? Gesticulam como se fossem Lenines que receberam dinheiro sujo, mas usaram-no para construir a “nova sociedade”. Nada disso: apenas ajudaram a cimentar um bloco de forças que vive da mercantilização da política e do uso do Estado para perpetuar-se no poder. De pouco serve a encenação farsesca, a não ser para confortar quem a faz e enganar a seus seguidores mais crédulos.

  • Mudar, com pé no chão e visão de futuro

    As pesquisas eleitorais estão a indicar que os eleitores começam a mostrar cansaço. Fadiga de material. Há doze anos o lulo-petismo impõe um estilo de governar e de se comunicar que, se teve êxito como propaganda, demonstra agora fragilidade. Toda a comunicação política foi centralizada, criou-se uma rede eficaz de difusão de versões e difamações oficiais pelo país afora, os assessores de comunicação e blogueiros distribuem comunicados e conteúdos a granel (pagos pelos cofres públicos e pelas empresas estatais) e se difundiu o “Brasil Maravilha”, que teria começado em 2002. Ocorre que a realidade existe e que às vezes se produz o que os psicólogos chamam de “incongruências cognitivas”. Enquanto os efeitos das políticas de distribuição de renda (criadas pelos tucanos) eram novidade e a situação fiscal permitia aumentos salariais sem acarretar consequências negativas na economia, tudo bem. O cântico de louvor da propaganda encontrava eco na percepção da população.

  • Luta política

    Poucos dias depois de ter sido eleito presidente da Câmara no primeiro governo petista, o então desconhecido deputado federal João Paulo Cunha, em conversa com jornalistas em que eu estava presente deu uma explicação singela para o fato de o PT passar a apoiar uma reforma da Previdência que nos oito anos anteriores, no governo de Fernando Henrique Cardoso, combatera ferozmente. “Luta política”, resumiu, sem o menor pingo de constrangimento, mesmo confrontado com os prejuízos que essa atitude causara ao país que agora seu partido governava.

  • Em busca do rumo

    Quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso entrou no cine Cultura ontem pela manhã em São Paulo para a abertura do seminário organizado pelo seu Instituto para comemorar os 20 anos do Plano Real, ninguém aplaudiu de imediato. Foi preciso que o ex-ministro José Gregori, com seu vozeirão, puxasse as palmas, reclamando de pé: “Ninguém aplaude. Que partido é esse?”. O auditório então veio abaixo.

  • Clima de traição

    O que esta crise política está demonstrando, mais uma vez, é que o modelo de “presidencialismo de coalizão” que montamos no Brasil é na verdade distorcido por adaptações que acabam transformando-o em um “presidencialismo de cooptação”, como definiu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso recentemente.

  • A que ponto chegamos!

    Eu, como boa parte dos leitores de jornal, nem aguento mais ler as notícias que entremeiam política com corrupção. É um sem-fim de escândalos. Algumas vezes, mesmo sem que haja indícios firmes, os nomes dos políticos aparecem enlameados. Pior, de tantos casos com provas veementes de envolvimento em “malfeitos”, basta citar alguém para que o leitor se convença de imediato de sua culpabilidade. A sociedade já não tem mais dúvidas: se há fumaça, há fogo.

  • O desmazelo fiscal

    Alguns analistas repetem o refrão: vistos em conjunto os governos Itamar Franco/Fernando Henrique e Lula/Dilma serão percebidos no futuro como uma continuidade. Houve a estabilização da economia, as políticas sociais foram ativadas e a democracia, mantida.