Passei uns dias fora, sem ler jornais ou ver televisão. Deve ter sido esse afastamento fugaz das notícias a razão por que, ao voltar ao convívio delas, tomei um susto. Bastaram esses dias para minha perspectiva se apurar, por assim dizer, e eu sentir em cheio a assombrosa desvergonha a que chegaram o Brasil e suas instituições. Com perdão da má pergunta, que país é este, meu Deus do céu? Resolvi tomar a liberdade de dizer o que me parece no momento, sem eufemismos ou ressalvazinhas bestas, embora, é claro, me arrisque bastante. Posso ter meu sigilo bancário aberto - o que certamente provocaria frouxos de riso nos bisbilhoteiros -, assim como qualquer outro sigilo, pois o governo demonstrou que não merece confiança e é destituído de escrúpulos. Portanto, nenhum dos nossos dados a que é garantida confidencialidade está seguro. Ou de repente escarafuncham meu passado e descobrem um contemporâneo capaz de jurar que eu colei numa prova de latim do ginásio e portanto passei fraudulentamente, o que será considerado crime hediondo por algum tribunal desses do Executivo, que por aí abundam. Finalmente, como não empregarei eufemismos, não é impossível que me acusem de calúnia, difamação ou injúria e eu venha a ser condenado pelo que se considerará um ou mais desses crimes, apesar de que, no meu parecer, se trataria de delito de opinião, figura que não existe, mas que pode perfeitamente ser posta em prática, sob nomes artísticos que lhe emprestem a aparência de legitimidade.