Obra do Acadêmico Moacyr Scliar é celebrada em evento virtual
Publicada em 19/10/2021
Publicada em 19/10/2021
Publicada em 10/05/2021
Publicada em 07/05/2021
Para quem prega programação para tudo, a vida desmente. Tudo determinado, muda-se em um instante. Um mês atrás tive um encontro com Marco, pri-mo-irmão, mais irmão que primo, ele parecia ter vencido um câncer. Ao sair, combinamos nos revermos logo. Dez dias atrás estávamos com tudo pronto para irmos a Minas, queríamos o silêncio e o verde. íamos descer para o carro, veio a notícia, Marco tinha morrido.
Segmento de meu romance Deus, Diga Logo o Que Quer!, que segue na linha do filme de Tais Araújo e Lázaro Ramos e que acabei de entregar à editora: 'Venha Neluce, corra ou vai perder. Venha logo! Está acabando. Não disse, meu amor, eles se foram. Os últimos negros do país. Para onde estão indo? Lembra-se como o Desatinado (seu nome é impronun-ciável) reclamava? 'Não há como enterrar brancos, imaginem esses estranhos.' Ele quer uma nação de brancos, loiros e ruivos, de olhos azuis, saudáveis, bem armados. 'Como um miserável vai segurar o fuzil? O coice acaba com ele!', grita do seu cercadinho. Passaram por aqui aos milhares, não sei para onde vão. Gostam de dançar, beber cachaça, sambar. Trabalhar? Nada. Neluce. Você precisa sair desse quarto, meu amor. A vida acabou para você? Não tem interesse em nada? Onde está a minha Neluce?
Nesta vida já vi bastante. E nem queiram saber o quanto ouvi. Não tanto quanto gostaria de ouvir, ver e viver, mas aí teria de ser alguém excepcional. Não sou. Mesmo assim vivi na semana passada, um momento de emoção. A posse de Fernanda Montenegro na Academia Brasileira de Letras. Resistência, simbolismo. Vi da primeira fila. Quando entrei descobri que ao lado de Rosiska Darcy, havia um lugar vago, sentei-me e fiquei olhando direto para Fernanda, majestosa.