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ABL na mídia - Folha de São Paulo - Cacá Diegues, um cineasta com vocação para o social e o cinema novo

 

Sou dos primórdios do movimento cineclubista. O meu início se deu na década de 1980, na zona oeste do Rio de Janeiro, meu local de origem. Com um grupo de amigos, percorríamos praças públicas, espaços cedidos por clubes e igrejas e, com um projetor portátil, fazíamos sessões de cinemas gratuitos, seguidos de bate-papos e debates.

Eram os tempos áureos do projeto da indústria cinematográfica brasileira. Tínhamos a Embrafilme, a maior produtora de filmes do país, que se destacava como ponta de lança no mercado do audiovisual.

A morte do cineasta Cacá Diegues, na semana passada, me fez recordar minha fase de cineclubista e da antiga Embrafilme. A primeira recordação tem a ver com a minha paixão pelo cinema desde menino, frequentando o Cineteatro Realengo, uma sala fundada em 1938 e que comportava mais de mil telespectadores num grande salão com cadeiras acolchoadas e tapetes na entrada.

Nas tardes de domingo, era emocionante adentrar aquele espaço, que oferecia o conforto necessário para assistir filmes de aventuras ou de disputas entre mocinhos e bandidos, heróis e vilões. Era o único lugar que eu tinha a permissão de minha mãe de ir sozinho ou na companhia dos meus amigos, e todos, como eu, entrados na adolescência. Hoje o Cineteatro Realengo, lastimavelmente, como todos os chamados cinemas de rua, está transformado em templo religioso.

As sessões de cinema assistidas quando garoto me levaram ao cineclube de bairro. Lembro-me que um dos filmes de grande sucesso que exibimos, "O Homem que Virou Suco", estrelado por José Dumont e dirigido por João Batista de Andrade, causou sensação e gritinhos na plateia por causa das cenas de sexo e dos versos repentistas do personagem, repetidos durante a exibição. Esse filme lançou o ator Dumont em circuito nacional. Na companhia dele, percorremos muitos lugares do subúrbio carioca, alimentava o sonho de muitos meninos e meninas em ser atores e atrizes.

O subúrbio, dos anos 1950 em diante, transformou-se em verdadeiro celeiro de arte e cultura. Em Madureira, Zaquia Jorge, vedete e empresária, pontificava com sua casa de espetáculo. Por último, Waldir Onofre, cineasta e ator, se firmava na direção com seu engraçadíssimo "As Aventuras Amorosas de um Padeiro", estrelado por Paulo César Pereio.

A história com Cacá Diegues vem logo depois. E tem a ver com a Embrafilme, como quase tudo que se fez no cinema nacional a partir de 1969. Diegues já havia feito filmes de sucesso de bilheteria, como "Xica da Silva" e "Bye, Bye, Brasil". Mas em março de 1990, ele quase deu com "os burros-n’água", como se dizia antigamente, quando Fernando Collor de Melo, então presidente da República, decreta a extinção da Embrafilme às vésperas do lançamento do seu filme "Dias Melhores Virão", com Rita Lee no elenco e também autora da música-tema, de enorme popularidade à época.

Cacá Diegues não era apenas profissional de cinema, era um artista cinematográfico e fundador do cinema novo. A sensibilidade social é fator que se destaca em sua biografia.

Filmou belas histórias sobre a questão negra, como em "Xica da Silva", "Ganga Zumba", "Quilombo" e "Orfeu". Seu legado fica. Vai deixar saudades.

Matéria na íntegra: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/tom-farias/2025/02/caca-diegues-um-cineasta-com-vocacao-para-o-social-e-o-cinema-novo.shtml

19/02/2025