O presidente Lula colocou o país que governa numa situação difícil diante da comunidade internacional. Se não estivesse por lá o assessor especial Celso Amorim “buscando a verdade”, poderíamos ter uma posição diplomática mais condizente com a realidade. Como disse o presidente do Chile, o esquerdista Gabriel Boric, “é difícil de acreditar” que Maduro tenha recebido 51% dos votos de um eleitorado limitado aos cidadãos que o próprio governo autorizou a votar.
Só esta última frase já define bem a qualidade da democracia da Venezuela, que um dia Lula considerou ter eleição até demais. A de ontem foi a primeira em que, apesar dos pesares, a oposição tinha chance real de vencer, como indicavam diversas pesquisas de opinião independentes.
Na situação em que se davam as eleições, com candidatos oposicionistas proibidos de se candidatar por decisão de uma Justiça Eleitoral dominada pelo chavismo, e com milhões de eleitores no exterior impedidos por questões burocráticas de participar do pleito, o mais prudente teria sido evitar o envio de representante brasileiro, como fez o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Depois de um ataque direto do protoditador Maduro, que disse que as eleições brasileiras não eram auditadas, o TSE desistiu de enviar seus representantes, por ser impossível trabalhar livremente num país que barrou diversos observadores internacionais e atacou o sistema brasileiro de urnas eletrônicas.
A decisão do governo brasileiro de mandar Celso Amorim à Venezuela para acompanhar a eleição já foi uma demonstração de que Lula está se arriscando para dar apoio a Maduro. A partir daí, o Brasil ficou sem escapatória — como não denunciaria fraude na eleição, anunciou que estava aguardando números oficiais para se posicionar. É uma situação muito esquerda — no sentido figurado — do governo brasileiro, porque estava claro que não seria possível afirmar que existia ambiente democrático para eleições livres.
O governo brasileiro disse que o Itamaraty considerou que a eleição foi pacífica, mas como, se havia milícias armadas na rua e bloqueio à propaganda da oposição na capital do país? A demora do governo brasileiro em se posicionar sobre as eleições se deve ao constrangimento internacional, pois diversos governos democráticos, mesmo de esquerda, já se mostram céticos diante dos números anunciados pelo Conselho Nacional Eleitoral, uma entidade oficial ligada ao governo Maduro.
O presidente venezuelano, ao criticar o sistema eleitoral brasileiro, alegou, como Bolsonaro já fizera, que nossos números são inauditáveis. Agora que diversos organismos internacionais como a ONU e vários países, entre eles o Brasil, exigem a exibição desses dados teoricamente auditáveis, o governo venezuelano hesita em mostrá-los e expulsa embaixadores de países que expressaram desconfiança nos resultados oficiais. Mais uma demonstração de que, de democrático, não tem nada.
O governo brasileiro coloca em risco sua reputação e liderança regional para apoiar um ditador que não tem a menor importância política. Nem o petróleo pode mais ser desculpa. É uma situação deplorável o governo brasileiro proteger e apoiar o ditador Maduro. O escândalo é tamanho que o governo brasileiro ainda não encontrou meios para colocar-se favoravelmente à vitória de Maduro, como já fizeram a Rússia de Putin e a China de Xi Jinping, especialistas em eleições como as que deram a vitória a Maduro.
A posição cautelosa do governo brasileiro até o momento é um bom sinal, desgarrando-se de países como Nicarágua, Cuba, Honduras, aos quais o Brasil sempre deu a mão em apoio a governos autoritários de esquerda. O Brasil não precisa necessariamente ser governado pela direita, mas não pode se aliar a uma esquerda retrógrada e ditatorial. Este é um bom momento para Lula demonstrar se é realmente democrata.