O provável futuro presidente Michel Temer, cuja trajetória rumo ao Palácio do Planalto já é considerada pela própria (ainda) presidente Dilma irreversível, tem dado alguns sinais importantes de que está sintonizado com o que deve ser feito no seu mandato-tampão para que não seja apenas uma nota de rodapé na história do país.
Desistir de nomear o amigo e advogado particular Antonio Mariz pelas ideias que tem sobre a Operação Lava-Jato é sinal de que Temer sabe que não pode arrostar a opinião pública. Até tentou, pois não deveria nem mesmo ter aventado o nome de Mariz diante das opiniões dele sobre temas delicados como delação premiada e combate à corrupção, que na sua convicção não deveria ser a prioridade da Polícia Federal.
A coerência do advogado, que já assinara manifestos contra a Operação Lava-Jato e criticara o juiz Sérgio Moro, é até elogiável, ou pode ter sido resultado de um curto-circuito entre ele e o futuro presidente. Mariz tinha todo o direito de imaginar que para escolhê-lo ministro da Justiça, Temer concordava com seus pontos de vista.
Ou talvez até mesmo o então vice-presidente possa ter concordado com o amigo em conversas informais. Mas a boa notícia é que Temer parece já ter entendido que nem mesmo suas convicções podem ir de encontro à vontade do país.
Ele terá que ser um presidente que atenda aos anseios da sociedade neste momento específico do país, e apoiar o combate à corrupção, sem dar margem a especulações de que estaria, por exemplo, inclinado a ajudar Eduardo Cunha a se safar das acusações contra ele.
Sorte de Temer que o assunto Cunha diga respeito ao Supremo Tribunal Federal (STF), e a presidência da República nem pode se meter nas disputas em outro Poder. Mas qualquer gesto que pareça solidariedade a Eduardo Cunha atingirá Temer como um raio, e ele não tem espaço para arcar com um erro desses, nem tempo para se recuperar.
Da mesma maneira, a quase confirmação de que o ministro da Fazenda será Henrique Meirelles é uma escolha que dará aos investidores, internos e externos, e ao mundo financeiro de maneira geral, uma sinalização positiva.
Retirar a autonomia do Banco Central, dando ao ministro da Fazenda a escolha de seu titular, é um retrocesso, mas deixá-lo participar da escolha do comando dos bancos estatais, fixando a diretriz de que não serão ocupados por indicações políticas nem loteados pelos partidos aliados, é outra boa notícia.
Também o anúncio de que serão feitas auditorias nesses bancos, para se saber a real situação da Caixa Econômica, do Banco do Brasil, do BNDES, é imprescindível para o novo governo dar à população a real dimensão do estrago feito.
O PSDB, ao sair de sua letargia e assumir compromissos concretos com o novo governo em troca de pontos programáticos, dá um passo importante para ajudar Temer a se afastar dos critérios fisiológicos que sempre foram orientadores da ação política do PMDB.
Os tucanos estão conseguindo fazer do limão uma limonada, e, ao superarem suas divergências sobre a participação no novo governo e substituí-las por uma proposta republicana de aliança programática, avançaram muitas casas no estabelecimento de uma relação saudável entre partidos na base aliada governista, dando o caminho correto a ser seguido pelos demais partícipes do novo governo.
Se eventualmente as coisas saírem diferente do combinado, o PSDB terá todo direito de ir para a oposição, rompendo o acordo que está prestes a ser fechado. Se Michel Temer entender que está tendo a chance histórica de tornar-se um presidente da República respeitável seguindo critérios programáticos e meritocráticos, estaremos dando um passo à frente na reorganização do Estado brasileiro, aparelhado e espoliado nos últimos anos por grupos políticos que pretendiam se manter no poder por longo tempo.
É ver para crer.