A presidente Dilma nomeou um ministério que pode ser medíocre em seu conjunto, mas tem um conceito por trás em algumas áreas fundamentais. A questão é que o conceito é uma repetição de manobra já realizada anteriormente pelo ex-presidente Lula, e por isso mesmo Dilma corre o risco de transformar em farsa a repetição de uma estratégia política que depende de um líder de reconhecida capacidade de articulação política para não provocar crises contínuas.
A nomeação de Joaquim Levy para a Fazenda está sendo digerida com muito custo, mas as pressões maiores estão voltadas para os novos ministros da Agricultura, Katia Abreu, e para o do Desenvolvimento, Armando Monteiro, dois dirigentes de associações patronais, exemplares de como o ministério tem uma tendência nada revolucionária.
O contraponto veio com a nomeação de Patrus Ananias para o ministério do Desenvolvimento Agrário, e o choque previsível já aconteceu ontem quando, na posse mesmo, Patrus respondeu a Katia Abreu afirmando que é preciso “derrubar a cerca dos latifúndios”, que por sinal Kátia Abreu havia dito que já não existem no Brasil.
A linguagem figurada (espera-se) do novo ministro pode incentivar ações mais concretas de movimentos que se consideram revolucionários, como o MST. Foi assim também no primeiro governo Lula, que nomeou Roberto Rodrigues para a Agricultura e Luiz Fernando Furlan para o Desenvolvimento, além de colocar o banqueiro internacional e deputado federal tucano Henrique Meirelles no Banco Central.
Se a presidente Dilma seguir à risca o que Lula fez em seu primeiro mandato, a situação vai piorar. Lula queria agradar a gregos e troianos e deu a seus ministros de esquerda a tarefa de nomear integrantes do segundo escalão dos ministérios dirigidos pelos ministros de direita. Quem escolheu o presidente do Incra foi o então ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, e não o da Agricultura, Roberto Rodrigues. Que também não escolheu o presidente da Embrapa, Clayton Campanhola, indicado pelo então titular do Fome Zero, José Graziano.
Lula foi intermediando essa convivência impossível até que teve que deixar Roberto Rodrigues intervir na Embrapa, que, de empresa de excelência estava se transformando em um aparelho de esquerda mais preocupado com a agricultura familiar do que com o agronegócio. Uma preocupação reiterada por Patrus Ananias hoje.
O mais grave é que esses conflitos, que estão estabelecidos de saída, ocorrem em momento de crise econômica e política, e de falta de liderança para a mediação. Os sinais da crise começam a aparecer mais concretamente. A greve dos metalúrgicos no ABC é simbólica não apenas por se originar onde o PT nasceu e se criou como o representante da classe trabalhadora, mas por que a região deixou há muito de ser o esteio petista para reagir contra governos e derrotar o partido com bastante frequência.
As demissões que começam a pipocar lá e em outras regiões do país são a demonstração de que a política econômica baseada no consumo popular com incentivos fiscais já não se sustenta. A crise na Petrobras também já está causando desemprego nas empresas que fazem parte da cadeia produtiva do setor.
Caberá à presidente Dilma lidar com a herança maldita que herdou de si mesma, e se não der respaldo às medidas duras que a nova equipe econômica terá que tomar, vai só piorar a situação. Não existe mágica para trazer de volta os bons tempos das commodities em alta no mercado internacional, nem é verdadeiro o cenário cor de rosa que a presidente Dilma vendeu durante a campanha eleitoral e mesmo no seu primeiro discurso como presidente reeleita.
Não há chances de fazer uma reorganização da economia sem quebrar muitos ovos. É tarefa da presidente tentar comandar o país sem criar mais turbulências que as que necessariamente virão. Os cortes de gastos, por exemplo, que estão para ser anunciados pela equipe econômica, serão severos para não deixar dúvidas da decisão do governo.
Muito embora a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) ainda esteja para ser aprovada pelo Congresso, os cortes já começarão em cima dos números propostos. Quando o ano começa sem lei orçamentária aprovada, como agora, o procedimento de praxe é permitir que os gastos obrigatórios, com salários e aposentadorias, sejam feitos normalmente.
Os demais gastos ficam limitados a desembolsos mensais correspondentes ao que está projetado para o ano, na suposição de que o orçamento será aprovado. A nova equipe econômica, porém, quer autorizar apenas desembolsos mensais abaixo do previsto, para começar o corte antes mesmo de ter o orçamento aprovado. É uma sinalização importante, mas que vai provocar muito tumulto na base aliada.