Em mais um episódio de desentendimento público entre a presidente Dilma e um ministro seu, desta vez o da Fazenda Joaquim Levy, fica claro que não existe um projeto econômico organizado para este segundo mandato. E, pior, que a presidente Dilma não mudou em nada sua maneira de ver o mundo, embora quanto à desoneração da folha de pagamento ela esteja mais próxima da verdade do que seu ministro.
Apesar de sua experiência em cargos públicos – já foi Secretário do Tesouro no primeiro governo Lula, e secretário de governo de Sérgio Cabral no Rio – Joaquim Levy já deu demonstrações de que não tem o equilíbrio necessário para se expressar oficialmente.
Já havia mordido a língua quando, em Davos, num ato falho, disse que a economia entraria em recessão. Depois, soltou uma nota explicando que quis dizer retração. Na verdade, era recessão mesmo, o que mais tarde ele confirmou em uma palestra em Nova York, mas se referindo ao ano de 2014.
Agora sabemos que a chance maior é de termos recessão dois anos seguidos. Pois quando, ao anunciar o fim da desoneração da folha salarial de vários setores, Levy disse que essa era “uma brincadeira cara” e que foi feita de maneira “grosseira”, o novo ministro da Fazenda criou um problema para a própria presidente Dilma, que no limite é a responsável pela “brincadeira”.
Levy, com sua crítica ácida ao antecessor Guido Mantega, um petista histórico, só somou adversários contra seu programa de equilíbrio das contas, e até mesmo a presidente o desautorizou. Dilma, aliás, deveria estar acostumada a esse tipo de linguajar, pois ela mesma, quando chefe do Gabinete Civil da Presidência no primeiro governo Lula, classificou de “rudimentar” uma proposta do então ministro da Fazenda Antonio Palocci, que, muito sabiamente, propunha o crescimento do PIB como limite para o aumento dos gastos.
Dilma, pelo menos, é coerente e na ocasião disse que “gasto é vida”, recusando as limitações que a proposta de Palocci impunha. Feita presidente da República, demonstrou na prática quanto de vida era capaz de injetar na economia, provocando o maior déficit das contas públicas já registrado nos últimos tempos.
Mas daquela vez era briga de petistas grandes. Desta, a presidente não gostou de seu ministro da Fazenda eventual ter criticado o ministro da Fazenda do coração, e repreendeu-o em público. Nada que tenha criado embaraços para Levy, que aceitou as reprimendas e ainda mandou “vazar” para a imprensa a informação de que ele também considerara “infeliz” seu comentário.
Na verdade, o ministro foi duas vezes “infeliz”. A primeira por ter dito o que disse, sem necessidade de criar mais obstáculos dentro do PT, que já não o tem em boa conta desde o tempo em que trabalhava com Palocci. Além disso, Levy foi infeliz ao dizer que a desoneração da folha de pagamentos é um instrumento ineficaz e caro, pois uma eventual geração de empregos não justificaria o custo do programa.
Foi contestado pela própria presidente, que disse que a desoneração é um instrumento que voltará a ser usado quando necessário, e também pelos empresários, que rebateram os indicadores do ministro com relação à geração de empregos.
Alegam que a experiência já resultou em bons números – há estudos que mostram um crescimento de empregos na ordem de 17% em alguns setores – e que, além disso, precisaria de mais tempo de efetivação da legislação para ser mais bem avaliada.
Tudo somado, Joaquim Levy vem demonstrando uma inabilidade preocupante na condução de seu pacote de corte de gastos, fazendo com que os partidos aliados ao governo o critiquem, e que os tucanos, com quem sempre trabalhou a ponto de ter ajudado Armínio Fraga no programa econômico de Aécio Neves, também não deem o apoio que esperava no Congresso. Se não atuar mais politicamente, o governo poderá sofrer derrotas no Congresso que inviabilizarão a permanência de Joaquim Levy à frente do ministério da Fazenda.