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Obstrução da Justiça

 

Se a intenção da defesa de Lula é, como está evidente em todos os seus movimentos, evitar que ele fique sob a investigação do Juiz Sérgio Moro, a reclamação que a Advocacia-Geral da União fez junto ao Supremo Tribunal Federal contra a divulgação das conversas da presidente Dilma com Lula teve o condão de reverter o processo contra ela, que será investigada sobre a tentativa de obstrução da Justiça.

O que parecia ser uma reviravolta a favor do ex-presidente acabou se revelando apenas uma ação protelatória de um processo investigativo que parece irreversível, mesmo que a atitude do Juiz Sérgio Moro no episódio dos áudios seja alvo de críticas dentro do Supremo Tribunal Federal.

O ministro Teori Zavascki comentou em seu despacho que a decisão de abrir o sigilo das conversas da presidente e outras autoridades de foro privilegiado é flagrantemente inconstitucional, mas não analisará essa questão neste caso específico. O Supremo ainda vai decidir se a prova é válida ou se pode ser anulada, quando analisar a decisão sobre os mandados de segurança sustando a posse de Lula como ministro.

O que deveria ter acontecido, independentemente de se tratar da nomeação do ex-presidente Lula para o ministério, é o envio automático dos autos ao Supremo Tribunal Federal. Isso aconteceu em outras oportunidades, desde o primeiro caso do Paulo Roberto Costa.

Nos bastidores do Supremo há o temor de que a própria União possa ser responsabilizada por eventuais vazamentos. Muita coisa que está vazando não tem nada a ver com a investigação, são coisas privadas, a avaliação é de que não se teve o menor cuidado.

A reclamação que resultou na decisão do ministro Teori Zavascki de levar para o Supremo Tribunal Federal o processo do ex-presidente Lula que estava em Curitiba com o Juiz Sérgio Moro pode ter duas conseqüências: ou a presidente Dilma Rousseff está de alguma forma envolvida em uma tentativa de obstrução da Justiça, e nesse caso o Procurador-Geral da República pedirá uma abertura de inquérito contra ela, ou vai dizer que não há razão para tal.

Nos dois casos, o mais provável é que processo relativo ao ex-presidente Lula volte para o Juiz Sérgio Moro em Curitiba. No primeiro caso, o ministro Teori Zavascki analisará se há necessidade de manter o resto da investigação no Supremo. Pelas decisões assemelhadas, dificilmente o Supremo vai ficar investigando triplex no Guarujá ou sítio em Atibaia.

Nesse intervalo, enquanto não houver uma decisão, qualquer investigação que seja necessária, que não possa ser adiada, será feita pelo Supremo. Nesse momento a competência é do Supremo. Provavelmente a decisão final do STF será manter o que vem sendo feito desde o início da Operação Lava-Jato, enviar para a primeira instância os processos de quem não tem foro privilegiado.

Em raros casos o Supremo manteve o processo de quem não tinha foro privilegiado, como num envolvendo o deputado Eduardo Cunha, quando se decidiu manter uma prefeita. A experiência do mensalão mostrou aos ministros que é melhor para a finalidade da Justiça ficar com o Supremo apenas os casos de quem tem foro privilegiado.

Em outro movimento, a defesa de Lula tenta retirar do ministro Gilmar Mendes a decisão sobre os mandados de segurança contra a posse do ex-presidente Lula como ministro do Gabinete Civil, que lhe daria foro privilegiado. Ontem o ministro Teori Zavascki, que a defesa de Lula gostaria que ficasse responsável por todos os processos sobre Lula, disse ao presidente do STF que considera o ministro Gilmar Mendes o juiz competente para decidir sobre os mandados de segurança contra a posse de Lula no ministério de Dilma.

O ministro Zavascki disse que se considerava competente para analisar as ADPFs (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), mas que isso não significa que seja ele o único para tratar do tema (juiz prevento), como querem os advogados de Lula.

Caberá ao presidente Ricardo Lewandowsky a decisão, mas se retirar de Gilmar Mendes o caso, anulando assim a suspensão da nomeação de Lula, estará decidindo por conta própria, sem respaldo de Zavascki.  
 

O Globo, 24/03/2016