Olhem só a notícia que apareceu, dias atrás, aqui em ZH. Na Nova Zelândia, o ambientalista Aleki Taumoepeau (o pessoal lá tem nomes complicados, mas, provavelmente, devem dizer a mesma coisa de nós) trabalhava no porto de Wellington quando sua aliança de casado caiu no mar, que ali tem três metros de profundidade. Aleki marcou o lugar com uma âncora e prometeu à mulher que encontraria a aliança, o que de fato aconteceu três meses depois, e valeu-lhe, entre os amigos, o apelido de Senhor do Anel, uma referência ao livro e ao filme O Senhor dos Anéis.
Isso nos faz pensar no simbolismo do anel de casamento. É uma coisa que vem de longe, dos antigos hindus e dos antigos gregos. Os romanos introduziram o hábito de colocá-lo no anular do qual, acreditava-se, partia uma veia (veia d’amore, em italiano) que estaria diretamente ligada ao coração.
Bota simbolismo nisso. Um simbolismo que se ampliou quando a Igreja adotou a aliança como um símbolo de união e fidelidade.
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A própria forma da aliança explica esse simbolismo. Pode ser considerada uma algema em miniatura, como dizem os inimigos (não poucos) do casamento, mas mais provavelmente é vista como o elo de uma corrente da qual fazem parte o noivo e a noiva, o marido e a mulher. Mais do que isso, por causa de sua forma circular, remete-nos ao ciclo da vida, no qual a união entre dois seres é um momento importante.
Será que essas coisas explicam a determinação de Aleki? Será que ele valorizava tanto assim seu casamento? Ou será que se tratava apenas do desafio, de encontrar a aliança de qualquer maneira para mostrar à esposa e aos amigos sua determinação? Ou ainda, quem sabe ele era movido pelo fato de que a aliança, afinal, é um objeto de valor, confeccionada em ouro? Ou, finalmente, será que é uma soma de tudo isso, e de mais alguns fatores que desconhecemos?
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Questão complexa, como complexo é o casamento. O que aproxima um homem de uma mulher levando-os a uma união que, teoricamente ao menos, deveria ser duradoura? O amor? Mas existem casamentos sem amor. Existem casamentos que resultam de interesses, de pressão familiar e que, ainda assim, funcionam. E mesmo que fosse o amor – é só o amor? Não é o hábito, o costume, a cumplicidade?
Há uma outra questão aí, muito mais embaraçosa. Por que uma pessoa perde a aliança? Por acidente, por descuido? Será que é só por isso? Ou será que o acidente, o descuido, são expressões de um impulso inconsciente, como o lapso freudiano? A mulher que perde a aliança está condenada a perder o marido, diz-se na Escócia. Condenada a perder o marido – ou pronta para livrar-se do marido? Será que perder a aliança (este “perder” podendo significar “jogar fora”) não revela já uma oculta predisposição para acabar com o casamento?
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O Aleki poderia não ter perdido a aliança – se ele não usasse aliança. Muitos casais fazem isso. Podem até ter a aliança, mas guardam-na em casa. De novo, pode-se perguntar o que leva casados a não usarem a aliança. A explicação que eu prefiro é aquela que remete à maturidade: não precisamos de nenhum símbolo material, se estamos seguros de nossos sentimentos, de nossas opções, sem que seja necessário demonstrá-lo publicamente. E sem que seja preciso mergulhar no mar em busca de alianças perdidas.
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A propósito da crônica do último domingo, comentando o caso de um homem que pediu na Justiça indenização à ex-esposa que tinha casos extra-conjugais, recebi do advogado Joaquim Francisco Polvora Victoria um interessante comentário. Diz o Dr. Joaquim Francisco que, até a Constituição de 1988, “reinava o entendimento de que ressarcir a dor moral com indenizações pecuniárias era algo imoral.” Atualmente, continua o advogado, existe uma verdadeira “orgia” de demandas neste sentido. E conclui: “Mas o valor das indenizações é estabelecido por critérios pouquíssimo objetivos... Na Inglaterra alguns matemáticos resolveram criar uma tabela de indenizações, quantificando com rigor matemático o quanto valia em dinheiro a dor da traição, da perda de um ente querido ou de uma ofensa irrogada pelo vizinho. Tarefa difícil, essa, para não dizer impossível.” Verdade, Dr. Joaquim. Mas convenhamos: é melhor algum número do que nenhum (pelo menos é o que se diz em saúde pública). Agradeço também as mensagens de Eduardo Ritter, J. A. Lemos, Simone L. Berti, Maria Elizabeth Knopf, Rodrigo Velasquez, Prof. Duilio de Ávila Berni, Luiz Carlos Avila, Ricardo F. dos Anjos, Flavio da Rosa. Nada como ter leitores cultos e inteligentes.
Zero Hora (RS), 30/8/2009