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O ano do desafio

 

Em A Era dos Extremos, o historiador Eric Hobsbawm, que já esteve em Porto Alegre e é uma das melhores cabeça de nosso mundo, diz que o século 20 na realidade começou em 1914, com o início da guerra que marcou o fim do velho liberalismo. Da mesma maneira podemos dizer que o século 21 vai começar em 2009. Até agora ainda vivíamos sob os efeitos da otimista conjuntura que marcou o fim do século 20, a expansão econômica, o desenvolvimento da informática, a emergência de novas potências, nelas incluído o Brasil. Agora estamos em crise, uma crise cujas proporções ainda não conhecemos, mas que certamente terá conseqüências. Por causa dessa crise, já podemos dar um apelido ao ano que se inicia: será o ano do desafio.


Em 2009, em outubro, mais precisamente, estaremos lembrando os 80 anos do crash da Bolsa de Nova York. E temos de lembrar, porque o capitalismo é cíclico, e nele as coisas se repetem. Em 1929, chegavam ao fim “os loucos anos 20”, um período de prosperidade e de excessos, a era do jazz, dos cabarés, das festanças. E, como agora, a crise foi precedida primeiro por uma queda violenta no valor dos imóveis e depois por uma instabilidade na Bolsa, as cotações subindo e descendo como numa montanha russa. Seguiu-se a Grande Depressão, o desemprego maciço e uma estagnação da economia que repercutiu em todo o mundo. As pessoas, assustadas, queriam governos fortes, e governos fortes elas tiveram: o fascismo na Itália, na Espanha e em Portugal, o nazismo na Alemanha, o stalinismo na União Soviética, o Estado Novo no Brasil. Só o fim da Segunda Guerra trouxe de volta a democracia.


Alguém pode dizer: mas então as perspectivas são más, porque de novo estamos vendo o estouro da bolha imobiliária, a instabilidade das bolsas de valores, os governos sendo chamados para socorrer a economia. É a repetição do velho filme?


Não, não é. E não é, exatamente porque 80 anos se passaram. 2009 não é 1929. Bem ou mal, o mundo aprende, e Marx tinha razão: a História não se repete, a não ser como farsa. Os erros do passado servem como vacina, como imunizante. A intervenção governamental, e isso estamos vendo em vários países, inclusive o Brasil, não significa o estabelecimento de governos fortes. Pelo contrário, ela resulta de um debate democrático, de um consenso. As medidas até agora tomadas podem não ser suficientes, mas não são irracionais, não são autoritárias. Se essas medidas mobilizarem a racionalidade e o bom senso das pessoas, se evitarem o pânico, a crise poderá ser superada.


É por isso que 2009 será o ano do desafio. E é por isso que em 2009 o novo século (quem sabe uma nova era) estará de fato começando.


Zero Hora (RS) 28/12/2008

Zero Hora (RS), 28/12/2008