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CPI necessária

 

O depoimento da presidente da Petrobras Graça Foster serviu para reforçar a necessidade da CPI pedida pela oposição, em vez de desanuviar o ambiente político, como pretendia o Palácio do Planalto. Ela confirmou que um mau negócio foi autorizado pelo Conselho da empresa sem que seus membros tivessem os dados completos para analisar.

Ao admitir que o prejuízo da compra da refinaria de Pasadena nos Estados Unidos foi de US$ 500 milhões, Graça Foster só complementou com números o sincericídio da presidente Dilma, que havia admitido semanas antes que desconhecia duas cláusulas contratuais que considerou danosas aos interesses da Petrobras: a que obrigava uma das partes a comprar os demais 50% da companhia em caso de litígio, e a que garantia à vendedora um rendimento fixo ao ano próximo a 7% independente dos resultados.

Não foi à toa que as ações da Petrobras começaram a cair na Bolsa de São Paulo durante seu depoimento no Senado. É preciso saber por que um mau negócio foi realizado com documentos falhos, e a quem interessou naquele momento levar o Conselho da Petrobras a tomar uma decisão errada.

É preciso esclarecer também por que diretores nomeados por pressões políticas foram responsáveis por decisões tão delicadas. O governo Dilma tenta se livrar de culpa, mas leva à suspeição de que pelo menos em gestões anteriores, no governo Lula, a política dominou as ações dentro da Petrobras.

A presidente Graça Foster garantiu que em sua gestão não há diretores nomeados por critérios políticos, que todos são técnicos reconhecidos dentro da empresa e no mercado profissional. Que assim seja. Mas é preciso que a CPI investigue desde quando, e até quando, as decisões políticas prevaleceram na empresa, e que conseqüências elas provocaram.

O ex-diretor Paulo Roberto Costa, por exemplo, está preso e será indiciado por diversos crimes: lavagem de dinheiro, evasão de divisas, fraudes em licitações, corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha. É preciso investigar com independência para saber desde quando ele atuava nesses ramos, e que outros prejuízos causou à Petrobras.

Sabe-se que o indigitado diretor estava anteriormente em situação peculiar na empresa, encostado em cargo desimportante justamente por que era reconhecido no meio em que trabalhava como não confiável.

Por que o presidente José Gabrielli ao assumir, saído de uma escolha petista, retirou-o do limbo para colocá-lo na importante diretoria de Operações?

Outro caso intrigante, para dizer o mínimo, é o de outro diretor, Nestor Cerveró, demitido nada menos que oito anos depois dos fatos acontecidos. Ele foi o autor do relatório “tecnicamente falho” que levou o Conselho da Petrobras, presidido pela então ministra das Minas e Energia Dilma Rousseff e composto por empresários do porte de Jorge Gerdau e Fabio Barbosa, a tomar a decisão errada.

Quando se descobriu, dois anos depois, que a cláusula de obrigatoriedade de compra da outra metade da refinaria seria prejudicial à Petrobras, Cerveró foi punido, segundo explicou ontem Graça Foster: foi transferido para a diretoria financeira da Petrobras Distribuidora.

Que poderes tinha Cerveró, ou seu padrinho, para protegê-lo desta maneira, contra todas as evidências? Como se vê, a necessidade de uma CPI independente só fez aumentar depois que a presidente da Petrobras esteve no Senado tentando acalmar os ânimos.

A renúncia da renúncia

Não é a primeira vez em que alguém do PT renuncia à uma renúncia anunciada. Depois de ter renunciado “irrevogavelmente” à liderança do partido no Senado, pelo apoio do Palácio do Planalto ao então presidente do Senado José Sarney que respondia a um processo, o hoje ministro Aluizio Mercadante deu o dito por não dito depois de uma conversa com o presidente Lula. Ontem foi a vez do ainda deputado federal André Vargas, mas sua renúncia atende a seus interesses próprios, e não aos do PT. Acontece que a Constituição determina que a renúncia de um parlamentar não encerra o processo de cassação de mandato a que ele responde. Essa emenda, de 1994, foi aprovada para impedir que o sujeito escapasse da cassação e pudesse se candidatar novamente na eleição seguinte. Com a aprovação da Lei da Ficha Limpa de 2010, essa decisão tornou-se inócua, pois o parlamentar nessa condição fica inelegível por 8 anos. Como sua renúncia não traria nenhum benefício, Vargas resolveu tentar a sorte e permanecer no posto, lutando por sua absolvição, mesmo que pareça impossível. Pior para o PT, que sangrará junto com o ex-vice-presidente da Câmara por mais tempo.

O Globo, 16/4/2014