Chego a vós, senhores acadêmicos e meus confrades, em tempos de mudança. Chego a vós no início do segundo centenário da Academia Brasileira de Letras, sou mesmo o primeiro a ter sido eleito e a tomar posse depois das comemorações dos cem anos desta Instituição. Aqui chego no momento em que o Brasil adota o exercício da memória como instrumento da identidade nacional. Existimos porque temos memória, porque a usamos contra o esquecimento. Dizia Antônio Vieira:
Tudo cura o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba.
Sabemos, no entanto, que a memória vence o tempo. A memória é o antitempo, o remédio para as fissuras do tempo, e só na memória palpita uma possível imortalidade.
Chego à Academia a três anos do fim do século e do milênio, quando o velho instrumento de Guttenberg penetra em novas dimensões de feitura, sem perder sua instrumentabilidade impressora, sua formatação de superfície lisa sobre a qual se inserem as letras, os símbolos, os números, os desenhos, os traços geométricos. A palavra é a semente de tudo, e ela se imprime na tela, no papel, no couro, na areia de Iperoig. A luz que sobre ela incide é a da vela, a do dia nascendo, a do dia morrendo, a do holofote, a da máquina receptora de imagens. Ganhamos velocidade na reprodução dos textos, o que não deixa de ajudar na sua criação. A memória passou a explodir em rápidas iluminações que em si não superam as de Rimbaud, mas que as levam com mais rapidez a olhos longínquos. A vitória sobre o tempo - transitória como tudo o que dura - influi em nossa avaliação de pessoas e acontecimentos, de ontem e de hoje, talvez até de anteontem e de amanhã.
Mas não há tempo sem espaço. Espaço é tempo medido em linhas tangíveis e concretas, espaço é tempo transformado em corpo. Cuidai que não justaponho os dois conceitos e as duas palavras por simples malabarismo: é que o espaço a que me refiro é o espaço brasileiro, o País em si, na sua largueza física, na sua diversidade, na sua unidade, no seu chão, nas suas águas, na sua fauna, nas suas flores, nos seus frutos e na massa compacta e firme de sua gente. É o espaço brasileiro jungido a um tempo brasileiro, e nessa união existimos, com nossa presença e nossa memória. Nessa união juntam-se verdades do tempo e verdades do espaço.
A memória brasileira palpita principalmente nos cem anos desta Academia. É a memória nua e crua tanto quanto a memória glorificada. A memória do sonho tanto quanto a memória da sombra. Em seus arquivos e na obra de seus membros erguem-se os dois Brasis, o Brasil que sonha e o Brasil que pensa. Há muito descobrimos que precisamos de ambos. Sem o primeiro não conseguimos pensar grande no planejamento da terra em que nossos descendentes viverão. Sem o segundo não saberemos como chegar lá. Estamos, assim, na grande casa em que o ser brasileiro ganha memória do passado e memória do futuro, tanto do futuro provisório como do que esteja contido em cada ato que hoje façamos, nas decisões do momento, no que pensamos, no que escrevemos, no que fazemos.
Temos conosco um Brasil criado por Machado de Assis, que nos previu e entendeu, mais do que isto, nos plasmou e nos fez. Num belo trabalho de pesquisa e criação, nosso companheiro Josué Montello pinçou a memória de Machado, num levantamento analítico a que deu o nome de Memórias Póstumas de Machado de Assis. Qualquer que seja o ângulo em que pensemos Machado, lá estão suas memórias de um Brasil do século XIX, não mais o do tempo do Rei, como informava Manuel Antônio de Almeida, mas o do Imperador e do País independente. Poesia ou prosa, ficção ou registro histórico, análises críticas ou crônicas do dia-a-dia, em todos os gêneros literários em que exerceu denso conhecimento do ser humano e uma compaixão cética pelas suas fraquezas, Machado de Assis mostra, pelas mãos de Josué Montello, a memória de um país que atingia a idade madura.
Chego à Academia Brasileira de Letras com as memórias de Machado de Assis e de todos os que por ela passaram e nela estão. Essa memória coletiva nos empurra para a frente. Percorrerei uma parte da memória desta Casa ao falar de cada um dos brasileiros que pertenceram à minha Cadeira, a de número 8. Vereis que uma faixa de nosso pensamento nela se concentra, do poeta Cláudio Manuel da Costa nos tempos da Inconfidência, passando pelo poeta Alberto de Oliveira, que, nascido no século XIX, viveria até o limiar do Estado Novo de Getúlio Vargas em 1937, pelo pensador social Oliveira Viana, cujo passamento se deu em 1951, pelo jornalista e cronista Austregésilo de Athayde, que dirigiu e mudou esta Casa durante quase 34 anos de sua presidência, e finalmente Antonio Callado, romancista, teatrólogo, jornalista e analista político, de saudosa memória, morto em janeiro último. São mais de duzentos anos de nossa história intelectual e política, vistos através de uma cadeira desta Casa. Mas não é somente ela que nos oferece um panorama, um retrato deste aís de língua portuguesa e de múltiplas misturas étnicas e pensamentais. Todas as outras 39 cadeiras têm características parecidas, com os patronos escolhidos desde o mais antigo, Gregório de Matos, nascido em 1623, até o que cessara de existir menos de dois anos antes de fundada a Academia Brasileira de Letras, Raul Pompéia, morto em 1895.
Como se sabe, cada fundador desta Academia escolheu, entre escritores brasileiros mortos, um nome para patrocinar sua cadeira. Era, assim, natural houvesse uma acentuada afinidade entre o acadêmico e seu patrono. A indicação de Cláudio Manuel da Costa por Alberto de Oliveira surgiu como resultado dessa afinidade, tal era a admiração do segundo pelo primeiro. Ambos poetas, ligados por um culto à forma, diferente em cada caso, mas semelhante no que representava como reação a modismos anteriores: num, o classicismo europeu, principalmente o gongorismo espanhol - e noutro, o romantismo.
Depois que o movimento arcádico apareceu em 1690, fundado por um grupo de 14 poetas, nos salões que a Rainha Christina da Suécia mantinha em Roma, o arcadismo logo se expandiu pelos países latinos, vindo a chegar a Portugal no século seguinte.
Numa evocação à parte, registre-se que o nosso Antônio Vieira, quando em Roma, esteve e falou no Palácio de Christina, que, depois de haver sido rainha em sua terra, assumira o papel de mecenas na Cidade Eterna.
No momento em que as arcádias se tornaram realidade em Portugal, lá estava Cláudio Manuel da Costa, que, nascido perto de Mariana, Minas Gerais, estudava em Coimbra. A Arcádia fora uma região da Grécia cujos habitantes, em geral pastores, eram hábeis no canto e na flauta. Cláudio Manuel da Costa mergulhou na poética da moda, passou a ver pastores e deuses gregos nas margens do Mondego. Sentia-se infeliz por não poder transplantar para Minas Gerais as imagens daquele “paraíso de inocência e felicidade”, tal como fora a Arcádia grega classificada e como os árcades de Portugal viam sua terra. De volta ao Brasil, quisera ser padre, mas não conseguira inscrever-se no seminário de Mariana, aquietando-se em Vila Rica, onde continuou fazendo o que mais sabia e queria fazer: poemas. Melancólicos e líricos, são dele alguns dos melhores sonetos da língua portuguesa. Dirigia-se à natureza, como no seu belo soneto que tem estes quatro versos:
Para cantar de amor tenros cuidados,
Tomo entre vós, ó montes, o instrumento,
Ouvi pois o meu fúnebre lamento;
Se é que de compaixão sois animados.
Ou no soneto de amor que diz:
Nize? Nize? Onde estás? Aonde espera
Achar-te uma alma que por ti suspira;
Se quanto a vista se dilata, e gira,
Tanto mais de encontrar-te desespera.
Embora obediente aos cânones arcádicos, procurou o poeta, no poema “Vila Rica”, abandonar o espaço pastoril da Europa e mostrar realidades brasileiras como as descrições que faz de um engenho de açúcar e da cata do ouro:
Da mole produção da cana loira
Verdeja algum terreno, outro se doira;
E, logo depois, fala na “ardente fornalha” e nos “brancos torrões”, que sofrem “estímulos do fogo”. Em outros versos descreve os serviços que o trabalhador nas minas faz nas serras e morros para a extração do ouro e canta a forma:
Com que o sábio mineiro entre o cascalho
Busca o loiro metal.
Partícipe do movimento da Conjuração de Vila Rica, preso, suicidou-se ou foi morto. Qualquer haja sido o modo de seu fim, pode o poeta ser considerado um mártir da nossa Independência, juntamente com Tiradentes.
Alberto de Oliveira viveria em outro tempo. Nasceu quando o Brasil autônomo completava 35 anos. Acentuavam-se as mudanças, mas Alberto de Oliveira atravessou-as todas com um firme propósito: a determinação de ser poeta. Pode-se dizer que ele só teve uma ideologia: a da forma perfeita, a do verso de mármore, independente e puro. Foi, nesse particular, mais parnasiano do que os outros dois líderes da escola, Olavo Bilac e Raimundo Correia. Escolhia a palavra pelo seu peso no verso e por todos os escaninhos sonoros de seu ritmo, quase que numa valorização exclusiva do som puro sobre os significados. Ao entrevistar, em 1950, o poeta Paul Eluard, em Paris, dele ouvi esta definição:
Poesia é a linguagem que canta.
Isto dito por quem era, após a suposta morte do parnasianismo, revela a permanência, em secretos compartimentos da memória, de técnicas antigas que um escritor pega, às vezes séculos mais tarde, para renovar a expressão literária de seu tempo. Não se duvida haja Alberto de Oliveira atingido um ápice da poética brasileira. Seu soneto “Vaso grego”, em estilo diferente, pode ser posto ao lado da famosa ode à urna grega de Keats cujo verso "A thing of beauty is a joy for ever" virou filosofia de vida. Eis o primeiro quarteto de “Vaso grego”:
Essa, de áureos relevos, trabalhada
De divas mãos, brilhantes copa, um dia,
Já de aos deuses servir como cansada,
Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.
Pertencente a uma família de 17 irmãos e irmãs, em que todos faziam poesia, poucos poetas nossos tiveram participação tão viva na literatura de um tempo como Alberto de Oliveira, cujas palavras raras, confirmando sua adesão às normas parnasianas, levavam, e ainda levam, muitos leitores ao dicionário. Usava termos assim: úsnea (líquen, penugem), lisins (veios da pedra), esconsa (inclinada, oblíqua) ou punícea (vermelho, cor de romã).
Como neste verso em que aparecem duas dessas palavras:
O gotear dos lisins de esconsa pedra.
É como se tentasse mostrar que o som de uma palavra insinua um pouco do que significa, numa onomatopoética além do signo imediato. E um poeta de outra vertente, Mário de Andrade, em sua “Carta aberta de Oliveira”, pôde dizer:
Quando releio “Por amor de uma lágrima”, certas páginas do Livro de Ema, aquela sublime “Voz das árvores”, a admirável “Sala de baile”, bem sei que tenho um poeta junto de mim.
A “Voz das árvores”, que Mário de Andrade chama de “sublime”, é este poema de amor à Margarida.
Acordo à noite assustado.
Ouço lá fora um lamento...
Quem geme tão tarde? O vento?
Não. É um canto prolongado
- Hino imenso a envolver toda a montanha:
São, em música estranha,
Jamais ouvida,
As árvores, ao luar que nasce e as beija,
Em surdina cantando,
Como um bando
De vozes numa igreja:
Margarida! Margarida!
José Francisco de Oliveira Viana, nascido no ocaso do Império e um de seus livros mais representativos tem precisamente esse título sucedeu a Alberto de Oliveira na Cadeira número 8, numa espécie de homenagem ao seu antecessor. Ambos fluminenses de Saquarema, ao longo dos anos de 1920 e 1930, amigos de Oliveira Viana insistiram em que ele se candidatasse à Academia. Entre eles, o que mais veementemente argumentava em favor dessa candidatura era Alberto de Oliveira. Morto este, decidiu José Francisco inscrever-se na vaga. Sociólogo e pensador político dos mais lúcidos deste País, tinha Oliveira Viana uma postura sacerdotal, visível em tudo o que fazia - no seu estilo de vida, no seu trabalho de escritor, em suas pesquisas, no modo como sentiu e entendeu o Brasil. O autor de Instituições Políticas Brasileiras, cuja formação intelectual se deu em plena República, viu a terra dele, e nossa, como um todo, percebendo, em cada fase do desenvolvimento brasileiro, uma afirmação nativista e um esforço de expansão que levava os colonizadores a esquecer o confinamento ibérico para pensar o novo território em termos de uma expansão maior. Conseguiram, assim, ir além do limite de Tordesilhas e estabelecer as bases de um país de dimensões continentais, de língua portuguesa, cercado de unidades políticas menores, de língua espanhola - todos, porém, de germe ibérico, romano-visigótico-árabe. Constatou Oliveira Viana que nossa elite se preocupava mais com o estudo minucioso da realidade européia do que com a análise de acontecimentos brasileiros. Cito-o:
Ainda somos um dos povos que menos estudam a si mesmos: quase tudo ignoramos em relação à nossa terra, à nossa raça, às nossas tradições, à nossa vida, enfim, como agregado humano independente.
Entre o primeiro pós-guerra de nosso tempo, quando Oliveira Viana escreveu essas palavras, e hoje, muita coisa mudou. Pensamos bem mais brasileiramente do que então, mas, do ponto de vista histórico, ainda não nos demos conta de que a memória vence o tempo. Somos todos testemunhas, em nossos dias, de que uma boa parte da comunidade cultural brasileira desconhece a histórica do nosso Império e, quanto ao século XIX, sabe mais de Disraeli e Gladstone na Inglarerra e das transformações políticas francesas pós-1870 do que sobre os gabinetes Saraiva, Ouro Preto, Zacharias, Sinimbu, no Segundo Império brasileiro. Há também nisso um velho patrulhamento da República e dos republicanos brasileiros contra o Império e tudo o que a ele dissesse respeito.
Quem de fato conhece hoje entre nós a história de nosso parlamentarismo e de que modo influiu ele nas instituições políticas de que dispomos neste final de milênio?
A análise que Oliveira Viana fez dos partidos políticos de seu tempo não precisa de acréscimos: continuamos no mesmo ponto em que estávamos quando da queda do Gabinete Zacharias em 1868 - isto é, os partidos políticos não eram, como ainda não o são, intérpretes de uma diretriz de governo definida.
A obra-prima de Oliveira Viana é principalmente Populações Meridionais do Brasil, largo panorama de um povo em formação. Alfredo de Taunay classificou-o como “livro de sociologia aplicada à história”. Era mesmo na história que Oliveira Viana se apoiava para suas pesquisas, sabedor de que a história é tempo inamovível, mesmo quando morto. Ninguém se mostrou mais nacionalista nesses estudos do que ele. Basta que se atente para o modo como apresentava a evolução de nosso pensamento político e os acontecimentos por ela provocados. Para ele, não existiam séculos XVI, XVII, XVIII e XIX. Havia apenas um tempo, o tempo brasileiro, concentrado no País, com exclusão de tudo o mais. Assim falava em século I para definir o que ocorreu no Brasil entre 1501 e 1600. Os seiscentos seriam o século II. Tinha a opinião de que nosso século mais forte e mais significativo fora o século III, o do ouro, do diamante, do Aleijadinho, o da conjuração mineira, o dos poetas Santa Rita Durão, Basílio da Gama, Cláudio Manuel da Costa, Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto, o de Tiradentes. De outro modo não pensou o professor C.R. Boxer, do King's College, da Universidade de Londres, que no excelente livro The Golden Age of Brazil, publicado 40 anos depois do mais conhecido trabalho de Oliveira Viana, chamava esse mesmo período de “Idade do Ouro”, no duplo sentido de ter sido o da grande produção do metal mas também o da importância daquela conjuntura histórica da colônia. O ouro brasileiro enriqueceu setores decisivos da Europa de então e ajudou a financiar a revolução industrial da Inglaterra. O nosso século IV, de Dom João VI, da Independência, dos imperadores e da República, marcaria o começo do exercício de uma autonomia difícil, e foi no seu livro O Ocaso do Império que Oliveira Viana analisou esse período, tendo como lema o que diz no prefácio dessa obra:
... há os que historiam factos e os que historiam idéias. Neste livro, eu procuro de preferência historiar idéias.
Seu objetivo era definir, de maneira precisa, o papel exercido na queda da monarquia pela idéia federativa, pela idéia republicana...
Agora que terminamos o nosso século V e nos aproximamos de novo milênio que será o século VI brasileiro, essa classificação pode ensinar-nos a adotar uma concentração em nossos problemas, em nossas opções, nossas necessidades absolutas, em nosso povo - por muito que precisemos de referências técnicas, financeiras e/ou ideológicas de fora.
Vale a pena mencionar, no caso de Oliveira Viana, uma característica, talvez mania, sestro, no escrever. Jamais usava a letra “A” para iniciar frase ou parágrafo. Sua boa prosa tinha de achar subterfúgios na colocação dos vocábulos a fim de evitar um “A” inicial. Às vezes mudava de termo ao começar frase ou título, como O Ocaso do Império em vez de “A Queda do Império”. De vez em quando depara-se com um “A” no início e, vai-se ver, é uma transcrição de texto de outro autor.
Com a morte de Oliveira Viana, eleito para sucedê-lo, transformou-se Belarmino Maria Austregésilo de Athayde na figura mais importante da Academia Brasileira de Letras ao longo de mais de três décadas. Escolhido para presidente desta Casa em 1959, manteve-se no cargo até seu passamento, em 13 de setembro de 1993. Nesse período mudou a Casa de Machado de Assis, dando-lhe nova estrutura.
O que é hoje a Academia, sua presença arquitetônica no centro do Rio de Janeiro, a extraordinária ampliação do seu espaço e o conseqüente poderio material do seu patrimônio - tudo isto devemos à capacidade de direção e de administração de Austregésilo de Athayde.
Seu chão foi o jornalismo. Realizou-se na literatura feita para jornal. Por volta de 1951, diante do preconceito - então mais forte que hoje - de que jornalismo era uma forma inferior de escrita, escrevi uma série de artigos que foram, logo depois, colocados num livro chamado Jornalismo e Literatura. Defendi a tese de que jornalismo é literatura, passível de tanta qualidade como qualquer outro gênero literário. O que o distingue de outras formas de escritura é que jornalismo é literatura sob pressão - pressão do tempo e pressão do espaço. Há um tempo definido, intransferível quase sempre, dentro do qual a obra tem de ser entregue, e a matéria deve ocupar um espaço limitado. Essas duas pressões determinam em geral a feitura da obra que, mais do que outras, precisa ser enxuta e concreta. Contudo, a poesia integra também o elenco de possibilidades jornalísticas, e nisto se destaca o gênero brasileiro por excelência, a crônica de jornal que, de Machado de Assis até hoje, deu um toque especial à nossa literatura. Situou-se nesse terreno a atividade permanente de Austregésilo de Athayde, que escreveu incessantemente no Jornal do Commercio artigos e crônicas, de assuntos vários, no espaço hoje ocupado por Carlos Heitor Cony. Todos os que fazemos ou fizemos jornalismo profissional – no meu caso, assinei uma coluna diária, “Porta de Livraria”, durante 25 anos – conhecemos a tensão capaz de nos dominar sempre que temos de escrever artigo ou editorial em cima da hora.
Desde a I Guerra Mundial a palavra de Austregésilo de Athayde analisava lucidamente o Brasil. A palavra e ação. Jornalista e escritor, foi ele, imutavelmente, por mais de 70 anos, o jornalista brasileiro por excelência. Relendo o que escreveu e repensando o que fez, talvez seja melhor chamá-lo de o brasileiro por excelência.
Mencionei a palavra e a ação. É que nele as duas se juntavam. Não só a ação política, mas a de responsável por jornais e pela condução da mais prestigiosa instituição cultural da nossa gente, a Casa de Machado. Exilado por suas idéias, manteve Austregésilo de Athayde uma presença jornalística permanente, de tal modo que o espaço do Jornal do Commercio, em que assinava seus artigos, guarda a visão aberta e clara que tinha de nosso tempo e de nossos problemas.
O destino ou Deus (era ex-seminarista e Deus deve ter destacado um anjo-da-guarda lúcido para o acompanhar), um ou outro, repito, ou os dois, levaram-no à comissão dos direitos humanos da ONU, onde deixou a assinatura brasileira mais importante do nosso tempo.
Sua atividade como repórter colocou-o em contato com homens e acontecimentos em várias partes do mundo. Entrevistou Einstein nos Estados Unidos e quis saber se, depois de haver chegado à teoria da relatividade, ainda acreditava em Deus. Resposta de Albert Einstein:
- Claro. Deus é o absoluto.
Estilo, tinha-o direto e sem enfeites. Como um Stendhal do jornalismo. Não caía, contudo, no abandono total do adjetivo nem adotava a indiferença fria de quem tudo vê de cima. Pois nele preponderava o entusiasmo, no escrever e no pensar. Era entusiasmado no mostrar o que fazemos e por que o fazemos. Num de seus últimos artigos, sobre o livro Carta aos Futuros Analfabetos, do francês Paul Guth, repetia o que foi o tema de toda a sua vida: só a educação pode salvar uma comunidade.
Guardamos dele a lição que nos deixou, de uma incessante luta em favor do avanço brasileiro, na direção de uma sociedade justa e próspera. Torno a dizer aqui a palavra que a ele sempre vi associada: entusiasmo, que vem do grego Theo, “Deus”. Ter entusiasmo é “ter Deus em si”. Pois Austregésilo de Athayde foi um brasileiro com entusiasmo no entendimento grego da palavra.
Antonio Callado, quarto ocupante da Cadeira número 8, firmou-se, ao longo de mais de cinco décadas, como ponto de referência inconsútil com a própria cultura brasileira. Do jornal passou ao romance e ao teatro, em cada atividade impondo uma severa militância de quem não se eximia de suas responsabilidades para com o próximo e para com seu País. Homem de nosso tempo, sentia-se inteiramente identificado com ele. Quando nasceu, em 1917, o mundo estava em guerra. Era um novo tipo de luta, com novidades mortíferas. A morte não mais surgia apenas do Sul ou do Norte, do Oeste ou do Leste. Agora vinha também do céu. Pela primeira vez aviões soltavam bombas sobre civis, e estranhos carros de combate, semelhantes a animais antediluvianos revestidos de metal, esmagavam gente, casas, camas, pratos de comida, vasos, brinquedos de crianças.
Toda uma geração, nascida em fins do século XIX, morria nos campos de batalha. Escritores, jovens e não tanto, eram interrompidos em sua prosa ou em sua poesia para empunhar instrumentos de destruição. Na França, Charles Péguy, na Inglaterra, Rupert Brooks - foram alguns dos que não mais pegariam na palavra para exprimir o muitas vezes inexprimível.
Naquele janeiro de 1917, ano conturbado e confuso, que prenunciava tempos difíceis, nascia no Brasil (em Niterói, Estado do Rio), o futuro escritor Antonio Callado, cujo destino seria o de analisar e entender, com um misto de vigor e compaixão, as fraquezas e grandezas de nosso tempo. Para isto existia - e para escrever, sem medo nem remorso. em entrevista que, em 1972, dei a um jornal de Luanda, em Angola, perguntaram-me qual era a missão de quem escreve. Respondi:
- Cabe ao escritor dizer que o rei está nu.
Insisti posteriormente, várias vezes, nessa tese, que é hoje um lugar-comum. A ninguém conheci, como Antonio Callado, no meu tempo de vida, com mais liberdade interior para dizer verdades como essa. Muito cedo se iniciou no jornalismo, setor em que essa liberdade se tornou mais necessária àquilo que podemos chamar de causa pública. O que dele primeiro li - e nunca mais me esqueci - foi uma crônica publicada em seção chamada “Gong”, no Globo, final dos anos de 1930. Era sobre o filme O Morro dos Ventos Uivantes, na versão de William Wyler, que então alegrava os admiradores de Emily Brontë.
Em 1941 houve a mudança que marcaria a vida de Antonio Callado. Foi então contratado pela BBC de Londres para ali trabalhar. A Europa se achava de novo em guerra, e Londres era a parte do mundo que mais sentia seus efeitos. As qualidades inatas de cavalheirismo, que havia em Antonio Callado, ganharam novo tom na Inglaterra, de onde voltou com o equilíbrio e a tranqüilidade de um gentleman. Jamais abandonou, porém, sua força de lutador.
Depois do volume O Esqueleto da Lagoa Verde, livro de jornalismo puro, sobre o desaparecimento do Coronel Fawcett na Amazônia, publicou um romance, Assunção de Salviano, logo seguido de outro, A Madona de Cedro, que revelavam o alto nível de realização literária que o novo escritor vinha a atingir. A nitidez com que formava seus personagens mostrava que um novo tipo de narrador aparecia na ficção brasileira. Sua preocupação com a justiça levou-o a um interesse no catolicismo de que esse romance é um exemplo maior. O trecho final do livro, de contida e ao mesmo tempo veemente beleza, talvez nos dê a chave do enigma, porque então o que chamamos de interesse de Antonio Callado no catolicismo parece ser uma, até certo ponto, apaixonada curiosidade pelo fenômeno religioso em geral (como o que, no campo da História, revela Toynbee). Quando o personagem de nome Delfino sai pelas ruas de Congonhas do Campo carregando a grande cruz de madeira de Feliciano Mendes, é o Calvário que o romancista encena. Misturando as trivialidades de uma cidade pequena - com as zombarias dos garotos, os pontos de referência das casas comerciais e de pessoas nas esquinas -, é a via-crúcis que um homem do século XX segue ali. E, sem insistir muito no fato, Antonio Callado faz sua personagem sofrer três quedas sob a cruz. Numa delas, é o jornalista, que tentara entrevistar o homem da cruz, quem o ajuda a se erguer. Poucos romances brasileiros atingiram tal beleza no seu clímax. O simbólico e o cotidiano se unem, nesse final do livro, de tal maneira, e com tão intensa emoção, que, como em toda boa história, os acontecimentos parecem ter convergido para aquele momento, os fatos anteriores - e foram muitos - como que existiram apenas para criar aquele caminho de um Gólgota mineiro.
O futuro criador de Nando pertencia, porém, a outra luta, a luta pela justiça. Justiça política, justiça social, justiça tout court. Acima de tudo, justiça imediata. Sua peça mais importante, Pedro Mico, seria escrita no mesmo ano de A Madona de Cedro, em 1957, quando Callado chegava aos 40 anos, isto é, à metade exata de seu tempo de vida. Seguiu-se um tempo de jornalismo para, já depois do movimento de 1964 e da perseguição das forças e homens no poder contra a obra e a pessoa de Callado, surgir o romance que o tornou conhecido além-fronteiras, Quarup.
Quarup invade a literatura brasileira com um vigor e uma violência que nela raramente havíamos tido antes. Força da natureza, tornado, tempestade furiosa, coisa indomada, Quarup, lançado em 1967 - pouco mais de um século depois de Iracema - que é de 1865 -, recolheu o indígena brasileiro, romantizado no Segundo Império, e deixou-o vestido com suas tradições nuas, presença indestrutível em nossa cultura. Pegado a uma visão total do Brasil, apanha-o Antonio Callado numa hora de crise, num momento heróico e de luta em que nossa gente se dividia perante o autoritarismo que nos era imposto, alguns achando a situação transitória, outros opinando que, sem luta, essa transitoriedade poderia tornar-se permanente, pelo menos tão permanente ao ponto de engolir duas ou mais gerações. Sabe-se hoje que o romance Quarup foi um dos mais contundentes instrumentos dessa oposição. Nele havia também, contudo, ou pour cause, o traço de misticismo que despontara em Assunção de Salviano e A Madona de Cedro. O personagem principal do romance não apenas é um padre católico, imerso no combate ao arbítrio, mas também interessado em discussões maiores sobre a vida religiosa, como a de possível crença matriarcal numa verdadeira matriologia, uma preeminência mariana sobre qualquer outra figura do calendário hagiológico da Igreja Católica, na certeza de que Maria, a Virgem, não é superada sequer pela divindade. Trechos de Antônio Vieira aparecem nas discussões sobre o assunto, quando personagens citam palavras do pregador a respeito.
Não se tenha, por isso, a idéia de que Antonio Callado haja escrito, em Quarup, um tratado teológico. O romance apresenta, na verdade, um estilo revolucionário, de que o indígena brasileiro faz parte, junto com uma classe média intelectual que, a exemplo de seu equivalente em outros países da América Latina, resolve intervir na composição dos quadros decisórios de cada um. Sob esse aspecto, em Quarup, o Brasil se levanta, de corpo inteiro, para julgar e enfrentar uma perigosa ameaça à liberdade.
Cassado em 1969, lança o romancista, dois anos depois, o romance Bar Dom Juan, em que a geração dele, e minha, fala pelo Brasil. Outras narrativas se acrescentariam à sua obra - Sempreviva, A Expedição Montaigne, Concerto Carioca, além de um policial, Memórias de Alberham House, em que, num regresso ao passado, usa Londres como espaço da história. Achava Callado que seu melhor livro era o que veio a publicar em 1976, Reflexos do Baile. Com ele concordo, principalmente por causa da linha poética e do estilo novo com que analisa um tempo e seus desencontros. É romance de uma perfeita estrutura ficcional, que deverá ser mais agudamente compreendido no decorrer do século VI da nossa era particular. Dos menos citados dos livros de Callado, Retrato de Portinari é uma obra singular. Panegírico diferente, nela a figura do nosso grande pintor assume o aspecto, correto e concreto, do artista que vive para cumprir sua missão de pintar e, através dela, contribuir para, como diria Teilhard de Chardin, hominizar o homem. A escolha de Portinari para escrever sua única biografia revela o temperamento de um escritor em sua afinidade com um mestre da pintura que dizia:
O artista é um homem diferente dos demais, pois retém a visão de uma criança.
Esta era também a visão de Antonio Callado, e sabemos que é na infância que sentimos com mais veemência a falta de justiça - e com mais barulho lutamos contra ela. Acima de tudo, é com os olhos da criança que percebemos a nudez do rei.
Formou Antonio Callado, com Ana Arruda Callado, um casal de escritores, dos muitos que temos tido na literatura brasileira, de Raimundo Magalhães Júnior e Lúcia Benedetti a Jorge Amado e Zélia Gattai.
Chego à Academia numa data que faz parte da minha memória pessoal. Pois há 42 anos - em 12 de setembro de 1955 - conheci Zora, Zora Seljan, que se tornou minha mulher. Antigo ditado popular parece ter recebido o acréscimo de uma palavra ultimamente. Este: atrás de todo homem realizado há sempre uma grande mulher. Agora a frase é: atrás de todo homem realizado há sempre uma grande mulher - exausta. Creio que, nesse particular, nossas tarefas foram sempre levadas a efeito com alegria, e a dois. Num dos nossos aniversários de casamento, um grupo de amigos promoveu jantar ao fim do qual muitos fizeram discursos, em geral curtos. O de Zora foi curtíssimo. Disse:
Muito obrigada, Antonio Olinto, por me ter feito rir durante 40 anos.
Tempos de mudança eram aqueles em que a geração a que pertenço começou a escrever e a dizer ao que vinha. Chamaram-na de “geração 45”. Exatamente em 1945, fundamos - Antonio Fraga e eu, com Luciano Maurício, Ernande Soares, Aldyr Custódio, Hélio Justiniano da Rocha e a participação de Levy Meneses, Paulo Armando e Maria Elvira Pires de Sá - um Grupo Malraux, que montou, no Rio de Janeiro, em 10 de maio daquele ano, uma exposição de poesia. Veja-se a data: dois dias após o fim da guerra na Europa. André Malraux significava, para nós, o equilíbrio entre a meditação e a ação. Terminava também naquele ano o ciclo Getúlio Vargas, iniciado em 1930 e institucionalizado a partir de 1937.
O desejo de unir a ação à meditação pode ter sido a marca de nosso tempo. Possivelmente a marca de 1945. O mesmo desejo pode ter-me conduzido à África, onde se acha uma das matrizes da alma brasileira.
Para escrever meu livro mais recente, Alcacer-Kibir, fiz extensas pesquisas, inclusive na crônica “Jornada del-rei Dom Sebastião à África”, na qual encontrei diálogo entre o rei e Dom Álvaro da Silva, Conde de Port'Alegre. Tentava este dissuadir Dom Sebastião de invadir a África e pôr em perigo a segurança de Portugal. Indignado, o rei exclamou:
- Que coisa sois os homens?
Ao que Dom Álvaro retrucou:
- Sabe Vossa Majestade que coisa são os homens? É que não há rei sem eles. Há momentos em que precisamos perguntar: que coisa somos os brasileiros?
Antes de tudo, somos uma cultura mista. Com isso, quero dizer que somos uma cultura internacionalizada. Nossa raiz-mater, Portugal, deu-nos uma linguagem e uma linhagem. O segundo elemento constitutivo da cultura brasileira, o indígena, legou-nos aquilo que Lévi-Strauss chama de “pensamento selvagem”. Pensamos selvagemente. O pensamento selvagem pensa diferente. O pensamento selvagem é. O pensamento selvagem esfacela a dicotomia sujeito-objeto. A mente que pensa, diante do objeto pensado, transforma-se naquilo que pensa, passa imediatamente a ser a mesa, o rio, a mandioca, a flauta, a dança.
O africano, parte integrante da cultura brasileira, está conosco, geograficamente, há milhões de anos. Pois há milhões de anos, antes da separação dos continentes, a parte saliente do hoje Brasil vivia encravada na reentrância da África Ocidental de agora. Somos, assim, Brasil e África, por diferenças que possam existir nas características de raça, hábitos, ritmo de desenvolvimento, na história e nas instituições de cada parte separada - somos assim, repita-se, o mesmo chão, pertencemos a húmus de calor idêntico: a África é a outra face geográfica do Brasil.
Quando lá moramos, Zora e eu, nas andanças que empreendemos - pesquisando, fazendo conferências, encontrando gente -, se nos interessava identificar algumas raízes africanas do Brasil, acabamos por também achar raízes brasileiras na África. A partir de Lagos, capital da Nigéria, onde estivemos de 1962 a 1964, foi fácil verificar a influência brasileira numa série de aspectos, como a arquitetura, a religião, a língua, a alimentação, as festas, o folclore.
O grande espanto que a Nigéria e o Benin provocam no brasileiro é a existência, em Lagos e em Porto Novo, de bumbas-meu-boi, estruturados e amados por grande número de descendentes de ex-escravos brasileiros. Ainda hoje há um grito de guerra em ruas de Lagos quando o bumba-meu-boi sai, com gente exclamando:
Olá-lá-lá, brasileiro está na rua.
Na África, senti-me fisgado, arpoado, preso, marcado para o resto da vida. Por onde caminhei depois, comigo veio a África, com sua quentura, suas cores, sua gente, seus cheiros, seus gestos, seu ritmo.
Essa presença africana, intensamente vivida, juntou-se à minha infância e adolescência passadas em seminário católico, preparando-me para ser padre, o que me tornou impermeável a muitas vaidades.
Conversando certa vez com Alceu Amoroso Lima, tentei explicar-lhe por que nem sempre certas benesses me alegravam tanto quanto deviam. É que, depois de ter desejado o sacerdócio, com a certeza de que iria ser intermediário entre Deus e os homens, com o poder de perdoar pecados, tudo o mais parece pequeno. As duas experiências, a do seminário e a da África, se completaram, dando-me a convicção de que não podemos continuar esmagados pela injustiça e pela discriminação que nos cercam.
Estamos na Casa que norteia e orienta, analisa e impulsiona, discute e concilia, honra e enobrece. Estamos no fim de um século e de um milênio, do século XX para todos e do século V de Oliveira Viana.
A nossa geração - que nos abrange a todos, dos mais jovens aos menos - terá de usar total determinação no esforço de criar condições, reais e imediatas, para que toda a nossa população possa participar integralmente das produções do País, do pão à poesia.
Senhores acadêmicos, sou-vos grato pela escolha de meu nome para membro efetivo desta Casa e por me haverdes, com isso, permitido acesso ao que de imortalidade possamos tirar do tempo. Chego a este momento pela mão de Geraldo França de Lima, escritor que, desde o romance Serras Azuis, nos anos de 1950, já marcara seu lugar na lista das obras permanentes da ficção brasileira. É alegria e honra ser por ele recebido em vosso nome.
Diante de vós, talvez se possa imaginar como será o Brasil do futuro. O pensamento múltiplo, diversificado, conservador ou novidadeiro, que esteja conosco, sugere a invenção de um modo de ser brasileiro, que já existe, mas pode precisar de novas contribuições e acertos. Foi o que senti ao ler, antes da posse de hoje, quase uma centena de discursos feitos por acadêmicos de anteontem, de ontem e de agora. Neles vibra uma agitação permanente que nos indica mais uma direção do que uma estrada. Para levarmos esse movimento à frente, teremos de escrever. É nosso chamado, é o nosso mistério, é a nossa única vitória contra o tempo.
Em 12 de setembro de 1955, uma escritora e um escritor se conheceram no Rio de Janeiro, e desde então dedicaram seus livros um ao outro, em amorosa reciprocidade. Dirijo, por isso, a Zora, neste final de minha fala, uma frase também curta e simples: “Muito obrigado, Zora, por ter me feito escrever durante 42 anos”.