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Discurso de posse

DISCURSO DO SR. ALBERTO DE FARIA

A HONRA de ser admitido nesta ilustre companhia é o prêmio da tarefa sinceramente concebida e honestamente executada.

Do trabalho a que me consagrei resultou um livro em que se focaliza na História do Brasil a figura de um homem de cuja benemerência como iniciador dos nossos melhoramentos materiais se ia diluindo a memória no correr dos anos, de cuja estatura de estadista, de diplomata, não havia, não há talvez ainda, consciência exata, de tal modo se ocultava na penumbra da carreira comercial um grande cérebro de construtor político, um grande coração de brasileiro.

Coube-me a fortuna de poder reunir papéis que se perdiam, documentos que se consumiam, de reavivar tradições que iam desbotando, a tempo de fixar as linhas desse vulto extraordinário em estudo que eu mesmo espero completar e que outros hão de embelezar.

Ao apoio que de todos os lados me veio por esse esforço em que a paixão do trabalhador supria a insuficiência do artífice, faltava a manifestação coletiva desta mais prestigiosa das nossas organizações literárias, a que Oliveira Lima denominou “o colégio que é a fina flor da inteligência nacional”.
Não me passava pela mente solicitar, à sombra de Mauá, a honra subida que hoje até aqui me eleva. Pensei, sim, em disputar um dos prêmios anuais com que a munificência de Francisco Alves galardoa o trabalho ingrato dos cultores das letras. Mas, não se enquadrava meu livro em nenhuma das classes a que havíeis reservado prêmio no ano da publicação, e deveria eu, assim, contentar-me com os generosos conceitos que, um a um, em cartas íntimas e em artigos de imprensa, me mandastes muitos de vós, em número sobre o qual a mais exigente matemática registraria, sem hesitação, o carinhoso e comovente aplauso da maioria absoluta dos meus atuais confrades.

O doloroso acontecimento que privou o Brasil do seu mais operoso historiador e um de seus mais ilustres filhos, gerou a ambição de disputar a honra de suceder-lhe, guardando esta Cadeira, na qual não poderia nunca ter a pretensão de substituí-lo, mas animando-me ao concurso pela qualidade que acidentalmente autorizava a não pensar em mim por amor de minha obra.

Ainda me soava aos ouvidos a voz generosa de Oliveira Lima, que, à aprovação largamente outorgada na imprensa do Brasil, da Argentina e da União Americana, juntava, em expansão íntima, esta frase que guardo como jóia de preço – “O seu livro é sobretudo uma boa ação”.
Nestes termos solicitei os vossos votos e como tal me aceitastes, pois que outros títulos não exibia, nem possuo.

Não o poderia eu dissimular neste momento porque assim vos falei sempre; não o quereria mesmo fazer, de tal modo me basta e me enche de orgulho o brilho da glória reflexa de Mauá.
O humilde Jáo vive a sua imortalidade esmolando o pão para Camões. História ou lenda, o modesto javanês será imorredouro na língua que, antes de um século, falarão deste lado do Atlântico cem milhões de homens felizes, os detentores dignos das duas maiores obras de Portugal, como as qualificou Joaquim Nabuco – O Brasil e Os Lusíadas.

Deixo de inquirir, senhores, se vos inquietastes pouco da imperícia do artista, para só atentar na benemerência da obra. Não me cabe a mim deixar em suspenso a justiça do vosso ato; nem seria do meu interesse, como beneficiado, nem é do meu temperamento conservador pôr em dúvida autoridade de sentença irretratável.

*  *  *

Pelo que pessoalmente me diz respeito, vosso confrade hoje, impõe-se-me, porém, o dever de afastar suspeita que vejo esvoaçando neste recinto, acolitada pelo perdão dos bons corações, que eu houvesse faltado um dia com o respeito que sempre tive por esta ilustre corporação.

Vós me permitireis que explique a frase que aí anda a intrigar-me com a benevolência da sentença.
Seria elementar dever de cavalheiro pedir-vos humildemente perdão se ela não fosse antes gracejo que insolência, e gracejo em que outro foi o visado, outro a quem me prendia intimidade de longos quarenta anos.

Consenti, Senhores, que o faça aqui publicamente, em dever de cortesia, no momento em que fidalgamente me recebeis sem inquérito prévio de minhas culpas, com o desvanecimento que para mim resulta de chegar a esta Casa sob a égide da memória de Pedro Lessa.
Esse grande espírito foi o meu tutor mental.

Quando, aos 15 anos, entrei no turbilhão da vida acadêmica, a boa fortuna entregou-me a uma roda de moços aos quais o futuro destinava grandes papéis no serviço da pátria e na glória das letras, Raul Pompéia, Raimundo Correia, Alcides Lima, Borges de Medeiros, Júlio de Mesquita, Caldas Viana, Augusto de Lima, Pedro Lessa.
De todos foi Pedro Lessa quem manteve sobre mim, o Benjamin da roda, influência mais poderosa, tutela mais duradoura e carinho pessoal mais prolongado.
No caráter paternal de sua proteção a um menino que eu era, nasceu-lhe a esperança de que pudesse ser mais do que um estudante aplicado de direito; quis que, como ele e esses outros, fizesse carreira literária.

Sob sua direção ensaiei os primeiros passos. Com o frenesi da idade, invadi todos os estudos, embrenhei-me por todas as searas. Nada foi estranho a minha curiosidade; nenhum terreno científico e nenhuma escola literária ficaram defesos à minha audácia de segundanista.
A alimentação pesada para um estômago juvenil produziu a natural reação do torpor gástrico e do enjôo da alimentação.

Pedro Lessa desesperou da carreira literária do seu jovem pupilo.
A vida real nos separou depois de saudosíssimo convívio e cada vez mais nos distanciamos na direção de nossas atividades, ele caminhando para as culminâncias da ciência jurídica e das letras, eu, terra a terra, disputando a princípio na advocacia, depois do mundo dos negócios, a tranqüilidade material.
Lessa não me perdoava a deserção. Suas cartas, suas investidas verbais em fortuitos encontros, eram eivadas da desolação paternal de me ver irremediavelmente perdido, com o cérebro ossificado, como ele dizia.

De minha parte iam às vezes réplicas aos seus remoques, represálias às suas pungentes ferroadas.
Uma delas foi quando soube de sua candidatura à Academia. Escrevi-lhe endereçando minha carta para a Estrada de Damasco. Aludia aos motejos com que freqüentemente o ouvia referir-se ao incipiente Instituto.

No seu discurso de recepção, depois de vos confessar que nunca haveríeis recebido confrade que tivesse sido tão contrário à Academia na época de sua fundação e nos seus primeiros tempos, repetindo com aplauso, e dando-lhes curso, as censuras e alusões satíricas em que se desentranhou a velha mas não cansada maledicência indígena, e acrescentando-lhe notas de sua lavra de que ressumbrava certo malquerer – era a mim, no fundo da sala, que se dirigia o seu olhar malicioso quando acrescentou – “Felizmente não teve minha crítica a menor publicidade, escoou-se na intimidade das palestras entre amigos.”

Não perdia Pedro Lessa o hábito de gracejar; e comigo o mote preferido foi daí por diante mofar do afastamento cada dia mais pronunciado em que me via do seu alto posto literário.
A eleição do meu ilustrado e saudoso homônimo ofereceu-lhe momento oportuno. Redigiu telegrama para o qual solicitou assinatura de vários acadêmicos que me davam a honra de sua intimidade. A jocosa mensagem, parodiando célebre dístico, dizia assim:
– “A Academia honra-se de ver em seu seio tão ilustrado cultor das letras. Rien manquait à votre gloire, vous manqueriez à la nôtre.”

Quando chegou o momento da assinatura de Lauro Müller, esse espírito saxão cultivado em estufas tropicais pôs a sua objeção: – “Deixemo-nos de brincadeiras com esse homem; tendo telegrama dos eleitores para sua residência, ele é bem capaz de pedir ao Supremo Tribunal um mandato de imissão de posse.”
A malícia do político regalista era uma sátira ao bom juiz político que na Corte Suprema dirigia a corrente liberal que procurava contrapor-se por meio de habeas corpus e remédios sumaríssimos às delongas da justiça e às tendências invasoras das ditaduras governativas.

O telegrama chegou-me apenas com as assinaturas de Pedro Lessa, Rodrigo Octavio e Afrânio Peixoto.
Em cartão de visita repliquei ao relator: O .......... é outro Alberto de Faria – (Bem vedes que há aqui uma palavra suprimida).
Pedro Lessa retrucou: – “Agora, não resta mais dúvida; é o senhor mesmo; são todos assim depois que se apanham servidos. Quand nous sommes quarante on se moque de nous; sommes-nous trente-neuf, on est à nos genoux.”
Este duelo de gracejos entre amigos e velhos condiscípulos teve repercussão e eu soube que a velha mas não cansada maledicência indígena tinha dado asas à represália, atribuindo-lhe espírito para ferir a coletividade numa generalização que não era de meu intento.

Bem deveis compreender que não me cumpria a mim protestar.
Envaidece tanto ter feito uma frase que logrou foros de espirituosa, ou tê-la visto criar sob nossa paternidade, que só agora, depois que a dependência do vosso voto cessou e a gratidão me escraviza, tornava-se inadiável esta pública explicação, antes de aceitar a honrosa convivência que me ofereceis.

*  *  *

Os dois nomes inscritos na Cadeira que me cabe a honra de zelar, são os dos dois criadores da História do Brasil.

A vida desses ilustres historiadores parece ser uma o prolongamento da outra; elas se seguem cronologicamente e de tal modo se assemelham sob o aspecto da psicologia dos dois eméritos cultores de letras históricas e na finalidade dos respectivos trabalhos e aptidões, que o estudo de Oliveira Lima sobre a personalidade de Varnhagen, na belíssima oração proferida nesta Academia em 1903, tem aparências de autobiografia.

A uniformidade das trilhas por ambos seguidas é curiosa. A cinqüenta anos de distância, os dois partiram do mesmo ponto, viajaram os mesmos caminhos, exploraram as mesmas veredas para fim comum, – “investigar a história pátria, ressuscitar crônicas esquecidas nas bibliotecas e documentos soterrados nos arquivos, valiosos corretores de falsidades e ilustrados colecionadores de fatos.”
Nesta tarefa estrearam em Lisboa como adidos do corpo diplomático brasileiro junto à Torre do Tombo, a mina onde ambos já haviam laborado, porque aí se tinham alistado anteriormente em duas gerações de notáveis homens de letras de Portugal, Varnhagen em 1842, contemporâneo de Herculano, de Garrett, de frei Francisco de São Luís, Oliveira Lima em 1890, discípulo amigo e colaborador de Adolfo Coelho, Teófilo Braga, Pinheiro Chagas e Oliveira Martins, de quem foi discípulo dileto e “...com quem aprendeu (como disse Salvador de Mendonça) se é que tais coisas se aprendem, a observar com justeza e a escrever com calma, nesse estilo direto e claro que constitui sua forma literária e devera ser a forma preferida dos bons espíritos”.

O auxílio material de um emprego na diplomacia foi procurado pelos dois como meio de estudar nas próprias fontes os documentos e mourejar na obra de construir a nossa História. Quando começaram a trabalhar regularmente na Torre do Tombo, já os dois entravam sabedores de meandros e segredos daqueles arquivos porque por eles perambularam, quando completavam, sua carreira militar, um, seus estudos universitários, o outro.

É Oliveira Lima quem conta:

Quando muito novo ainda, eu estudava paleografia na Torre do Tombo em Lisboa, tendo por mestre José Basto, um dos auxiliares de Herculano na obra grandiosa dos Portugaliae Monumenta Historica, costumava ansioso, esquadrinhar nos maços de papéis bolorentos de caracteres semi-apagados debaixo da poeira dos séculos, algum documento que na minha prosápia juvenil julgava dever ser decisivo para a solução de qualquer dos enigmas de nossa história, que os tem, conquanto date de ontem. Ora, era com surpresa e não menos vivo desapontamento que, em quase todos aqueles papéis, se me deparava a marca discreta de um pachorrento investigador que me precedera na faina, e que verifiquei não ser outro senão Francisco Adolfo de Varnhagen.

Nesse posto diplomático-literário ficou Varnhagen seis anos, e daí passou para Madri na continuidade do seu destino de fazer a História do Brasil.
Oliveira Lima, esse, foi conservado menos tempo, pouco mais de ano, pois que em 1892 era transferido para Berlim.

Com o auxílio dos vencimentos do cargo, onde buscavam confessadamente os recursos materiais de viver e os auxílios oficiais para devassar bibliotecas e arquivos, andaram os dois cobiçando, com meio século de intervalo, os postos onde houvesse História do Brasil a descobrir.
Durante essa longa peregrinação, pode dizer-se que ambos empregavam, das 23 horas da folga diária no serviço burocrático, mais de metade do tempo em investigações da nossa história colonial, em Lisboa, em Madri, em Simancas, em Sevilha, em Viena, em Londres, e que nunca pediram aposentadoria. Nem Varnhagen, que aos 62 anos falecia em Viena, trabalhando, como no ardor da mocidade, para completar a sua História da Independência, e que, pouco antes de morrer, quando a enfermidade o prendia ao leito, ainda escrevia a um amigo, o eminente Sr. Ramiz Galvão, a esse tempo diretor da nossa Biblioteca Nacional, enchendo a sua carta de questões de história pátria, sobre pontos escuros que desejava ver esclarecidos, e manuscritos cuja existência desejava conhecer. Nem Oliveira Lima, que já cruelmente ferido dos prenúncios da morte, no seu retiro de Lennox, onde pensou ter readquirido forças, gastava as últimas reservas de energia e de inteligência, escrevendo amiudadamente a um grupo de amigos dedicados, a Joaquim de Sousa Leão, a Afonso Bandeira de Melo, a Carneiro Leão, a Vicente Licínio Cardoso, a Max Fleiuss; a Gilberto Freyre, a mim, a outros, que nos felicitávamos de poder ajudá-lo, para pedir documentos, reclamar estatísticas, obter cópias, com as quais estava construindo o livro póstumo – O Império Brasileiro – e armazenando material para novas produções.

Quando ambos repousaram em terra estrangeira, apenas transposta a idade de 60 anos, deixavam, uma completando a outra, a obra mais vasta e, ouso dizer, a mais notável da História do Brasil.
Oliveira Lima fez justiça a Varnhagen quando escreveu que “ele foi sem contestação o criador da história pátria, senão em sínteses luminosas, pelo menos na comprovação essencial”.
E igualmente era sincero Salvador de Mendonça, quando replicou, ato contínuo, que “onde parou a obra investigadora de nossa História Geral há de recomeçá-la e excedê-la o nosso ilustre confrade Oliveira Lima”.

Estes dois homens, irmãos gêmeos na predestinação, em pouco se diferençavam.
Varnhagen foi sobretudo historiador. Aquecido ao sol meridional, esse brasileiro, em cuja sepultura os descendentes puderam escrever, orgulhosos: – “Nascido na terra fecunda descoberta por Colombo, iniciado por seu pai nas coisas grandes e úteis, estremeceu sua Pátria e escreveu-lhe a História”, – tinha nas veias o sangue alemão e o sangue ancestral dos bandeirantes.

A mescla explica as duas grandes faces da sua individualidade – brasileiro apaixonado por sua terra e sua gente, e historiador que analisava friamente os homens do nosso passado, como outros sábios estrangeiros vieram, em épocas igualmente misteriosas, estudar o nosso solo, a nossa fauna, a nossa flora, aplicando aos problemas históricos e sociais o critério germânico da lei do mais forte – “herói nacional nenhum outro senão o invasor”.

Da impassibilidade do homem de ciência resultaram-lhe os dissabores de ataques de seus contemporâneos, historiadores dominados de preocupações nativistas e de preconceitos indianistas.
Com eles comungaria mais tarde Eduardo Prado, quando escreveu:

O eminente e excêntrico Varnhagen tem toda a dureza de um saxão que era e uma inexplicável índole deprimidora de toda a grandeza e de toda a beleza; é, enfim, o homem que, em nossa História, menoscaba de todas as heroicidades, da de Anchieta e da de Tiradentes, e diz que os Jesuítas foram outros orfeus que souberam humanizar as novas feras humanas.

De todas essas acusações tomou conta o ilustre Pedro Lessa; e uma a uma, analisadas, explicadas, pulverizadas quase todas, sucumbiram na seguinte sentença:

Longo e complexo é o libelo que conclui negando ao historiador brasileiro o título de historiador, e rebaixando-o à categoria de um medíocre cronista. Crônica de mais de três séculos de vida de uma nação, feita metodicamente, com a reconstrução meticulosa e tão documentada quanto possível, de todos os fatos, de muitos anos de ininterruptas pesquisas e da aquisição de abundantes conhecimentos das ciências auxiliares da história, e com o intento, confessado, de prestar subsídios ao estadista, ao jurisconsulto, ao estratégico, ao naturalista, ao financeiro, e aos vários artistas e também para fortificar os vínculos da unidade nacional e orientar e exaltar o patriotismo e enobrecer o espírito público, aumentando a fé no futuro e na glória das letras, não é crônica, é história.

Aliás, era ele próprio Varnhagen que, ao abrir a sua História Geral do Brasil, prevenira o ânimo dos leitores:

Cada dia nos convencemos de que a história é um ramo da crítica, não da eloqüência, e que diante do tribunal dela o historiador não é um advogado verboso e florido, mas antes um verdadeiro juiz que depois de averiguar bem os fatos, ouvindo as testemunhas, com o devido critério, deve, feito o seu alegado com o possível laconismo, sentenciar na qualidade das leis eqüitativas da sociedade e humana justiça.

Quem considerar que ele era um homem de ciência, um historiador, que o meio, a educação, o sangue, a época, a gratidão, fizeram monarquista e dedicado à família imperial, compreenderá e atenuará a dureza com que emitiu certos julgamentos que desafiaram o juízo severo de Eduardo Prado e que o sempre estremado Capistrano sintetizou dizendo que: – “se Varnhagen houvesse funcionado como juiz de Tiradentes e Gonzaga ele não teria hesitado em assinar a mesma sentença que o desembargador Diniz e seus colegas”.

Nem ele desejou jamais ser julgado de outro modo senão: “alheio a essa maneira demasiado viva, comovedora e sentimental que chega a debilitar até certo ponto a verdade”.
O patriotismo reserva-o Varnhagen para os seus escritos literários, para a sua função diplomática, para a sua doutrinação política.

Aí se sentia à vontade. Como literato, onde bem sabia que tinha liberdades para a crítica e franquias para as lendas, organizava, com mais patriotismo que severidade, o Florilégio, obra em que José Veríssimo viu, entretanto, a fonte da nossa história literária, os Épicos Brasileiros e vários outros estudos; e escrevia, sem comprometer a responsabilidade de historiador, o drama épico-histórico americano Amador Bueno, em que confessa: “abordar um ponto controverso da história, aproveitando em sua plenitude a legenda que a crítica não podia acolher sem ressalva”.

Como homem público e diplomata, toda a sua vida decorreu na mais contínua e útil preocupação dos grandes problemas nacionais olhados do ponto de vista de um espírito superior.

Aí estão seus estudos sobre a preparação do anil, sobre a cultura do trigo comparado com as da mandioca, milho e arroz, a sua Carta sobre os melhoramentos nos engenhos de açúcar das Antilhas o seu trabalho sobre O Tabaco na Bahia, sobre a Coffea Arabica, sobre o Café da Bahia, as Informações sobre a Cultura do Café em Venezuela. Nem mesmo se esqueceu do mate em que ninguém ainda cuidava, O segredo das sementeiras das plantas do mate. Nem da cultura da vinha nos sertões do Norte, nem da amoreira numa censura ao governo da metrópole que se descuidara da riqueza da criação do bicho da seda.

Como homem político, vereis em toda a sua obra escrita que se a figura do historiador fosse menos saliente, não se deixaria em segundo plano o cérebro que viu com tanta segurança problemas em que os governantes não pensavam ainda e os resolvia com visão patriótica que hoje melhor podemos admirar.

O amor ao Brasil, que não chegava para escurecer a consciência do historiador, explodiu na revelação de uma alta capacidade política. Os seus estudos sobre a mudança da Capital para o ponto em que a Constituição republicana a votou; sobre a divisão territorial, propondo a remodelação integral do mapa político-administrativo do Império, “de jeito que tivesse cada província uma extensão de território proporcionada à das outras e suficiente população e riqueza para que gozasse proximamente de igual importância”; a sua sugestão da Colonização européia por grupos em toda a superfície, a sua preocupação do grave problema da abolição, batendo-se, tão adiante dos seus contemporâneos, pela libertação dos nascidos de mulher escrava, a sua propaganda de um regime inteligente das terras devolutas e de arrendamento das fazendas do Estado em contratos de curto prazo e não nas enfiteuses em que até hoje estamos embaraçados, a sua campanha pelas estradas de rodagem, as estradas gerais, hoje patriótico empenho do governo nacional, campanha que se acredita ter produzido o imediato ensaio da Estrada União e Indústria, todas as sugestões políticas que se espalham na sua obra de historiador e na sua função profissional de diplomata, colocam Francisco Adolfo de Varnhagen, Visconde de Porto Seguro, “o mais notável dos nossos historiadores”, como o qualificou Oliveira Lima, entre os diplomatas de grandes serviços e os sociólogos de mais clara visão na formação da nossa nacionalidade.

*  *  *

A Oliveira Lima não caberia a glória, senão em parte, de realizar o vaticínio de Salvador de Mendonça.
Para recomeçar e exceder a obra de Varnhagen, não lhe faltavam atributos intelectuais, nem prodigiosa capacidade de trabalho. Mas, Oliveira Lima bem viu que mais útil e mais prático seria aquele caminho que tomou e que, por antecipação anunciava, momentos antes de ouvir a profecia de seu ilustre paraninfo.

Repetindo conceitos do Duque de Broglie, ele obtemperou que não era ainda o momento de surgir o grande historiador do Brasil; cumpria-lhe continuar a obra de Varnhagen, completando-a nos detalhes, juntando novas contribuições:

O historiador tem de combinar a sagacidade da verificação com o talento da exposição, aliar a circunspeção do pesquisador à habilidade do narrador, o que, demandando, em rigor, para aplicar-se é evolução de um povo, tempo mais que o de uma vida e inteligência mais do que a humana, convida à elaboração das monografias... Não há com efeito quem não esteja convencido de que o século atual será irremediavelmente o dos especialistas. (Discurso sobre Varnhagen)

O Ministro que o tivera quatro anos por secretário em Washington poderia, calculando a tarefa pelo vigor intelectual do arquiteto, vaticinar essas proporções ao monumento; mas, o construtor mediu melhor suas forças e não se abalançou a empresa que não teria podido realizar.
Graças a essa modesta compreensão de suas possibilidades, é que devemos a Oliveira Lima uma grande obra de historiador.

É preciso não esquecer que tanto ele como o ilustre patrono desta Cadeira tinham escolhido a carreira diplomática como oficina de trabalho, pois nenhum dos dois tinha recursos de fortuna, nem o ambiente nacional proporcionava outros meios de fazer estudos sérios nas fontes de nossa história, nos documentos que andam espalhados pelas bibliotecas, arquivos e chancelarias estrangeiras.
Varnhagen teve sempre o amparo da mão protetora do Monarca ilustre a quem se fez carga, à falta de maiores defeitos, de ter andado por demais distraído com as letras, as artes e a ciência; sua carreira diplomática parece guiada pela preocupação imperial de ajudar a obra do historiador.
Deram-lhe os primeiros cinco anos de Lisboa e depois seis anos de Madrid, consumidos em reunir o material para a primeira edição da História Geral. Daí o passarem em 1859 para a América do Sul, a princípio no Paraguai, depois em Venezuela, Nova Granada e Equador, e depois no Peru, Equador e Chile; e no período que vai de 1859 a 1868 Varnhagen pôde ser também ator no vasto cenário da nossa delicada política continental.

Quando o incidente de Valparaíso determinou dificuldades para o diplomata que viu a sua vibrante nota modificada, segundo o ponto de vista oficial, em termos de mais agradar ao Governo Espanhol, a obra de historiador nada perdeu; antes, ganhou mais vasto campo. A Legação da Áustria iria acolher o diplomata que fizera dez anos de América, e, a bem da História, foi promovido a ministro do Brasil na Corte de Viena, onde empregou o melhor do seu tempo e os dez últimos anos de vida numa febril produção puramente literária, e onde refundiu a História Geral e reuniu documentos para a História da Independência e para outros estudos que Oliveira Lima exaltou devidamente como “provindo sempre de pesquisas pessoais e não da utilização do trabalho de outrem”. Sua fé de ofício diplomática é um itinerário de historiador.

Não devia esperar Oliveira Lima, em 1890, quando entrou para a carreira com o mesmo pensamento de encontrar nela facilidades de historiador, que lhe coubesse sorte tão boa. A natureza do regime, a temporariedade dos governos, a instabilidade dos programas de Itamarati, não lhe podiam dar esperanças de vida igualmente propícia de historiador em vilegiatura pelas legações. O seu temperamento exageradamente cioso de autonomia, estuante de susceptibilidade, também não o ajudava.

Foi só a necessidade de aprender a História nas fontes, que lhe aconselhou a mesma trilha de Varnhagen. Mais que em França são dolorosamente verdadeiras no Brasil as palavras de Taine: – “Quase sempre é necessário fazer da ciência e da literatura objeto de luxo e buscar alhures a subsistência.”
Prevendo embora as surpresas do caminho, por ele enveredou. E foi até onde o deixaram trabalhar.
Dir-se-ia que a Fada da História lhe aparecera um dia e segredou, como a Macaulay: – “Deixa passarem riquezas e prazeres; eles vão e vêm como vão e vêm as ondas do mar. Deixa que se vão e no meio dessas oscilações fixa sobre mim o teu olhar de confiança.”
Tudo o destinava a ser no Brasil colaborador precioso do século da História, que sucedeu ao século da Filosofia.

Oliveira Lima consagrou-se à tarefa de continuar a arrecadar material para a obra desse historiador que está por vir e que seria prematuro no Brasil.
Não foram além suas pretensões. Em boa hora.

*  *  *

A sua primeira contribuição veio de pronto. Em Lisboa, apenas instalado no posto diplomático, entregou-se aos estudos e à elaboração do trabalho com que o amor filial pagava o tributo ao torrão de nascimento, – Pernambuco, Seu Desenvolvimento Histórico (1893).
Nesse livro de mocidade, escrito aos 23 anos, desvenda-se logo a filosofia do historiador. É o trabalho em que volta ao período já estudado por Varnhagen para exame mais profundo da história do seu Estado natal.

Este livro, diz ele, “pretende ser singelamente o quadro da nossa evolução política e social nos quatro séculos de história que contamos, quadro desenhado a largos traços sem que, contudo, sejam desprezados os contornos valiosos e deixadas na sombra as feições interessantes”.
O bairrismo lhe exalta o coração no hino aos feitos dos seus maiores, para lançar as linhas gerais das suas primeiras lucubrações de sociólogo.

Pelas radiantes tradições de sua história, pelas harmônicas proporções de seu território, pela relativa densidade de sua população, pelo desenvolvimento de suas rendas, pela excelência de seu clima, pela uberdade de seu solo, pelo valor de seus produtos, pela facilidade de seus meios de transporte realizados ou realizáveis, acha-se Pernambuco destinado ao mais esperançoso futuro na nova fase da existência brasileira. Preparou-o a natureza para um formoso fado, rivalizaram os sucessos bélicos e os eventos liberais em circundá-lo de uma atmosfera sedutora e simpática, esmerou-se a fortuna em dispensar-lhe os seus dons mais preciosos...

E, desse âmbito romântico de entusiasmo provincial, parte para a mais vasta perspectiva dos problemas nacionais.

Assim Pernambuco tem-se, ao contrário de outros Estados e apesar de seu benigno céu e da fertilidade de seus campos, conservado ao abrigo das levas de imigrantes europeus, que parecem querer submergir o Sul numa inundação de estrangeirismo, desbotando a idiossincrasia do produto brasileiro, já diferenciado e semi-integralizado, de seus característicos superior ou amavelmente revelados na literatura, na política e em outras categorias espirituais. No Norte, apenas visitado por uma diminuta imigração, incapaz de sobrepor-se ao elemento nacional e contudo suficiente para corrigir-lhe qualquer moleza pela ausência de luta pela vida, vai-se refugiando a alma do Brasil, manchada e irritada do constante desapego a que assiste em outras partes do país, meio açambarcadas pelos estrangeiros, aquilo que representa o tesouro de nossas reminiscências de pátria em seu aglomerado de trabalhos e de glórias. Ali subsistirá, com efeito, o Brasil, quando um dia, não se havendo oposto um dique à maré enchente dos asilados de outros continentes, a nossa nacionalidade se tiver afundado numa mestiçagem heteróclita de raças e numa divergência esterilizadora de sentimentos.

Quaisquer que sejam as restrições que cada um de nós possa opor intimamente ao ardor nacionalista do jovem secretário de legação, força é admirar-lhe a bravura do primeiro ímpeto que nunca se desdisse no decorrer de existência da qual é nota característica integral afirmação de sóbrio brasileirismo.
E não só o problema interno lhe assoberbava a imaginação. Do céu límpido do seu Pernambuco, da sombra generosamente protetora dessas mangueiras que seriam a nostalgia de sua longa existência de exilado, o diplomata estreante desenhava já os pontos de vista da sua orientação firme nos problemas internacionais.

A recordação é interessante, porque, mais tarde, uma de suas atitudes discutidas e maldosamente explicada como acesso de despeito, já aí está delineada sem respeitar até a medida de conveniência que se impunha a funcionário público de modesta categoria.

Em face da Europa, ciosa de suas tradições porque delas timbra em fazer o seu brasão; esvaída no melhor do seu sangue pelas guerras e em boa parte da sua atividade pela emigração; enervada pelo militarismo arrogante e pelas repetidas paredes operárias, sacudida pelas discussões de prometedores programas políticos: ergue-se o colosso pletórico da América Setentrional, insolente da sua riqueza – crescente ao ponto de por ela sofrer o país crises de superabundância – absorvente em sua produção variegada; fundindo povos diversíssimos no cadinho de uma unidade de interesse que não de afeição; delirando na sua febre industrial. Não aspiremos nós, que poderemos ser uma das grandes nacionalidades do futuro, a seguir humildemente quer uma quer outra. Cumpre arrecearmo-nos do misticismo doentio da primeira, opondo à decadência que a espreita, o refinamento de sua cultura secular; bem como repudiarmos o naturalismo demasiado brutal da segunda, antepondo com fúria as preocupações materiais aos plácidos gozos espirituais.

O jovem secretário de legação tinha firmado o ponto de vista em que haveria de manter-se intransigente para origem de desgostos e abandono final da carreira.
Toda a sua obra de historiador, toda a sua carreira de diplomata, toda a sua honrada vida de cidadão, estava traçada nos moldes desse livro de juventude. Quem ler o Pan-Americanismo, escrito 25 anos mais tarde, não encontrará senão a continuidade de um pensamento que, com responsabilidades maiores e contrapondo-se à corrente, o Ministro Oliveira Lima assim se externava: “É preciso latinizar o Monroísmo, desmanchando-lhe o exclusivismo norte-americano que o tem caracterizado dando-lhe foros de antipática doutrina protetora.”

Nos livros que se seguiram: Aspectos da Literatura Colonial Brasileira (1896), Descobrimento do Brasil (1900), Reconhecimento do Império (1901) e uma série de memórias e conferências, ver-se-á sempre o alto espírito do historiador, verdadeiro, sincero, mas compenetrado da missão educadora do gênero literário.

A História é, em seu entender, “uma escola popular de patriotismo e moral”. Despreza os detalhes, os acontecimentos crus. Dele se pode dizer como se disse de Guizot: “Não é biógrafo-cronista, pintor de costumes, amador de anedotas; conhece o parlamento, o campo de batalha, a praça pública, não conhece a sala de jantar, a cozinha, a alcova, o quarto de despir.”
Parecerá talvez que há contradição entre as qualidades mestras do historiador, a franqueza, o culto da verdade, a selvagem sinceridade que tanto mal lhe fizeram, mas só a ele, e esse escrúpulo em deter a vista nos pontos menos brilhantes da nossa História. Não se furtou a sinceridade do escritor de enfrentar a dificuldade. Em uma de suas conferências na Universidade de Lisboa, prevendo que algum dos ouvintes o interrogasse se havia na História do Brasil alguma coisa de vergonhoso ou deprimente, antecipava-se bravamente em responder – “que, em verdade, não havia, mas que se houvesse não a mencionaria”.

A sua História era educativa. Ouçamo-lo, que sempre o faremos com proveito:

O passado não só envolve a tradição, como gera o incentivo da ação pela lembrança dos feitos gloriosos de outras gerações, que com a distância do tempo, perdem as asperidades e imperfeições e mais gloriosos ainda parecem, na sua idealização vaporosa, não se lhe conhecendo as sombras nem os defeitos. Assim, na pintura, por efeito da perspectiva, esfumam-se os contornos, esbatem-se as cores, corrigem-se as desigualdades e uniformiza-se a visão.

A História, insiste Oliveira Lima no estudo sobre Varnhagen, tem por intenção: – “formar e melhorar o espírito público nacional”.
Aí está a explicação do contraste violento que se nota entre os processos de crítica do historiador e a sua ação de jornalista, de político, de sociólogo. A tolerância e a benignidade com os homens do passado resultam da necessidade de extrair bons exemplos para zurzir os maus atores do momento.
Tenho aqui depoimento pessoal a dar: – Um dia, recente, tomei a liberdade de estranhar o desabrimento da sua censura à ação política interna e externa de um de nossos governos, acentuando a doçura da sua linguagem quando atenuava e indultava os atos do passado, e imaginando o efeito produzido por suas palavras no sul do Continente. Replicou:

Repare na diversidade dos assuntos de que me ocupo. Nas correspondências para La Prensa escolho assuntos em que possa abstrair das incapacidades que tão freqüentemente nos infelicitam no governo; no Jornal do Brasil não posso deixar de combater atitudes néscias e perniciosas. Ao meu país timbro em dizer as verdades sem indagar quem é ferido. Nem todas aliás digo para não parecer destemperado. Calo-me por vezes, muitas vezes mesmo, mas não minto para escondê-las.

Nessas linhas se estereotipa a compreensão que tinha do papel do historiador e do dever do homem público.
D. João VI, sua obra mais completa de historiador, é um produto desse feitio de espírito.
O velho rei passava à História envolvido ao manto do ridículo que lhe atraíam as circunstâncias penosas em que procurou refúgio para a sua coroa nas terras da colônia, a natural despreocupação de suas maneiras e hábitos e a infelicidade da aliança conjugal com uma mulher de espírito ambicioso e de costumes doentios.

O perfil do monarca seria retificado pela pena de Oliveira Lima. Os defeitos pessoais não foram ocultados, mas explicados com o critério do filósofo e atenuados pelo perfume da gratidão dos benefícios deixados:

Encontra-se sem que se faça mister grandes esforços de indagação, o primeiro motivo de sua extensa popularidade, na sincera amizade testemunhada pelo soberano português à sua principal colônia, no apego com que a ela se prendeu, na íntima correspondência que se estabeleceu entre a sua personalidade e o meio. Se menos bem lhe ficaram por isso querendo na metrópole, maior foi a simpatia que desde então cercou o seu nome na antiga possessão.

E conclui do seu estudo, que constitui dois fortes volumes, de obra documentadíssima: “Em D. João VI as imperfeições de todo ser humano não chegavam para que desmerecessem as sólidas qualidades. Os seus pequenos defeitos contrapõem-se a um belo conjunto de virtudes, raro num monarca despótico.”
Era esse o critério de Oliveira Lima julgando os homens do passado. Media-os pelos serviços prestados e não procurava o contraste de seus defeitos e erros. Tirava deles o proveito da lição para os contemporâneos e recomendava-os à gratidão dos que usufruem o patrimônio herdado. Na vida das famílias não é preocupação dos herdeiros apurar os processos por que os bens foram adquiridos. As galerias de retratos das casas nobres ostentam as condecorações e os troféus dos antepassados e não põem sobre a mesa, ao alcance do visitante, as crônicas de Saint-Simon.

E assim provoca a simpatia dos brasileiros para “o bom rei D. João VI, a quem o Brasil deve sua organização autônoma, suas melhores fundações de cultura e até seus devaneios de grandeza”.

*  *  *

Bem diferente do historiador foi o jornalista, o diplomata, o político. Nestes aspectos diversos é que se desenha principalmente o valor moral da individualidade de Oliveira Lima.
Fora do papel de historiador, aparece outro homem – um combatente com todas as audácias, ferindo à direita e à esquerda, dizendo as verdades nuas e cruas, sem se preocupar com os outros e sobretudo consigo.

A carreira de diplomata não poderia deixar de ser prejudicada por essa bravia indisciplina de um escritor prolífero, de um jornalista militante e de um lutador político em freqüente atividade.
Valeu-lhe algumas vezes a alta estima de historiador; mas não pôde evitar que tão cedo se interrompesse carreira onde difícil será encontrar iguais ao seu valor.
Dele podemos repetir com restrições (e com as devidas desculpas) o que ele aqui disse de Varnhagen:

O nosso historiador tinha qualidades negativas em diplomacia; era um impulsivo com rompantes de colérico e que se deixava instigar por considerações de eqüidade e de pundonor. Para ele a diplomacia não era a arte suprema de engolir desfeitas e disfarçar desaires. Achava-a compatível com a franqueza e a honestidade.

Não fugi do delicado assunto porque tenho contribuição pessoal a ajuntar aos numerosos documentos que da independência de caráter e do exagero de suscetibilidades nos oferece a carreira oficial do diplomata.

Faz-me prazer e creio que não vos será inútil no julgamento do ilustre cidadão, o conhecimento desse incidente, que determinou rompimento entre duas pessoas que mal se conheciam de vista e que depois chegaram a entreter relações estreitas (eu diria íntimas se não parecesse pretensioso), sem nunca se terem avistado de novo.

É o ponto inicial da série de fatos que deram em resultado o seu afastamento da carreira.
Um de nossos plenipotenciários desaviera-se com o seu ministro, que era o Barão do Rio Branco, e não guardava a linha das conveniências em relações oficiais e nas manifestações em público. Oliveira Lima, seu amigo pessoal, comentava pela imprensa, com liberdade demasiada, e com má vontade para com o chefe comum, os atos do seu colega.

Sinceramente, não vos poderia dizer por que razão entrei no barulho; ou o meu espírito de disciplina me indispunha contra o funcionário recalcitrante; ou a minha vaidade de vizinho, constantemente distinguido pelas generosidades do castelão de Petrópolis, me atirou na luta aberta por Oliveira Lima.
Certo é que um dia revoltei-me e escrevi, sob pseudônimo que me traía abertamente, instigando Rio Branco a um ato de energia – era urgente medida disciplinar que fizesse compreender ao plenipotenciário insubmisso, amparado no apoio da poderosa bancada de seus antigos companheiros de propaganda republicana, que a carreira diplomática, tanto como a militar, tanto como a sacerdotal, exigem supremos sacrifícios de discrição e de resignação.

Oliveira Lima não se dedignou de ir encontrar o anônimo e atirar-lhe o desafio nas colunas do Estado de S. Paulo para onde escrevia.
Com a violência habitual suspeitou-me de emissário do Barão do Rio Branco e atribuiu-me aspirações a posto para o qual só muitos anos depois, com surpresa de todos e principalmente minha, recebi de outro governo a honrosa investidura.

E nas suas crônicas semanais, lobrigou com outros vícios, o do interesse direto – “No Brasil já se entrou perigosamente, desmoralisadoramente, cinicamente, a propalar que a melhor condição para a diplomacia é ter fortuna.”

Felizmente não me abandona a calma, nem no mais aceso da refrega, e repliquei com outro artigo em que sustentei serenamente que os dois altos funcionários deviam ser postos em disponibilidade. Mas, felizmente também, nunca me abandona o sentimento de admiração pelos valores reais e a sinceridade que protege a fraqueza do meu pulso ditou estas palavras no final do artigo-represália – “Ao menos o Sr. Oliveira Lima é um insolente de talento e trabalhador. Falta-lhe civilidade (eu era a vítima), mas tem alguma coisa para contrapeso; a tolerância do governo em relação a ele justifica-se.”

Bem percebereis a necessidade de ressuscitar estas páginas esquecidas, ignoradas da geração atual, quando elas me poderiam ser lembradas contra a condenação que ora lavro das manobras políticas que, de crescendo em crescendo, obrigaram o diplomata a pedir sua aposentadoria.
Oliveira Lima vinha intrigado com a política dominante desde o momento em que tomou parte ativa, e, como sempre, apaixonada até à violência, pela candidatura Rui Barbosa à Presidência da República em 1909. Na sua absoluta despreocupação das comodidades pessoais, coerente sempre com o seu modo de aproveitar as lições do passado, sem indagar se doía aos contemporâneos a comparação, manifestou-se ele em expansão sincera numa palestra trazida a público com as demasias da reportagem, frisando certas superioridades da monarquia deposta. Ao Ministro de sua pasta, que era então Lauro Müller, apresentou em carta as explicações que julgou necessárias.

Deu-se por satisfeito o Governo, mas não se achou contente a política; e no terreno da recusa à aprovação do ato já resolvido de sua remoção de Bruxelas para Londres, surgiu a intransigência de uma política compressora, excitada de fervor republicano. A Oliveira Lima foi notificada a condição de escrever carta ao árbitro da política nos mesmos termos da carta ao Ministro, mas com certo complemento reafirmando, em termos mais claros, seu devotamento à República. Bem se compreende que de homem da envergadura de Oliveira Lima esta proposta tinha um non possumus prévio e irredutível. Não seria digno de outro, não seria possível tratando-se dele, discutir condições de submissão a forças extralegais.

“É evidente”, disse ele pelo Jornal do Commercio, “que não escrevi carta alguma, no que fui aplaudido pelo Sr. Ministro do Exterior. Seria uma humilhação a que um homem de brio se não devia sujeitar. Que confiança, de resto, deveria merecer um funcionário que para segurar um posto, por mais importante, se prestasse a semelhante papel? A minha lealdade ao regime estava provada por 23 anos de leais serviços, durante os quais nunca pudera ela ser de leve posta em dúvida.”

*  *  *

A carreira diplomática estava cortada. A vocação irresistível do historiador faria ouvir de novo sua voz imperiosa e as vistas sevoltaram firmes para “... esse espírito de investigação, esse imenso apetite de verdade que faz abraçar a vida com ardor ou suportá-la com coragem”. Mas, não há dúvida que para a sua obra de fazer a História do Brasil, se a carreira lhe tirava algum tempo e criava-lhe, a espaços, dificuldades, era sempre uma esperança de novos estágios nas catacumbas onde vivem nossos documentos históricos.

Londres era ainda um grande arsenal sonhado; depois, Lisboa. Em Londres estivera como secretário cinco anos e dessa permanência resultou o Catálogo de manuscritos relativos ao Brasil existentes no Museu Britânico, que do erudito Salvador de Mendonça mereceu este elogio: “No dia em que Oliveira Lima puder fazer na Torre do Tombo e nos outros arquivos de Portugal o que fez em Londres, possuirá o Brasil o material quase completo para a sua História.”

Londres, onde pretendia reencetar estudos e que lhe fora trancado pela brutalidade da política, e Lisboa, que era um sonho acariciado para depois, acesso cobiçado de diplomata-historiador, lhe ficaram também defesos, mesmo na vida particular a que logo voltou pela aposentadoria. A sua intransigência de princípios, a sua irredutibilidade de atitudes, não lhe permitiram a imobilidade no conflito europeu; e mais uma vez sacrificou a comodidade à irreprimível paixão de dizer o que sentia. Partidário da neutralidade do Brasil na Grande Guerra, compreendeu que o seu refúgio era a União Americana e para lá se transferiu com os seus livros.

*  *  *

E lá trabalhou; e lá o surpreendeu a morte.
Apropriando-me de pensamento de Joaquim Nabuco: – “Era como todas as vinganças que o homem de coração toma do seu país, uma vingança de amor.”
O que ele fez nesses doze anos de degredo foi somente trabalhar mais livremente para o Brasil.
Lede o catálogo das obras que saíram ainda de sua pena e vereis que só há História do Brasil ou problemas brasileiros. Ser-lhe-ia fácil, escrevendo admiravelmente o inglês, escolher assuntos mais interessantes para o povo que o hospedava e mais rendosos para ele.

Mas, o que resultou desses doze anos longe do Brasil foram quatro livros e uma colaboração assídua de imprensa para o Brasil e para Buenos Aires sobre assuntos brasileiros. Os livros foram: O Movimento da Independência, História da Civilização, D. Pedro e D. Miguel e o livro póstumo O Império Brasileiro, trabalho sem par no assunto, pela profundeza e pela sinceridade das observações.
Com um Tratado de Direito Internacional que está terminado, e com as suas numerosas conferências e numerosíssimos artigos de imprensa, preencher-se-ia uma obra da qual se pode dizer, com pequenas alterações, o mesmo que ele disse da de Varnhagen:

Com essas publicações avulsas sempre úteis e sempre interessantes organiza-se a mais curiosa das bibliotecas com volumes de todos os formatos, bulindo em não sei quantos assuntos, escritos em português, em espanhol, em francês, em alemão e impressos nos mais variados lugares.

Nessa biblioteca ocupariam também lugar saliente os livros que escreveu nos postos onde não podia dar aplicação às suas aptidões de historiador brasileiro. – No Japão, O Secretário d’el-Rey – peça histórica, Pan-Americanismo (Bolívar, Monroe, Roosevelt), Machado de Assis et son œuvre littéraire, A América Latina e América Inglesa, série de conferências feitas em 12 universidades americanas, Coisas Diplomáticas, onde advogou, contra o espírito de classe, a fusão das carreiras diplomática e consular; Nos Estados Unidos, impressões políticas e sociais do grande povo; e Na Argentina, livro que muito valeu à aproximação e à confraternidade de dois povos.

*  *  *

Conhece o Brasil a obra do seu historiador, a folha de serviços não insignificantes do diplomata, para perdoar-me que tanto tempo tenha furtado ao elogio de sua obra e para que me reste agora tão curto espaço do que os estilos acadêmicos e a vossa benevolência me concedem para ocupar-me do cidadão e do homem público sobre cujas atitudes desassombradas era natural que se despejassem as cóleras daqueles aos quais magoava freqüentemente a sua indomada franqueza. Neste ponto, tenho que voltar à minha carreira de advogado, porque o despeito dos ofendidos criou uma atmosfera enevoada que é de nosso dever dissipar.

Oliveira Lima é acusado de ter legado a sua valiosa biblioteca, riquíssima de livros brasileiros e de história sul-americana, a um país estrangeiro, onde se exilara por despeito, de onde não pensava em regressar à pátria e onde quis que os seus ossos descansassem eternamente.
Aqui lhe devemos a solene reparação de levantar até este recinto tão injustas acusações para delas fazer sair brilhante e aureolada a figura moral do ilustre compatriota e para aprendermos no seu exemplo a amar a pátria com sacrifício e a servi-la com inteligência.
Processa-se ainda o inventário dos pouquíssimos bens de fortuna de Oliveira Lima e é fácil ir ler em cartório o seu testamento:

No caso da referida minha esposa falecer ao mesmo tempo que eu, no caso de sinistro, por exemplo, ou de ter já falecido em data anterior à minha morte, será herdeira única e universal de toda a minha herança a Universidade Católica da América com sede em Washington, à qual já fiz em vida a doação de minha biblioteca com o seguinte encargo e fim expresso – de custear e manter uma cadeira de língua portuguesa e história literária e econômica de Portugal e do Brasil, bem como, se houver sobras, de distribuir subsídios entre quaisquer estudantes pobres, sem distinção de nacionalidade nem de cor, que cultivarem com zelo essas matérias.

A data é 1923; mas expressamente confirma a doação no testamento de mão comum que ele e sua mulher faziam em 1903 em Lisboa, antes da missão diplomática do Japão, e portanto no período em que se lhe abriam todas as perspectivas de brilhante carreira no serviço público.
Os acontecimentos posteriores determinaram que a doação da biblioteca fosse antecipada e que os dois cônjuges se desfizessem da parcela mais valiosa do seu patrimônio, a única valiosa poder-se-ia dizer, entregando-a em vida, não, como geralmente se diz, aos Estados Unidos da América do Norte, mas à Universidade Católica de Washington, isto é, a uma instituição de caráter universal, cujos recursos materiais permitem manter íntegra, aumentá-la, aquela enorme riqueza acumulada com as migalhas arrancadas ao conforto e ao gozo da vida de modestíssimo casal.

Se quereis uma filosofia maldosa, admiti a explicação de que esse usurário de livros buscava prolongar a existência do tesouro legando-o a quem mais esperanças dava de poder guardá-lo com carinho.
Se quereis a explicação verdadeira, acreditai, como eu e como todos que dele andávamos perto, que ele quis que a sua biblioteca que era rica e que o seu museu histórico tivessem a utilidade de servir de consulta à história e à aproximação inteligente das duas Américas. Ali, naquele templo de história pan-americana, se ensina a língua portuguesa, a história, a literatura e a economia do Brasil e de Portugal.

A não ser o sentimento inferior de ciúme da velha mãe-pátria da qual o historiador não nos quis separar, que outro sentimento pode brotar senão o da gratidão ao funcionário que converteu em livros, mapas e documentos, as sobras de parcos ordenados e ajudas de custo, para legá-los, juntamente com os poucos recursos que restavam de bens herdados, àqueles que quisessem estudar a História do Brasil e a de Portugal e aprender a nossa língua?

O meu papel de advogado me obriga a insistir ainda na nota triste das injustiças com que é julgado o ilustre extinto: – ele se expatriara; não voltaria ao Brasil, nem quis que os seus ossos aqui voltassem.
Perdoai que a função de advogado me obrigue a fazer soar, na solenidade desta festa, a nota dolorosa do remorso.
Lede estas palavras de uma de suas últimas cartas, a que tem a data de 15 de outubro de 1927:

Como me seria agradável ver os bons amigos que ainda tenho e essas terras de tanta saudade. Mas, além de ter afazeres de professorado, uma viagem, com o preço atual das passagens, representa grande despesa e não estou em condições senão de ir equilibrando meu viver quotidiano com os auxílios do meu trabalho de professor e de publicista dado a estudos históricos, porque me distraem, e à crítica dos acontecimentos e dos homens do dia, porque é o meio de não envelhecer espiritualmente.

É desse mesmo dia outra carta que o Dr. Levi Carneiro trouxe a público:

Feliz foi a lembrança do nosso Amigo Alberto de Faria de transmitir-lhe o conteúdo de minha carta sobre o seu belíssimo discurso.
V. Ex.a acerta admiravelmente quando diz que me será agradável saber a conta em que sou tido... Longe da Pátria, mas sem a esquecer (e como o poderia, se dela trato diariamente?) essa é a minha única recompensa e a única a que aspirei. Gostaria muito de ir aí rever a terra e os amigos, mas circunstâncias há que me vedam essa satisfação.

Estas circunstâncias sabeis quais são, pois que, para bem assinalá-las, as duas cartas têm a mesma data.

*  *  *

Eu não teria a crueldade de falar-vos de coisas tão tristes nesta solenidade, carregando a nossa consciência da dor de vermos sofrer no exílio um patrício ilustre que acumulou com as economias de muitos anos um tesouro em livros que são já os livros de consulta num grande centro para o estudo da história e da língua do Brasil, se não pudesse conjuntamente desafogar o nosso remorso, dizendo-vos que estava iniciado um movimento consolador de reparações morais ao insigne lutador.
O digno Presidente atual do Instituto dos Advogados já o consultara, de acordo com alguns amigos, sobre o programa de uma série de conferências aqui, em Pernambuco e em São Paulo.
O ilustre Governador de Pernambuco já o tinha convidado a vir ao Brasil para tomar aos ombros a tarefa de completar até os nossos dias a história do próspero Estado nortista.

Por seu lado, o Governo Federal tinha propósito de fazê-lo voltar ao serviço da carreira.
Infelizmente nenhuma dessas reparações pôde ser tornada efetiva por motivo da crise que o prostrou pouco tempo depois e cujo desfecho foi fatal.

O recente movimento diplomático teria dado ao Governo meios de pôr em posto elevado o diplomata da estirpe ilustre daqueles que, antes das credenciais de seu país, já possuem as credenciais da inteligência nas estantes das bibliotecas dos Ministérios, a estirpe em que esta Casa se ensoberbece de contar Magalhães de Azeredo, Luís Guimarães Júnior e Hélio Lobo.

Difícil seria encontrar quem mais nobres credenciais próprias pudesse ajuntar às de seu país.
Em Bruxelas, nosso conterrâneo, o glorioso rei Alberto reconheceria ao novo Embaixador o Ministro cuja conferência – La Conquête du Brésil – ele honrou com a sua presença, comparecendo em 1910, pela primeira vez em público depois de sua subida ao trono, em grande uniforme, no meio de sua corte e de seus homens de ciência.

Em Tóquio, seria o escritor que, em 1903, anunciava ao Brasil o Japão moderno, livro de alto descortino, e que ali realizava, como Encarregado de negócios, duas conferências em inglês sobre o desconhecido Brasil.
Em Portugal, encontraria funcionando a Cadeira de Estudos Brasileiros que inaugurou com uma série de conferências em 1923, a convite da Universidade de Lisboa.

Em Paris, os meios literários tomariam de novo contacto com o conferencista que lhes foi apresentado no anfiteatro Richelieu por Anatole France celebrando “Le Génie Latin” em Machado de Assis, e acolheriam fraternalmente o historiador a quem coube a honra de ser o primeiro brasileiro que fez na Sorbonne um curso: “Formation Historique de la Nationalité Brésilienne”, a obra mais perfeita para dar ao estrangeiro uma impressão de conjunto do nosso desenvolvimento nacional, “et qu’un Français n’écrirait pas avec une clarté plus facile”, como disse o professor Martinenche.

Nos Estados Unidos, ele seria o universitário conhecido e estimado, cuja morte o mundo científico americano registrou como uma perda sensível do magistério da grande nação e cuja indicação para o posto estava feita pelas duas mais altas mentalidades da época, Rui Barbosa, que escreveu que Oliveira Lima “era o único homem cuja escolha não derrogava a sucessão de Joaquim Nabuco”, e Nabuco, que, preocupado com a falta que ia fazer aos interesses da política internacional por ele inaugurada e sabendo embora que não contava com a inteira solidariedade do antigo amigo, ainda assim repetia, pouco antes de morrer, que era a ele que cabia o anel de Alexandre.
Na República Argentina, encontraria de novo no alto posto o Presidente Irigoyen, que, em 1919, surpreendeu a sociedade buenairense e o mundo diplomático, indo em pessoa, ao hotel onde se alojava o conferencista Oliveira Lima, apresentar-lhe as homenagens da sua admiração.

*  *  *

Não será em nossa terra que seus ossos se consumirão. É disposição testamentária de muitos anos passados:

Determino que meu corpo descanse onde ocorrer meu falecimento, sepultado ou cremado de preferência, se minha religião o não vedar, sendo adquirida uma concessão perpétua em campa rasa, a mais modesta possível, e não sendo em caso algum meus restos objetos de transporte post mortem. Como epitáfio escolho este somente: – Aqui jaz um amigo dos livros – sem indicação de nome.
Como vedes, há nisto apenas um traço de extrema modéstia. Se não morreu aqui, se seus ossos vão ser guardados em terra estranha, foi pela fatalidade que não nos permitiu pagar dívida que não nos vexamos de reconhecer.

A terra que recebeu o corpo de Oliveira Lima é terra nossa amiga e terra que queria a ele como a um filho.
Junto de seu túmulo e de seus livros permanece, muda de dor e sublime dedicação, a companheira ilustre que foi a auxiliar e colaboradora diária de sua obra, exemplar puríssimo da alma varonil da mulher brasileira.

A cena é tétrica, mas consoladora do nosso sofrimento.
Para os da têmpera de Oliveira Lima escreveu o Magno Poeta:

Que toda a terra é pátria para o forte.