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O encanto do Rio

 

O Rio de Janeiro possui uma conjugação ímpar de fatores naturais e históricos que dão origem à sua especificidade, ao que ele tem de único num país imenso e da maior variedade física e cultural como é o Brasil. Surgido num dos recantos, sem qualquer favor, mais belos de todo o planeta, podemos dizer que poucos eram, como ele, tão pouco aptos para abrigar uma cidade. Apesar da baía de valor extraordinário para os navegantes, o Rio de Janeiro se ergueu quase privado de terreno plano, entre o mar e as montanhas, à sombra de suas incomparáveis formações graníticas, e pobremente fornecido de água, inicialmente oriunda do pequeno rio Carioca, que deu nome a seus habitantes, o que gerou quatro séculos de insolúvel falta de água, até a meritória obra de Carlos Lacerda na bacia do Guandu. O Rio, portanto, nasceu em luta contra a sua magnífica natureza, em conseqüência do fabuloso ponto estratégico que representava a sua baia, disputado a ferro e fogo por franceses e lusitanos até a vitória de Estácio de Sá, paga com a própria vida.

Com o deslocamento da área de maior importância econômica da Colônia do Nordeste para Minas Gerais, com as minerações, era mais do que natural a transferência do governo para esse porto tão bem situado, e daí nasce outro dos fascínios da cidade. Capital da Colônia, do Reino Unido, do Império e da República durante quase duzentos anos, de 1763 a 1960, o Rio de Janeiro foi o palco de muitos dos mais transcendentes momentos da história brasileira, da execução de Tiradentes, da sagração de D. João VI e dos dois imperadores, da abolição da escravatura, da Proclamação da República, dos mais variados momentos da vida republicana. Traduzindo-se materialmente, essa sucessão de fatos faz da cidade um grande museu da história e da arte brasileiras, com algumas das mais belas igrejas, fortalezas e palácios do pais, com museus e bibliotecas sem paralelo, um patrimônio histórico de valor inapreciável e tantas vezes pouco lembrado perante as atrações naturais e humanas da urbe.

E é justamente o contingente humano que forma o terceiro elemento do encanto único do Rio de Janeiro. A própria condição de capital, que vigorou até há pouco mais de quarenta anos, reuniu na cidade habitantes de todos os quadrantes da pátria, do Oiapoque ao Chuí, do litoral à mais longínqua fronteira oeste. Esse amálgama de todos os brasileiros, unido a um forte contingente lusitano, deu ao carioca a sua feição de síntese humana das características que se imaginam brasileiras, ao mesmo tempo que fez do seu habitante o menos regional, o menos bairrista, o menos provinciano de todo o território nacional. O humor carioca, pode-se dizer, elevou-se a uma forma nacional de humor, uma instituição mista de crítica, irreverência e independência de espírito da qual mesmo os brasileiros mais afastados geograficamente da capital fluminense sentem um secreto orgulho.

Com todos os seus numerosos e graves problemas, que preocupam todo o país na mesma dimensão da sua importância simbólica para ele, o Rio de Janeiro - de longe o lugar mais conhecido internacionalmente de nosso inteiro território - me parece cada vez mais se resumir nessa palavra aqui já lembrada: síntese, e síntese às vezes profética, do que há de melhor e pior em nossa pátria. Mas pairando acima de todos os problemas, de todas as carências, vige o encanto único de caminhar por suas ruas, admirar as suas paisagens inigualadas, e conviver com o seu povo, estado de graça que pertence a todos os brasileiros - e não só eles - aqui recebidos com a cordialidade que se imaginaria reservada apenas aos seus mais tradicionais habitantes.

Revista TCMRJ (RJ) Setembro 2007 n. 36

13/11/2007 - Atualizada em 13/11/2007