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ABL na mídia - Social 1 - José Paulo, um imortal que brilha como advogado e escritor

 

Por João Alberto

José Paulo Cavalcanti Filho é uma das figuras mais queridas do Recife. Alegre, espirituoso, sempre faz o maior sucesso nos eventos a que comparece, sempre ao lado da sua musa, a escritora Maria Lecticia Cavalcanti, que ele chama sempre de Dona Lecticia. Comanda um dos mais importantes escritórios de advocacia do estado e é membro das academias de letras de Pernambuco, Brasil e Portugal. Nesta entrevista, destaca especialmente seu lado humano.

Como é a divisão do tempo entre o advogado e o escritor?

No escritório, clientes. Em casa, papel e caneta, dinossauros não gostam de telas.

Primeiro surfista do Nordeste, como eram suas pranchas?

Primeiro de madeira. Surfava sozinho. Foram chegando os amigos. A seguinte, em fibra de vidro, veio do Havaí. O momento em que você sente que já pegou a onda, e ainda não desceu, é mágico. Não se compara com nada, neste mundo. Adrenalina. Só entende quem viveu. Até fiz uma série para a televisão, no canal SporTV, em que abri e fechei todos os 10 capítulos. Tento e não consigo achar, hoje, na internet. Pena.

Como é sua relação com o mar?

Íntima. Na casa de Piedade tem um sumidouro, em frente, e já fui 3 vezes lá dentro, bem longe, buscar jovens que se afogavam. Foi bom, para eles, que escaparam; e para mim, que estou contando essa história vivo.

Como começou o namoro com Maria Lecticia?

Faz muito tempo. Faremos, agora, 54 anos de casados. E já estou pensando em como vai ser a comemoração dos 100 anos.

Lembrança da cirurgia bariátrica e dos problemas que teve?

Dona Lecticia garante que fiz. E, eu, digo que não. Quem tem razão?

A Justiça brasileira é cega?

Antes fosse. Minha maior crítica é em relação ao Supremo, que hoje busca mais e mais poder. Pior, em um país fraturado como o nosso, que precisa de paz, é ser quem mais promove a radicalização. Como se seus ministros tivessem ódio no coração e sangue nos olhos.

A Comissão Nacional da Verdade fez um bom trabalho?

Por mim, contaria os dois lados. Votei assim, na Comissão. Mas não havia tempo. Em Portugal, a Comissão do Livro Negro teve 10 anos para cumprir seus trabalhos. E, nós, apenas dois. Como a história dos vencedores era já bem conhecida, preferimos agora contar a dos vencidos. Foi bom. Creio que valeu a pena.

A traição ao seu pai, rubro-negro doente, para torcer pelo Náutico.

Culpa de Jota Soares. Pequeno ainda o Sport vencia o Timba, que tinha um jogador a menos e virou o jogo. O comentarista, na Rádio Olinda, ficou repetindo “Time de Heróis”. Virei para meu pai e disse “Vou passar a ser desse time de heróis”. Até hoje. Obrigado, Jota Soares.

Mesmo se dividindo entre Recife e Portugal, ainda diz que sua casa é na capital pernambucana - Arquivo Pessoal

Repercussão de artigo em que defendeu a fusão do Náutico e Santa Cruz.

Educativo. Porque aprendi, então, que futebol é sobretudo paixão. Você prefere ver a mulher morta que nas mãos de outro. E, só para lembrar, “Hexa é Luxo.”

Como é ter quatro casas: Recife, Lisboa, Serra do Maroto e Lagoa Azul?

Casa é só no Recife. Origem, caminho e destino, Onde, segundo Cícero Dias, o mundo começa.

Hora preferida para escrever.

Sem dúvida, à noite, Melhor ainda, na madrugada. E sempre ouvindo música, clássica ou jazz.

Qual foi o primeiro dos seus 18 livros e qual o próximo?

Primeiro foi o livro certo na hora errada, “Aspectos Institucionais da Comunidade Econômica Europeia”. Ninguém leu. E o mais recente, editado pela Academia Brasileira de Letras, “Bartolomeu Fragoso, primeiro poeta do Brasil”. O próximo será Conversas de ½ Minuto; que penso, ou espero, o leitor vai gostar.

O primeiro contato com a obra de Fernando Pessoa.

Com 16 anos ouvi a Tabacaria, de Pessoa. Escolhido, pelo jornal “Liberation”, de Paris, O maior poema do século XX. Na voz de João Villaret, que é um anjo. Ou quase. Fiquei paralisado de encantamento. Começou alí.

O trabalho para fazer o livro dele. Esperava que fosse tão premiado e elogiado?

Não. Escrevi para mim. E o resultado foi uma (enorme) surpresa. Ganhou todos os prêmios no Brasil, primeiro lugar Jabuti e Bienal do Livro, Livro do Ano pela Academia Brasileira de Letras. Mais um em Portugal (Dário Castro Alves) e dois na Itália (Il Mollinello). É o livro sobre Pessoa mais lido e mais traduzido no mundo (12 países), dá para acreditar?.

Como foi seu encontro com Fernando Pessoa em Lisboa?

Na Praça Camões. Decidi segui-lo. Ele foi trocando de calçada e eu atrás. Até que, na Rua Ivens, olhou uma última vez para mim e saiu correndo. Maria Lecticia disse que era só um sósia que fugiu apavorado. Prova de que ela não entende nada de fantasmas.

Seu nome foi lembrado muito para ser ministro do STF. Teria sido uma boa?

Deixe isso prá lá, amigo.

Qual o caso jurídico que mais lhe deu prazer?

O de um cidadão que apareceu no escritório dizendo iria se suicidar. Pediu que explicasse à família suas razões. Respondi que tinha solução melhor, ele disse “eu prefiro”, e acabou tudo bem. Com ele feliz.

Comportamento como pai, foi duro ou bonzinho?

Em casa, responsável pela educação foi sempre dona Lecticia. Terei contribuído apenas com o exemplo, talvez. Ensinando aos filhos não fazer nada errado, nessa vida. E satisfeito, hoje, por ver que aprenderam bem a lição.

Relação no Ministério da Justiça com Fernando Lyra e Joaquim Falcão.

Lyra não conhecia, quando me convidou, e acabou sendo um dos grandes amigos que tive pela vida. Enquanto Joaquim foi sempre um irmão.

Influências do pai, José Paulo e do sogro, Armando Monteiro Filho.

Meu pai não morreu, vai viver sempre dentro do meu coração. E dr. Armando era um homem especialíssimo. Entre outras virtudes, ensinou que se pode fazer política com ética.

Como se tornou um fumante inveterado de charutos?

Fui asmático. Nunca fumei cigarro. Só que a lembrança mais remota que tenho de meu pai é o cheiro de seus charutos Suerdick (naquele tempo). Segue a vida, meu pai começou a morrer e eu a fumar charutos. Nem preciso ir a um psiquiatra para saber a razão.

Como se sente tri-imortal, em Pernambuco, Brasil e Portugal?

Alguém com amigos. Complicado é que, hoje, recebo em média três livros por dia, com longas dedicatórias, de gente que nem conheço. Leio e comento, eles todos. E prefácios eram, em média, quatro pedidos por semana. Decidi que não faço mais. Abri apenas uma exceção para o livro do JCPM, não teria condições de negar alguma coisa a João Carlos Paes Mendonça.É desumano. Só que os amigos continuam a pedir. Não a mim, mas a dona Lecticia, que vez por outra responde “Ele aceita”. Pode?

A Importância do 7 de setembro de 1985 na sua vida.

Foi um dia especial. Em 1969, fui proibido de estudar no Brasil. Por sorte, acabei ganhando Bolsa de Estudos, com tudo pago, em Harvard. Melhor universidade do mundo. Depois ainda me proibiriam de ensinar. Meu pai disse, então, “não se preocupe, filho, que um dia você ainda vai por isso tudo no seu currículo”. Nessa data da pergunta, eu era Ministro da Justiça. Fiquei ao lado do presidente Sarney, no desfile. E, de noite, chorei como um condenado. Foi uma espécie de catarse. Bandeira e hino deixaram de ser símbolos de opressão. Desapareceu qualquer resto de amargura. E compreendi que não se constrói o futuro com olhos no passado. Acabei transformado em alguém diferente. E melhor, creio. Só lamento é que tantos amigos continuem presos naquele tempo.

Como lida com as repercussões de suas declarações polêmicas?

Sou, pelo menos assim me considero, um homem livre. Com direito de dizer o que penso. Não tendo um arranhão, nessa vida. Se alguém assim tiver receio de dar suas opiniões, a liberdade não serve para nada.

Algum dia pensou em ser político?

Jamais. Nunca fui filiado a nenhum partido. Não tenho os códigos dessa atividade. Max Weber definia a ética da vida pública como uma “Ética das Responsabilidades”. Não dos meios, como a dos homens comuns, mas dos fins. Melhor deixar isso para quem seja mais preparado.

Relação com os colegas das academias.

Muito boa. E ainda bem. Que vamos ter que conviver todos, juntos, até que um de nós se despeça dessa vida.

Como é o chá da Academia Brasileira de Letras?

Especial. E hoje com bolo de rolo, por conta do Vilaça; e água de coco, perdão, por minha culpa.

Já tentaram lhe matar nas redes sociais. Já escolheu o epitáfio?

Dona Lecticia disse que vai por, no meu túmulo, uma frase que vivo repetindo “Ai, que vida boa”. Mas não creio. Ari Barroso, quando sentiu que partiria, deixou escrito o seu, “Aqui jaz um homem que odiava Jazz”. E a mulher não cumpriu sua vontade, conferi no cemitério de São João Batista, no Rio de Janeiro. Como já não estarei aqui, para reclamar, será como quiserem. Não faço questão. E, só para lembrar, a vida é mesmo boa.

RAIO X

Time: Náutico, claro.

Comida: Milho (assado ou no micro-ondas).

Restaurante: Leite.

Santo de fé: Dona Lecticia.

Livro: O realismo mágico de “100 Anos de Solidão”, de García Márquez.

Hobby: Tocar piano (Bach é Deus).

Filme: O primeiro que me marcou, bem pequeno ainda, “7 Noivas para 7 Irmãos”.

Cantor: Leonard Cohen.

Lugar bonito: Recife.

Sonho: Viver em paz, até o fim, daqui a 200 anos.

Matéria na íntegra: https://social1.ne10.uol.com.br/joao-alberto/2025/05/26/jose-paulo-um-imortal-que-brilha-como-advogado-e-escritor.html

27/05/2025