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ABL na mídia - Folha de São Paulo - Livro de Godofredo de Oliveira Neto é o melhor rascunho de nossa personalidade

 

Godofredo de Oliveira Neto é autor de vasta e importante obra literária, na qual se destacam seus ensaios e romances. No caso desses últimos, recordo bem o impacto que me ficou após a leitura desafiadora de "Marcelino" (Imã Editorial), que conta a história de um jovem pescador, descendente de guaranis, africanos e açorianos, que sai do sul do país e chega "inocente" numa turbulenta capital federal em plena ditadura do Estado Novo.

Agora me encontro diante de um novo desafio. Oliveira Neto, mais uma vez, me submete a outro intrigado dos seus enredos, com o surpreendente "O Desenho Extraviado de Hieronymus Bosch" (Almedina), livro intuitivo, psicológico e assertivo no que diz respeito à sua linguagem, concisa e modelar, e também quanto ao domínio seguro da mão do escritor, tecendo tramas que nos levam a um caminho sem volta até a leitura final dos seus textos.

Como toda história de Oliveira Neto, seu novo romance se passa em três contextos diferentes: Nova York, Veneza e Santa Catarina —seu estado natal.

Como já se tornou uma marca do seu estilo, as cidades sulinas são partes do cenário de seus livros, onde aparece sempre como ponto de partida. Em "O Desenho Extraviado de Hieronymus Bosch" não é diferente.

Como parte da narrativa, marcada por algum suspense e ação, contínua e forte, Oliveira Neto, em capítulos curtos, vai desvendando a sorte de personagens e a busca do seu principal enigma, o "esquisse" ou um esboço de autoria do pintor Hieronymus Bosch (c.1450-1516) —uma suposta relíquia do século 16, que está nas mãos da família de Luigi, principal narrador do romance, desde o século 20. Envolvido diretamente pela ideia de resgatar o milionário desenho, se envolve com o ganancioso Domênico, parente rico da família e ser bastante maquiavélico.

O vaivém dessa trama, com muitas entradas e saídas de cafeterias, é que ajuda a sedimentar nossa imaginação quanto ao seu grande desfecho, 32 capítulos depois. O final do romance, como é de se esperar, nos impõe a refletir sobre a vida, a humanidade das pessoas e a forma com que o mundo se apresenta nos dias de hoje, em qualquer lugar do planeta, onde habita a espécie humana.

Do princípio ao fim, Oliveira Neto nos dá lições de moral, nos faz viajar por interessantes ambientes, matando nossa curiosidade histórica, com aulas de geo-sociopolítica e cultura. Além de expor seu porte erudito, bem afeito ao homem viajado que é, traz em sua obra referências de poetas e leituras —como do catarinense Cruz e Sousa, que, como se sabe, é sua maior paixão.

Numa das brilhantes passagens do seu romance, assim o autor condensa o pensamento de um dos seus mais enigmáticos personagens:

"Viajo, a cabeça viaja, o corpo voa; levito, dou ordens à natureza, os animais da floresta permanecem estáticos, congelados, aguardam minhas diretivas; homens e mulheres se aproximam, ajoelham-se, pedem bênção, só vos resta o inferno, digo com voz rouca. Seus pecadores!"

Esta é uma leitura potencializada pela boa escrita de sempre. E o seu autor, como um dos nossos melhores prosadores, demonstra, firme e maduro, sua permanente habilidade de narrador e contador de histórias.

Matéria na íntegra: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/tom-farias/2024/12/livro-de-godofredo-de-oliveira-neto-e-o-melhor-rascunho-de-nossa-personalidade.shtml

12/12/2024