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Um bom furacão

 

A Europa recebeu fascinada o presidente Obama. Era como se fosse uma espécie desaparecida que vinha da América redescoberta. Quase o mesmo sentimento com que em Rouen, em 1562, Carlos 9º recebia entre festas e curiosidades os desconhecidos habitantes do novo mundo. Entre os estragos que George W. Bush fez estava a desastrosa separação com os europeus, seus aliados e ancestrais, pelas divergências que alimentou com seu sentimento guerreiro e sua política de fechar caminhos.


Chega um Obama e diz que não prescinde da Europa, que os Estados Unidos desejam exercer uma liderança compartilhada, e não mais a solidão das decisões de força. Em vez de um arrogante produtor de petróleo do Texas, surge um homem simples, afável, amante do diálogo e com os ouvidos abertos para ouvir.


Divide opiniões e responsabilidades. Condena o erro do Iraque e justifica os que não participaram dessa aventura, clama aos iraquianos que assumam sua terra e seu destino, reconhece o sofrimento dos palestinos e propõe um novo modelo de encarar o conflito, faz seu giro pela Inglaterra, França, Alemanha e República Tcheca, onde propõe uma distensão de relações e, o que é mais importante, afasta qualquer hipótese de uma nova Guerra Fria.


Na Turquia, recusa a tese do choque de civilizações e, com os olhos extasiados na cúpula da Mesquita Azul, diz que não há uma confrontação com o islã e que nosso Deus é o mesmo deus. A Turquia foi e sempre será um lugar estratégico entre o Ocidente e o Oriente e ali é o lugar próprio para falar verdades comuns à humanidade. O poder de convencimento de Obama mostra que o caminho certo de combater o terrorismo como uma prática insana que atinge toda a humanidade é a cooperação de vontades, e não somente a multiplicação das armas e das tropas. A Otan entende esse chamamento e se dispõe a não só lutar no Afeganistão, mas a ajudá-lo a levantar-se com investimentos no setor econômico e social, substituindo a cultura do ópio, essa droga tão contraditória com a beleza das cores das papoulas.


Ao Irã, em vez de chamá-lo de “Império do Mal”, chama-o a dialogar e a abandonar a aventura nuclear. Propõe banir as armas nucleares, e eu me recordo de que, nas Nações Unidas, afirmei que, enquanto existir uma arma nuclear, o homem estará à beira da extinção.


E admite abandonar o escudo de mísseis da Europa desde que cesse a proliferação nuclear.


É um presidente americano diferente. Dá alento de uma humanidade melhor. Enquanto isso, descobre-se que as chimpanzés da floresta Taí trocam sexo por alimento. Duas coisas boas.


Folha de S.Paulo, 10/4/2009.