O Brasil exibe aos olhos do mundo uma das faces mais perversas da sua ostensiva injustiça social: o trabalho infantil. Outro dia, na TV, chegamos ao constrangimento, na presença de visitas estrangeiras, quando o noticiário mostrou, de forma eloqüente, quantas crianças viviam do lixo, catando objetos, sujando as mãos, respirando o ar impuro desses locais. Quando o repórter perguntou a algumas delas se estavam satisfeitas, com os resultados, mesmo de forma tímida foram capazes de balbuciar que “preferiam estar na escola”.
Uma triste realidade. Temos cerca de 3 milhões de crianças e jovens até os 16 anos de idade que trabalham no Brasil, muitas vezes (ou quase sempre) em péssimas condições de salubridade. Quem não se lembra das imagens dos que vivem nas carvoarias do norte e do nordeste, arriscando-se a doenças terríveis? Lembramo-nos de um voto dado, no Prêmio Imprensa Embratel, exatamente para a matéria que denunciava essa barbaridade contra o nosso futuro.
Quem gosta de enterrar a cabeça na areia, fingindo que não tem nada com isso, deve entender que são dados oficiais, do IBGE, não comportando tergiversações. Há um Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), em que o Governo procura interessar os que se encontram nessa situação, oferecendo-lhes 40 reais por criança que deixa de trabalhar e volta aos estudos. Essa insignificância é oferecida às famílias, que, em geral, recebem o vergonhoso incentivo e continuam a manter os filhos nas condições anteriormente citadas.
A lei abre uma exceção para os aprendizes, que podem trabalhar a partir dos 14 anos de idade. E merece registro o esforço do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), vinculado à presidência da República, para que recursos públicos não financiem qualquer atividade econômica que empregue mão-de-obra infantil. O desrespeito a esse trabalho, que antes de tudo representa um desserviço ao país que desejamos construir se estabelece de forma escancarada, com base na garantia vigente de impunidade absoluta.
Empresas empregam menores de 18 anos em atividades perigosas, insalubres e às vezes noturnas, desconhecendo solenemente que melhor fariam, correspondendo às suas obrigações de responsabilidade social, se as enviassem a escolas possivelmente financiadas pelas próprias instituições, sem esperar que tudo venha a depender do Estado, precário no atendimento, como sempre.
Valeria a pena acompanhar os seminários e as publicações do Centro de Integração Empresa-Escola a respeito do tema, que se pode ligar, sem muito esforço, ao que é feito pelos estagiários em nosso país. Ali está um modelo a ser seguido ou imitado, mostrando que se pode realizar um trabalho adequado quando existe a prevalência de uma vontade política. Ou de uma decisão estratégica de enfrentar o problema. Uma visita às instalações do CIEE, por parte dos responsáveis oficiais, criaria excelente oportunidade para acreditar que se pode fazer, quando se quer mesmo resolver o problema.