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Presença de Tobias

 

A importância da presença de Tobias Barreto no pensamento brasileiro leva-nos a aferimentos dos diversos ângulos da nossa cultura por ele analisados. Foi ele, antes de tudo, um professor. Um professor escrevendo, um professor dando aulas, um professor discutindo e conversando. Como quem mais aprende é o bom professor, estudou Tobias o alemão, o que a ele possibilitou, juntamente com o francês e o inglês, um ingresso real nos grandes sistemas filosóficos de seu tempo.


 


Colocado entre os mais percucientes dos estudiosos de Tobias e sua linha de pensamento no Brasil, apresenta Paulo Mercadante, em seu livro "Tobias Barreto, o feiticeiro da tribo", um panorama completo do que foi a revolução pensamental promovida por Tobias, dentro das teses que passaram a ser usadas não só na Alemanha, mas também em centros de estudos filosóficos de outros países.


 


A frase era "É preciso voltar a Kant". Nessa linha dedicou-se Tobias à tarefa de estudar o brasileiro como tal, o brasileiro que representasse as forças dinâmicas da vida, não se deixando convencer por uma das correntes da época: a rigidez organizacional e pensamental do positivismo.


 


O que Tobias Barreto fez foi, sob muitos aspectos, uma antropologia política sobre uma sociedade em transição, e isto antes mesmo de haver uma antropologia política regularmente aceita. Interessado que estava em ver o País organizado, em influir na formação de um espírito nacional, discutiu permanentemente problemas de filosofia, porque neles via a base para a tarefa organizacional que se impunha. Antes e acima de tudo, criticou, polemizou, vergastou, destruiu tudo o que lhe parecia capaz de prejudicar a plena floração do avanço brasileiro.


 


Nascido em Sergipe, foi eleito deputado estadual em 1878, atuou na Câmara do Recife numa série de discursos de grande atração pública. Fez da defesa da mulher uma das bases de seus pronunciamentos, num tempo em que, no Brasil, mulheres não faziam cursos superiores. Em discurso na Câmara, Tobias relatou casos de mulheres formadas brilhantemente em Medicina na Europa, inclusive na Universidade de Zurich.


 


Outra, inglesa, Elisabeth Morgan, especializada em atrofia progressiva do músculo, obtivera as notas mais altas do curso. Citou exemplos de outras cujas carreiras haviam sido registradas em livro do professor Frederic Bishoff, "Do estudo e do exercício da Medicina pelas mulheres".


 


Num debate na Assembléia Estadual do Recife, usou de vigorosas assertivas em que defendeu a igual capacidade da mulher, em relação ao homem, para estudos elevados. Também em outras reuniões culturais, terçava com doutores em medicina pelo direito de candidata feminina prestar o pré-vestibular da especialidade.


 


Tobias Barreto sentiu-se mal durante um discurso em que, de repente, deixou de falar, colocou a fronte entre o polegar e o indicador e disse: "Tudo tem a sua lógica, até a morte". Teve então a perda total da voz e, 72 horas depois, em 26 de junho de 1888, às 22 horas e 16 minutos, Tobias Barreto descansou a cabeça no braço de um médico e morreu.


 


Tendo sido um brasileiro por excelência, opôs-se a um tipo de elite do País que o considerava como crítico permanente da situação social do mesmo. E foi o próprio Tobias quem deixou escritas estas palavras: "Eu não sou bastante forte para fazer à minha imagem e semelhança a sociedade em que vivo; mas esta, por sua vez, não é também tão forte para me levar em sua corrente. Daí uma eterna irredutibilidade entre nós".


 


A obra completa de Tobias Barreto seria trabalho de Paulo Mercadante e Antonio Paim e sairia em dez volumes entre 1989 e 1991, comemorando o centenário de sua morte. A coleção teve o patrocínio do governo do Sergipe e apresentou colaborações de Luiz Antonio Barreto, Jackson da Silva Lima, Evaristo de Moraes Filho, Vamireh Chacon e Everardo Lima.


 


"Tobias Barreto - o feiticeiro da tribo", de Paulo Mercadante, sai sob a égide da UniverCidade. Capa de Jorge Cassol e Fernanda Cassol. Textos de quarta capa de Cláudio Lembo, Olavo de Carvalho e Aurélio Buarque de Holanda.


 


Tribuna da Imprensa (Rio de Janeiro) 03/10/2006

Tribuna da Imprensa (Rio de Janeiro), 03/10/2006