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Eleições 2002 e a educação

 

Estamos perto das eleições. Quatro candidatos disputam a Presidência da República, num país às voltas com problemas de inquestionável importância como a segurança, o modelo econômico, a saúde, os transportes e, sobretudo, a educação. Não se pode exigir harmonia nas propostas até agora apresentadas. Cada candidato vem de uma escola, tem determinada experiência, e sonha com soluções que podem ou não ser exeqüíveis. Algumas idéias são coincidentes, o que é natural, pois sofremos influências importantes de outras nações, fato que se agravou com a ilusão de que a globalização nos levaria ao melhor dos mundos.


Assessores dos quatro candidatos debateram o período FHC na educação. Houve muitas críticas, como a redução dos investimentos na área da ordem de 23%. O investimento de 72 reais por habitante em 1994 caiu para 57 reais, em 1998. Isso é progresso? É uma noção perversa das prioridades do governo.


Foi elogiada a participação do MEC na elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (o que é discutível) e a criação do Fundef como um efetivo mecanismo de gestão. Comentou-se a hipótese de ampliar os investimentos em educação a partir das reformas fiscal e tributária, onde o governo empacou. Deseja-se aumentar os investimentos em educação dos atuais 5% para 7% do Orçamento.


Como numa corrida de revezamento, o novo presidente da República, a partir de janeiro de 2003, receberá o país em movimento. Tivemos algumas conquistas, nos oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso, na área da educação - seria injusto deixar de reconhecer isso. O candidato Lula elogiou alguns êxitos concretos. Serra fez o mesmo, mas deseja criar um inacreditável cursinho pré-vestibular para todos os alunos que concluam a escola pública. Isso vai melhorar a qualidade?


Caminhamos para a universalização do atendimento ao alunado de ensino fundamental, e o ensino médio cresceu em progressão geométrica.


O ensino superior também, principalmente na oferta de cursos, mas aí já se pode criticar a monumental falta de qualidade da maioria deles.


O ensino público foi maltratado, em várias instâncias, mas teve alguns ganhos, como a criação do Fundef e o sistema de avaliação em todos os níveis. Precisa ser aperfeiçoado, é claro, mas passou a existir. Paternalismos do tipo bolsa-escola são discutíveis, até porque o seu alcance é limitado, mas houve uma farta distribuição de livros didáticos para alunos carentes.


A idéia é louvável, faltando apenas democratizar a seleção feita por especialistas das universidades públicas federais. Com uma pergunta objetiva: seriam eles os melhores avaliadores do que deve ser oferecido às crianças do ensino fundamental? Ou isso deve ser feito por professores do próprio segmento que vai utilizar os livros? Além de outra questão: por que concentrar a escolha em meia dúzia de editoras?


Há problemas na distribuição da refeição escolar, não se deu quase atenção à educação infantil e à educação especial. E a maior de todas as falhas: a formação, o treinamento e a remuneração dos professores. Pouco se avançou na matéria, nos municípios, nos estados e na esfera federal. Há praticamente tudo por fazer nesse terreno.


Ficou o desejo de que a educação à distância, hoje uma tênue aplicação, seja modalidade efetivamente reconhecida, colaborando, inclusive, como aconteceu em tantos países desenvolvidos, para a qualificação inadiável dos mestres que se encarregarão de tirar nossas crianças dessa educação precária, vítimas inocentes de ações demagógicas evidentes. Um bom produto político, mas um mau resultado em termos práticos para o futuro de 60 milhões de crianças e jovens brasileiros, que estão hoje na escola, na esperança de melhorar a sua qualidade de vida.


Nos diversos pronunciamentos que têm sido feitos, os candidatos, como não poderia deixar de ser, concordam em inúmeros aspectos. Todos defendem a melhoria da qualidade do ensino, a universalização da educação básica e expansão da educação infantil, sem dúvida os pilares mais importantes para estruturação da proposta de governo do futuro presidente brasileiro.


No ensino fundamental, obrigatoriedade escolar determinada por lei, Lula pretende acabar com o analfabetismo (como?) e fomentar os programas de bolsa-escola, criando, inclusive, a bolsa-escola rural. Ciro Gomes defende um novo ensino médio e o aumento do número de anos que a criança passa na escola. José Serra tem falado sobre a elevação da escolaridade e qualificação dos trabalhadores, enquanto Garotinho quer reforçar a merenda escolar e fala em educação à distância.


Nesta modalidade de ensino, os dois primeiros colocados, segundo as pesquisas que têm vindo a público, divergem num aspecto importante: enquanto Ciro é a favor da municipalização do ensino fundamental, Lula quer reverter o processo de municipalização que, na opinião dele, é predatório no que se refere à escola pública.


Os ensinos médio e superior têm sido bastante ventilados pelos quatro candidatos. Quanto aos recursos humanos, problema antigo da educação brasileira, que continua pagando mal a seus professores e descuidando da capacitação e treinamento dos profissionais desta área, as promessas são muitas, restando saber se o vencedor irá cumpri-las: remuneração, valorização e capacitação permanente (Lula); política diferenciada para o professor que se aprimorar, criação do Sistema Federal de Treinamento e Retreinamento de Professores (Ciro); formação superior para os professores de ensino médio e fundamental (Serra); e até gratificação de R$ 500 para os professores que se destacarem (Garotinho).


Além disso, Serra deseja contratar jovens de ensino médio para estagiar nas empresas, repetindo o que já faz com sucesso o CIEE; Garotinho reclama do sucateamento das universidades oficiais; Ciro defende a prioridade ao pré-escolar; e Lula pede que não esqueçamos o desenvolvimento científico e tecnológico.


Em matéria de planos, uma festa. E na hora da execução? Haverá dinheiro e competência?


 


O GLOBO (Rio de Janeiro - RJ) em 19/08/2002

O GLOBO (Rio de Janeiro - RJ) em, 19/08/2002