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A mortalidade pedagógica

 

Aqui no Brasil, o país das desigualdades, há um enorme abismo entre ricos e pobres em matéria de educação. Diferença que a quantidade não resolve universalizar como se fosse uma operação mecânica, sem dar qualidade à educação, tem pouco efeito sobre a nossa competitividade.


O mercado de trabalho atual exige competência e a educação brasileira tem sido displicente no que tange ao ensino profissionalizante e no cuidado com recursos humanos em geral. Qualquer que seja a área, todo profissional precisa não só de habilitação, mas, também, de atualização permanente e treinamento em serviço.


No setor educacional tem-se feito muito pouco para melhorar o trabalho dos professores e especialistas, no País inteiro. Precisam ser mais bem formados, treinados, atualizados e remunerados de forma compatível com a dignidade humana. Mesmo com a criação do Fundef, que foi um avanço, estamos longe de uma solução à altura do problema. Até porque 20% das nossas prefeituras aplicaram equivocadamente os recursos do Fundo, isto é, as verbas só poderiam ser investidas em projetos e programas de desenvolvimento e reciclagem de professores, o que infelizmente não foi entendido por todos, para não proclamar outra coisa.


Aliás, vale a pena registrar que o programa e distribuição de livros (uma iniciativa louvável), teve incríveis tropeços, com o próprio reconhecimento do MEC de que 1/3 de 60 milhões de livros do programa "Literatura em Casa" jamais foi entregue aos alunos. Quem fiscaliza isso? Não podemos esquecer que tal programa é proveniente do dinheiro público, logo, do nosso dinheiro.


Deseja-se que 20% das crianças que se encontram nas escolas públicas alcancem o sonhado tempo integral. Mas não se afirma como. Ainda há, hoje, crianças sem aula que voltam para casa, ou só ficam na escola para comer merenda. A realidade é que faltam professores em quase todas as unidades da Federação, especialmente nas áreas de Matemática, Física, Química e História. Se não são abertos concursos, qual é a mágica que se prevê?


Cita-se a sugestão de cursinhos pré-vestibulares gratuitos para alunos carentes, idéia altamente discutível, pois o que se deseja é o aperfeiçoamento da educação básica. O cursinho é um desvio dessa preocupação e poderá servir como facilitário indesejável, um mero adestramento que poderá ajudar a entrada do aluno na universidade, mas daí a dar-lhe condições de fazer um bom curso, fica a dúvida.


Deseja-se que os recursos para educação subam de 66 para 93 bilhões de reais ao ano, criando a possibilidade de evitar os malefícios da reprovação e da evasão, esta batizada de "mortalidade infantil pedagógica".


Pensa-se num programa de valorização dos professores, na doação de livros para alunos de nível médio, na ampliação da nossa escolaridade de 6 para 12 anos, na unificação da gestão dos recursos humanos na educação, nos cuidados com a universidade pública (hoje, sucateada), no fortalecimento das escolas técnicas federais, na ampliação na assistência ao pré-escolar (mais 4 milhões de vagas), na maior atenção aos alunos deficientes, na maior participação dos empresários no processo ensino-aprendizagem e numa articulação mais adequada entre os Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia.


Algumas idéias parecem sonhos, a requerer interpretações freudianas. Outras - e muitas outras - não. Dependem apenas da vontade política dos que detiverem o poder, daqui a pouco. Que Deus os ilumine.


 


Jornal do Commercio (Rio de Janeiro - RJ) em 13/10/2002

Jornal do Commercio (Rio de Janeiro - RJ) em, 13/10/2002