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Escrevendo o futuro

 

Há ingênuos de carteirinha que jogam sobre os ombros do Estado todos os seus sonhos de realização. Isso é coisa para o Governo, aquilo só sai se o Governo der dinheiro, vamos aguardar que o Governo se manifeste - e a vida não é bem assim. Como se afirma em nossa Constituição, as iniciativas pública e particular devem se dar as mãos, para que cada uma cumpra a sua parte, no desejo comum de tirar o País da miséria e do atraso. Potencial temos de sobra.


Em São Paulo, realizou-se a escolha dos vencedores do concurso "Escrevendo o Futuro", promovido pela Fundação Itaú Social, de dois em dois anos. São provas de redação, com um tema escolhido pela direção do evento, desta feita "O lugar onde vivo". Mais de 1 milhão de alunos de 10 mil escolas públicas foram orientados e julgados por 25 mil professores de todas as regiões, nas preliminares, e depois por um júri qualificado, na finalíssima. São jovens da 4a à 5a séries, demonstrando sua competência para a escrita.


Pudemos observar algumas particularidades que chamaram a nossa atenção. Em primeiro lugar, a prevalência de estudantes do sexo feminino nas primeiras colocações. Depois, a escolha mais alentada de redações sobre "Opinião". Os jovens que escrevem (houve redações lindíssimas) expuseram os seus pontos de vista, sem desprezo de memórias ou poesias. Há uma vontade muito grande de participação, o que nos parece saudável, quando foram abertas as oficinas de criação de textos em todos os estados brasileiros.


Coerente com esse aspecto, o resultado final premiou a menina carioca Giselle Santos de Paula, que escreveu a redação intitulada "No morro não tem só bandido". Vencedora da etapa Rio, ela já havia sido intensamente aplaudida, na semi-final realizada na Academia Brasileira de Letras. Podemos assegurar que houve muita emoção quando o seu nome foi dado a conhecer. Uma estudante, na flor da adolescência, com a consciência formada a respeito do que se entende por cidadania.


É claro que todos sabemos que nas quase 800 favelas do Rio de Janeiro é relativamente pequeno o número de delinqüentes. A maioria é constituída de trabalhadores, gente pobre, que não tem outra alternativa de moradia. Por isso, condenar toda a favela é uma flagrante injustiça. Isso foi muito bem captado pela jovem vencedora, com um texto límpido, português correto, afirmando com muita convicção o que todos gostaríamos de proclamar. "As pessoas não têm culpa de serem pobres." No fundo, com a certeza de que a saga dos favelados será reduzida ao extremo quando houver emprego para todos, com salários compatíveis.


A direção do prêmio, que conta com a colaboração do MEC, da Undime, do Cenpec (Maria Alice Setúbal) e o apoio da ABL, deixou claro que não se conforma com a existência de 96% de matriculados nas escolas públicas brasileiras. Antônio Matias enfatizou que a grande preocupação da nossa sociedade deve se voltar agora para a construção de uma educação de qualidade, na valorização das políticas públicas.


Da promoção consta igualmente a realização de "Encontros de Formação", destinados a professores que participam de oficinas e eventos de reflexão sobre práticas pedagógicas. Os mestres são preparados para orientar seus discípulos na elaboração criativa de textos de memórias, poesias e opinião, para o retrato adequado do cotidiano, na identificação da riqueza cultural existente nas diversas regiões brasileiras.


 


Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 31/12/2004

Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), 31/12/2004