Em 5 de novembro, com sessão aberta ao som do hino de Lamartine Babo, na voz do seresteiro Gilberto Alves, a ABL deixou, por um dia, o fardão no cabide e vestiu o Manto Sagrado.
Pela primeira vez em sua história centenária, a ABL abordou o futebol como fenômeno cultural, econômico e por que não, literário.
O ciclo de conferências, que ao longo do mês vem contando a saga dos clubes do Flamengo, Botafogo, Fluminense e Vasco, foi inaugurado com pompas pelo presidente da casa, Merval Pereira, que destacou como o futebol se tornou um engenho bem brasileiro que permite que o porteiro goze o dono da cobertura. Ou que faça um recruta rir com o general.
Nessa histórica terça-feira, Ruy Castro palestrou por 50 minutos sobre a importância social do Clube de Regatas do Flamengo, em aula que está no YouTube, no sítio da Academia. Em contagem regressiva para seus 130 anos de glórias, a serem celebrados em 2025, o Mais Querido do Brasil também viu abertas as comemorações para a efeméride.
Ruy aproveitou e concentrou-se nos primeiros 30 anos do clube. Nas charmosas poltronas do teatro da ABL, urros de “Mengo”, camisas pretas e vermelhas e gritos de gol. Só faltou a “ola”, que um barbado puxou, mas, ufa, foi ignorado solenemente.
No fundo, nada daquilo era de estranhar. Afinal, se existe um mascote, ícone ou figura metafórica que mexe com a intelectualidade tupiniquim desde os anos 1500, ah, pode acreditar – é o nosso urubu. E o que é o urubu se não sinônimo de Flamengo, o bicho-símbolo da torcida rubro-negra?
De Pixinguinha a Drummond, a ave foi homenageada em choro e verso por todos os grandes gênios – faz figuração em “O Ateneu”, “Os sertões”, “Macunaíma”, “Vidas secas” e “Grande sertão: veredas”; sobrevoa o teatro de Nelson Rodrigues e está nos livros campeões de venda de Jorge Amado. Humildão, ainda empresta seu nome e estampa a um celebrado disco do maestro Tom Jobim.
De modo a provar que o urubu é mais amado pelos brasileiros do que o dinossauro por cineastas americanos, a torcida flamenga retribui à gentileza da Academia com 25 das melhores passagens urubófilas, de nossa literatura e cancioneiro.
Curadoria, em boa parte, encetada por mestre Antonio Geraldo da Cunha no seu imprescindível dicionário de tupi (quinze reais no livreiro da praça Cazuza, basta urubuzar o vendedor.)
Ave, uruba!
Matéria na íntegra: https://estanterubronegra.com.br/urubuzada-na-academia-de-letras/
25/11/2024