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Elocução precoce

 

John Kennedy (1917-1963), lendário presidente dos EUA, era famoso por, nos intervalos dos arranca-rabos com os russos na Guerra Fria, viver de olho nas mulheres. Muitas o achavam um charme e eram loucas para conferir suas credenciais. Hoje se sabe que as avaliações não eram muito favoráveis. A estrela Angie Dickinson, talvez a mulher mais bonita do cinema nos primeiros anos 1960, descreveu sua experiência com Kennedy: "Os 15 segundos mais excitantes da minha vida."

O homem pode ir a Marte, inventar a inteligência artificial ou levar o "Finnegan’s Wake" para ler nas férias, mas não se livra de um problema de bilhões: a ejaculação precoce. É o que dizem os especialistas na genitália masculina —mais do que a timidez, o pinto pequeno ou mesmo a impotência, é, de longe, o mais frequente nos consultórios.

Em política, temos um equivalente: a elocução precoce. Consiste em, diante de um assunto grave, falar primeiro e pensar depois. Ou nem pensar. Ou não se controlar e falar aquilo que realmente pensa sem considerar o desgaste político. O presidente Lula é um caso de elocução precoce, e não é de hoje. Num dos primeiros mandatos, protestou que os ecologistas estavam combatendo uma de suas obras faraônicas porque ela iria interferir na reprodução de certa perereca. Exclamou: "Imagine! Uma perereca!". Tiveram de dizer-lhe que, sem a perereca, todo o equilíbrio daquela região iria para o beleléu.

Agora Lula acha normais as nojentas trapaças de Nicolás Maduro nas pseudo-eleições da Venezuela. Maduro se inspirou em Bolsonaro, que, na eleição em 2022, declarou guerra ao voto eletrônico, entupiu o povo de dinheiro no fim da campanha e tentou impedir eleitores de chegar à urna. Lula o derrotou, mas por uma fração. No desespero, Bolsonaro tentou o golpe. Maduro foi além: deu o pré-golpe.

Parece haver cura para a ejaculação precoce. Não para a elocução idem

O Globo, 01/08/2024