Alguns otimistas esperavam que o quarto Ministério da Saúde do governo Bolsonaro fosse oferecer resultado melhor, já que seria preenchido por um médico, o cardiologista Marcelo Queiroga. Esqueciam o que o ocupante anterior do cargo, o general Eduardo Pazuello, havia afirmado publicamente: 'Um manda, e o outro obedece'. O presidente é quem manda. Sentado ao lado, o alvo da declaração deu um amplo sorriso de apoio.
Se precisasse de confirmação, ela viria coma CPIda Covid, que apontou em seu relatório final o presidente Bolsonaro como um dos principais responsáveis, senão o principal, pela maior tragédia sanitária da história do país, que já havia causado 600 mil mortes. Pesaram então sobre ele a acusação de nada menos que nove crimes, entre os quais charlatanismo e prevaricação.
O que há de mais impactante na recente pesquisa revelada pela jornalista Evelin Azevedo, promovida pela Associação Médica Brasileira (AMB) em parceria com a Associação Paulista de Medicina (APM), é que a maioria dos participantes (51%), a própria classe, reprova a condução da pandemia pela atual gestão. Trinta e quatro por cento classificaram a atuação como péssima; 16, 6%, ruim; e 21%, como regular. Apenas 14, 6% dos médicos têm a pasta como referência para indicar um tratamento. A maior parte (65, 1%) se baseia na orientação das sociedades de especialidades e associações médicas.
A nova onda de Covid-19 provocada pela Ômicron gerou um forte impacto emocional nos médicos, que se disseram apreensivos (51, 6%), esgotados (51, 1%) e ansiosos (42, 7%). Sem falar nos colegas de trabalho que se sentem estressados (62, 4%), sobrecarregados (64, 2%) ou exaustos (56, 2%).
Quem melhor resume o atual estado físico e de espírito seral é o médico José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM. Além do aumento de casos e da diminuição de profissionais em atividade devido à contaminação, ele aponta como causa maior do cansaço físico e emocional a 'sensação de que estamos enxugando gelo e de que a pandemia não vai acabar logo'.
Essa 'sensação' é confirmada pelos números, que continuam superando as 700 mortes diárias, vítimas do que Bolsonaro considera uma 'gripezinha'.
A mãe de Moise explicando que veio com a família fugindo da violência, em busca de paz, me remete a Paris, 1960, quando, bolsista, fazia um curso de extensão em jornalismo. Éramos uns 20 alunos - a maioria africanos e dois brasileiros, Roberto Muggiatti e eu. Nosso ídolo era Patrice Lumumba, herói da Independência do Congo, cuja história de lutas e conquistas elevou-o ao lugar mais alto do panteão de glórias do continente africano.
O fascínio de nossos colegas estrangeiros, porém, baseava-se numa ilusão: que o Brasil como eles sonhavam era feito de 'Garrinchá e Pelê', seus ídolos. E de mulheres oferecidas. 'Etles femmes, Vanturrá!', diziam para mim. Achavam, com certeza, que em Copacabana belas cariocas de biquíni não lhes dariam sossego.
Confesso que, quando vejo dona Ivone inconsolável com a morte brutal do filho, me comovo lembrando que essa ainda é a ilusão de muitas donas Ivones em relação a esse Brasil, preconceituoso e racista.
Anova onda de Covid-19 provocada pela Ômicron gerou um forte impacto emocional nos médicos.