Não me lembro de tanta emoção coletiva produzida ao mesmo tempo pelo esporte. As lágrimas de alegria, e também de frustração, derramadas nestas últimas duas semanas, e a serem derramadas hoje e amanhã no encerramento, dariam para encher... já ia dizer, uma piscina, mas aí vi que era exagero. De qualquer maneira, foram muitas. Plagiando rasteiramente Fernando Pessoa, diria que a Olimpíada fez o nosso mar ficar um pouco mais salgado. Eu tive que conter as minhas, principalmente durante o hino nacional depois de uma vitória. Acabei sentindo inveja do meu querido “chorão” Nelson Motta, cuja geração está ensinando a minha, reprimida, da voz embargada, do “quase chorei”, a ter vergonha de não chorar.
Até sob esse aspecto, pelo que dizem os especialistas, foi a melhor Olimpíada já realizada. Faço minhas as palavras recolhidas ao acaso da médica paulista Andrea Abbud, que há um ano se cadastrou e quase desistiu: “Confesso que, antes de vir ao Rio, estava desanimada. Todo mundo dizia que não ia dar certo, minha família pedia para eu não vir. Mas, quando cheguei, meu sentimento mudou. O clima da cidade está maravilhoso, com música para todos os lados e pessoas felizes. Eu queria que o dia durasse 50 horas e eu pudesse estar em dez lugares ao mesmo tempo: na praia, nos jogos e nas festas.”
Quer dizer que o inferno ou purgatório virou paraíso de uma hora para outra? Claro que não, muitos problemas continuam aí, mas as pessoas que criticam o carioca por sua vocação festeira — por que não gasta essa energia para cobrar melhores hospitais e escolas, por exemplo? — precisam entender que a cidade estaria pior se, além de nossas mazelas, ainda nos faltasse essa alegria de viver, a joie de vivre que meus colegas franceses tanto admiram em nós e que Vinicius de Morais resumiu em lindos versos musicais: “É melhor ser alegre que ser triste/A alegria é a melhor coisa que existe”.
Houve momentos tocantes de superação (e certamente haverá mais na Paralimpíada), como a história de vida de Rafaela Silva. E houve também redenção. Quem viveu os terríveis tempos da ditadura militar não imaginava assistir àquelas continências feitas por atletas não como imposição, mas como uma forma voluntária de agradecer o apoio recebido das Forças Armadas, que fornecem bolsas a um terço dos atletas em competição.
Enfim, até o que teria sido uma grande vergonha para o Brasil foi esclarecido com competência por nossa polícia. E assim podemos responder à pergunta insidiosa da capa da “The New Yorker”: “Por que os brasileiros estão tão obcecados com a história de Ryan Lochte?”
Porque ela parecia mentirosa, e era. O Comitê Olímpico dos EUA e o próprio Lochte já pediram desculpas. Falta agora a revista.