Estranha é a atitude do líder petista rejeitando o diálogo, ele que sempre ganhou usando a palavra, desde as históricas greves do ABC Paulista
A exemplo de muitos leitores, estou cansado de ouvir falar de crise — das causas, dos culpados, dos sintomas — e pouco das soluções. Temo que do fastio se passe à anestesia, à medida que o mal ameaça tornar-se crônico e incurável. Por isso, recebi com otimismo (talvez exagerado) sinais de que o diagnóstico pode estar dando lugar ao prognóstico, ou seja, às providências para o tratamento e a cura. Paradoxalmente, os acenos à paz vêm de lados opostos: um, do PMDB, através do documento “Uma ponte para o futuro”; e outro, de um dos mais importantes representantes do PSDB, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, por meio de uma entrevista ao programa “Conexão Roberto d’Ávila”, da GloboNews. Em ambos, a saída seria pelo mesmo caminho, apontado pelas mesmas palavras ou por sinônimos: busca da conciliação, do entendimento, do consenso, do pacto. É como se dissessem: já que o desacordo nada resolveu até agora, por que não experimentar o acordo e, em vez da troca de ofensas, a troca de ideias?.
“O país clama por pacificação”, afirma a principal sigla de apoio ao governo, depois do PT, no seu pacote de propostas e críticas, enquanto FH, por sua vez, diz: “Não se sai de uma encalacrada do tamanho da nossa se um fica acusando o outro”. Para ele, é indispensável uma “autocrítica coletiva”, além de posições novas. “O PT foi engolido por uma utopia regressiva”, que se caracterizaria pela simpatia por modelos que estariam falidos, como o da Venezuela.
O líder tucano se diz disposto a se sentar com os adversários para discutir alternativas, tendo se mostrado “mordido” por Lula não ter respondido a seus convites de encontro, “o que não justifica que agora não se tente ver como sair de onde estamos”. Ele acredita que está na hora de conversar, “desde que tudo seja público”, embora não tenha esperança de que isso aconteça com a presidente: “Ela não tem a vocação para a conversa, não só comigo, mas com o país, com o Congresso”.
Estranha é a atitude do líder petista rejeitando o diálogo, ele que sempre ganhou usando a palavra, desde as históricas greves do ABC Paulista, quando, em plena ditadura, aquele torneiro mecânico ensinou a classe operária a negociar com os patrões. Os dois rivais políticos têm uma trajetória de luta do mesmo lado contra o regime militar e, no fundo, se admiram, com um pouco de inveja mútua. No meio de tanta baixaria e coisa ruim na política, uma pergunta sem malícia, até ingênua, para tentar decifrar o mistério: por que o silêncio de Lula aos convites de FH?