Quando Franco Zefirelli esteve no Rio, fiquei encarregado de lhe dar assistência. Conversamos bastante, conversas que poderíamos jogar fora. Mas houve um dia em que ele me impressionou.
Falávamos da ópera "Tosca", cujo original, de Sardou, contém um amplo quadro das brigas da época, quando Napoleão, invadindo a Itália, libertava-a do absolutismo e da tirania. Notei que Zefirelli apreciava o Puccini de "Turandot" e "La Bohême", mas não se entusiasmava com a ópera em que um preso político é torturado para delatar um amigo subversivo.
Zefirelli ficou sério e resumiu seu pensamento: "A política é o Diabo!" Falou assim mesmo, o Diabo em maiúscula. Eu o entendi. Se o Diabo deixasse de existir, ou se nunca existiu realmente, tanto faz. Existe a política e todas as funções do Diabo podem ser cumpridas pela política.
Na luta pelo poder, no fogo cruzado e nem sempre leal das posições e contestações, coloca-se a política acima de qualquer outro valor, daí ser justo, em nome da causa, matar, difamar, roubar o adversário. Que nem é um adversário, mas um amigo que, em determinada questão, ousa pensar com a própria cabeça e discorda da maioria.
Sei que a luta de nosso tempo custou milhares de vítimas, mortas pela repressão. Mas sei também que tais vítimas foram mortas, física ou moralmente, pelos próprios companheiros da verdade ocasional. O chão político está coberto de cadáveres mutilados na luta pelo poder.
Lembro Agildo Barata, acusado de roubar o caixa do partido por não aceitar algumas teses de 1956. Foi moralmente assassinado pelos companheiros.
Acima dos partidos, acima das causas, é fácil ver o Diabo em pessoa, esfregando o rabo de raiva. Ele cria novas causas para que os homens continuem se devorando. Dilma e Cunha são exemplos.