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E agosto vem aí

 

E agosto vem aí

Não basta afirmar ‘Eu não caio’ ou que vai resistir com ‘unhas e dentes’ e que é ‘moleza’ sair dessa, quando a acusação é de falta de condições para governar

O que ainda se pergunta é se, com sua impetuosa entrevista à “Folha”, a presidente Dilma livrou-se do inferno astral que a perseguia ou se ao menos deixou o “volume morto” a que tinha sido relegada por Lula. Em outras palavras, a estratégia iniciada ali melhorou ou piorou sua situação? Por um lado, pode ter-lhe feito bem sair do imobilismo, tentar fugir ao cerco que a considerava à beira do abismo e escapar do noticiário que não fazia mais cerimônia em acolher o fantasma do impeachment como uma possibilidade imediata. Com a popularidade em vertiginosa queda, temerosa de que a Operação Lava-Jato subisse a rampa depois das revelações do dono da UTC, derrotada num Congresso comandado por dois aliados infiéis, às voltas para se defender junto ao TCU e ao TSE, ela passou ao ataque, tentando desqualificar como golpismo as enrascadas em que se meteu. A discussão para saber quem é de fato golpista, se a oposição ou o governo, retoma o nível de polarização da última campanha eleitoral.

Valeu a pena ter reagido dessa maneira, acirrando, em vez de serenar, os ânimos da oposição, da qual acabou fazendo o jogo? A questão é que, além das dificuldades jurídicas e institucionais impostas à presidente, o seu governo enfrenta problemas que, como inflação e desemprego, não se resolvem com bravatas verbais. Nos supermercados, não se fala mal das “pedaladas fiscais”, mas do custo de vida. Não basta afirmar “Eu não caio” ou que vai resistir com “unhas e dentes” e que é “moleza” sair dessa, quando a acusação é de falta de condições para governar. Talvez tivesse sido mais proveitoso politicamente contribuir com bom senso para impedir que baixasse sobre o país esse clima de beligerância que lembra outras indesejáveis épocas. Lula já dramatizou: “Não vou me matar, não vou sair do país, eu vou para a rua. Se quiserem me derrubar, vão ter que me derrubar na rua".

Já que ele puxou o assunto, sei que é superstição, mas não custa lembrar: agosto está próximo e é conhecido como “mês do desgosto” pela crença popular, que acredita ser esse período do ano símbolo de mau agouro na política, a qual oferece alguns funestos exemplos. Foi no dia 24 de agosto de 1954 que Getúlio Vargas suicidou-se. Foi também num dia 25 de agosto, mas de 1961, que o então presidente Jânio Quadros renunciou à presidência depois de apenas sete meses no cargo. No dia 22 de agosto de 1976, outro presidente, Juscelino Kubitschek, perdeu a vida em um acidente de carro. De acordo com a numerologia, o significado do mês 8 pode ser considerado desfavorável pela maioria das pessoas, já que traz à tona tudo aquilo que foi semeado nos últimos meses — tudo de ruim, evidentemente. Xô, crise!

O Globo, 11/07/2015