Requer-se do novo governo Dilma Rousseff muito mais do que a melhoria de um bom desempenho ou a correção das deficiências do primeiro mandato. Impõe-se sobre os êxitos da produtividade a remoção das injustiças sociais.
O país se pergunta sobre os motivos do anticlímax do começo do segundo governo Dilma. Estaria em causa a perda do carisma original petista, esperança de alternativa ao escândalo do desequilíbrio da riqueza herdada do "status quo".
A mensagem de maior alcance deste novo governo Dilma Rousseff, e de como ele responde às mudanças, foi dada logo no começo deste ano pelo ministro Patrus Ananias (Desenvolvimento Agrário) na denúncia da permanência do latifúndio brasileiro.
Em seu ato de posse, o ministro disse que "ignorar ou negar a permanência da desigualdade e da injustiça é uma forma de perpetuá-las. Por isso, não basta derrubar as cercas do latifúndio".
Sua posição marca o contraste com o pensamento de Kátia Abreu, ministra da Agricultura, que nega o abuso rural e vê como obsoleta a ideia de uma reforma agrária.
O contraponto confronta o próprio recado histórico do petismo, e deveu-se a Patrus Ananias a reposição da sigla à mais legítima trilha ideológica a que veio o partido.
É o "status quo" que remanesce na fala da ministra Kátia Abreu sobre os "projetos de colonização maravilhosos", diante dos quais a reforma agrária é "um discurso velho". Para a ministra, o que importa, sim, é que nos tornemos a maior nação agropecuária do planeta, no empenho de seus responsáveis.
O que a ministra propôs foi uma "virada de página", mas ao avesso, no cancelamento das diferenças ou na remoção da alavanca que buscou um outro Brasil nestes últimos 12 anos. Submergiríamos de vez na conclusão das transformações, em que toda estada no poder traz a fieira interminável da corrupção e da clientela política.
A presença de Patrus no Ministério do Desenvolvimento Agrário é o exemplo mais nítido do que restou do partido, entre sindicatos de operários e a Igreja Católica, a arrancada definitiva da marginalidade daquele velho país, ao qual Kátia Abreu reitera seu eterno amor.
O recado de Patrus Ananias nos lembra o avanço inédito da Constituição Federal de 1988, a salientar a diferença do "direito de propriedade" frente às demais prerrogativas elementares do cidadão. Direito que nasce acoplado à sua função social, diferentemente do desempenho produtivo, ao qual se limita a ministra da Agricultura.
O agronegócio, objeto de culto da ministra, não pode ser o mesmo da fala dos latifundiários do Império no protesto contra a abolição da escravatura, que os impediu de "produzir mais e exportar mais".