Vocês vão me agradecer por toda a vida a ideia de convidar o Roberto Marinho para ser membro da Academia Brasileira de Letras.
Com essa frase, que se tornou histórica, Austregésilo de Athayde justificava, em 2003, a entrada do poderoso diretor-redator-chefe de O Globo na Casa de Machado de Assis. Foi muito bem acolhido e lá ficou durante 10 anos, frequentando as sessões e solenidades, sempre em companhia da sua simpática esposa , Lily de Carvalho Marinho.
Consolidou-se nossa amizade, que foi enriquecida pelas muitas idas a Angra dos Reis, para fins de semana no “paraíso de Mombaça”. Tema predominante das conversas: as conquistas do jornal, suas novas máquinas, a circulação ascendente, o nascimento do Extra, a nova sede em Caxias, a vontade de entrar em São Paulo. Roberto Marinho era fundamentalmente um homem da imprensa escrita, embora aos 61 anos de idade tenha tido a ideia de criar a TV Globo. Era um complemento indispensável ao império, que já contava com a força da liderança da Rádio Globo.
Dizia-se que, antes mesmo de entrar para a Academia Brasileira de Letras, Roberto Marinho já se considerava imortal. Era muito conhecida a história contada por seus amigos. Um dia, alguém se ofereceu para dar a ele uma tartaruga de presente. Recusou-se terminantemente: “Depois ela morre – e eu vou ficar com muita saudade.” Sabe-se que a tartaruga costuma ir aos 250 anos de vida...
Quando fez 90 anos, recebeu da mulher, Lily Marinho, uma belíssima homenagem, na Casa do Cosme Velho. Presentes cerca de 500 amigos. Tive a honra de ser escolhido pela dona da casa para saudar o homenageado. Ao terminar, desejando que ele vivesse até os 120 anos de idade, o filho mais velho (Roberto) cochichou no meu ouvido: “ Por que essa limitação?”
Conheci Roberto Marinho também pelas histórias contadas pelos seus filhos, Roberto Irineu, João Roberto e José Roberto. Uma delas é a de que não tinha nenhum apreço por palavrões, ao contrário do que era comum ocorrer nas redações barulhentas da época. Falava baixo e, quando criticava alguém, quanto mais baixo falasse maior era a bronca. Não era homem de atitudes espalhafatosas. Foi poderoso, na cena brasileira, sem ser exibido.
Agora, a cineasta Rozane Braga lançou um bonito documentário sobre Roberto Marinho: “O senhor do seu tempo”. Contou muitos fatos da sua vida, inclusive as vitórias no hipismo e as suas relações, nem sempre amistosas, com representantes do poder estabelecido: defendeu o golpe militar, mas condenou os excessos. Foi amigo e inimigo de Carlos Lacerda, o que por si só é uma epopeia. Nunca perdeu, no entanto, a sua fleugma britânica, embora fosse carioca da gema e tenha lutado bravamente para que a sede das suas organizações jamais deixasse o seu amado Rio de Janeiro. No fundo, no fundo, confessava que ficaria feliz se a Capital voltasse a ser no Rio: “Teríamos evitado muitos problemas.”
Jornal do Commercio ( RJ), 12/8/2011