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Muitas razões para perder o sono

 

Em boa hora, por iniciativa do JB, discutimos na Firjan as possibilidades de emprego em duas áreas de ponta: telecomunicações e telefonia celular. No quadro da realidade brasileira, antes é preciso examinar o conjunto de problemas que afetam a nossa juventude. Na faixa etária dos 16 aos 20 anos, por exemplo, o Ipea demonstrou que o desemprego triplicou, no período de 1987 a 2007. A ilusão do emprego a qualquer custo levou muitos jovens a abandonar precocemente a escola. Na faixa etária de 18 a 24 anos, somente 13% chegaram às universidades. Isso é muito pouco.


Com o mundo do trabalho cada vez mais sofisticado, exigindo profissionais qualificados, como comprovam as pesquisas do CIEE, não se justificam esses números, que colocam o país como o de maior número de crianças fora da escola na América Latina e no Caribe (dados da Unesco). O maior preço dessa distorção recai sobre os jovens pobres e negros, aos quais não são oferecidas oportunidades mínimas.


Temos 50 milhões de jovens, e desse total cerca de 30% são considerados pobres, oriundos de famílias de renda per capita de até meio salário mínimo. Na área rural, o quadro é ainda mais aterrador. Apesar da existência de programas como o Bolsa Família, hoje envolvendo 12 milhões de pessoas, há uma crônica falta de coordenação, no trato dessa relevante questão. O exemplo mais simples é o que ocorre nos vários níveis de governo (federal, estaduais e municipais). A falta de sinergia entre eles é uma verdadeira calamidade, como comprova a nossa experiência de muitos anos de vida pública e os cargos exercidos.


O cenário leva os educadores a perder o sono: temos mais de 5 milhões de jovens desempregados e 50% dos que obtêm trabalho não conseguem ter a carteira assinada (entre 18 e 24 anos). É um razão de desestímulo que pode explicar muita coisa, como o fato de que, em algumas regiões, a escola não garante a ascensão social desejada. O Brasil ocupa o 12º lugar na classificação mundial dos países que têm mais crianças fora da escola (a última estatística aponta para um número superior a 1 milhão).


A questão é complexa e envolve diversas variáveis. Quando os jovens alcançam a escola, como se fossem seres privilegiados da sociedade, nem todos completam os respectivos cursos. Cerca de 42% abandonam porque obtiveram alguma espécie de emprego (ou subemprego), no caso dos homens, e 21% das moças deixam os estudos em virtude de gravidez precoce. Pelo vulto do país, são números impressionantes, que não ensejaram ainda a quem de direito o equacionamento devido.


Em consequência, as novas gerações não se aproveitam totalmente da redução da pobreza, entre nós, pois sofrem os efeitos indesejáveis das desigualdades seculares que marcam a vida brasileira. Isso tem sido muito lembrado, hoje em dia, quando se celebra o centenário da morte do grande abolicionista e diplomata Joaquim Nabuco. Embora monarquista, defendia a existência de uma nação igualitária. Se ele renascesse, certamente faria um daqueles seus notáveis discursos, demonstrando que a obra da Abolição da Escravatura não foi ainda completada. O caminho para a solução passa necessariamente por uma educação de qualidade, o que não ocorre na maioria das 200 mil escolas brasileiras.


Jornal do Brasil, 11/6/2010