A notável tradição brasileira na arte da gravura, e muito especialmente da xilogravura, tem em Ciro Fernandes um de seus maiores nomes. Entre suas origens populares e eruditas, oriundas das capas dos folhetos de cordel do Nordeste ou do expressionismo europeu, a arte da xilogravura entre nós se espraia através do tempo nas admiráveis obras de um Oswaldo Goeldi, um Lívio Abramo, um Newton Cavalcanti, um Rubem Grilo, um Gilvan Samico, assim como no grande artista aqui exposto.
Paraibano de Uiraúna, no alto sertão de seu estado, nascido no calor da Guerra, quis o destino que Ciro Fernandes viesse ao mundo naquela unidade da federação que é o epicentro da cantoria e do cordel no Nordeste, e, portanto, inexoravelmente, também da gravura sobre madeira. Suas origens autenticamente populares jamais o impediram de se alçar a composições extremamente requintadas, onde é difícil saber o que mais admirar, a composição sempre exata, o uso magistral da cor, quando é o caso, a espantosa variedade nos cortes, dos mais sutis, verdadeiramente milimétricos, até os largos e violentos, todos adaptados virtuosisticamente ao que o seu autor busca expressar.
Também poeta e ilustrador de livros, além de haver ilustrado, com xilogravuras, o Jornal do Brasildos velhos tempos, Ciro Fernandes sempre se manteve próximo das letras, desde as numerosas capas de folhetos que criou até os livros de grandes clássicos assim como de autores contemporâneos brasileiros que enriqueceu. Mas a estesia maior do público virá sempre da maravilha plástica de suas gravuras, seja de uma mágica colheita de cajus, da épica e hierática cabroeira de Lampião imobilizada no tempo, de um Adão e sua Eva tentados pela serpente, entre tantos e tantos momentos de beleza que a presente exposição oferece ao público carioca.