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Uma eleição sem partidos

 

Meu avô contava a história de um político que entrou num cemitério e parou diante de um túmulo, onde estavam escritas as velhas palavras: “Aqui repousa em paz fulano de tal”. Ele escreveu embaixo: “Porque nunca concorreu a uma eleição”. Nem depois de morto tem paz.

A bolorenta caminhada institucional brasileira faz com que esse ato fundamental da cidadania seja um martírio para os candidatos e, também, para os eleitores, submetidos a todas as armadilhas e cantochãos. O horário eleitoral, uma inovação, passou para muitos a ser uma chateação. Foi uma conquista do avanço tecnológico, com a urna eletrônica, e transformou pessoas em números: “Eu sou o 15.158, curso superior, barbeiro de profissão e alfaiate de coração. Vote em mim”. Com essa numerologia toda, não é difícil encontrar eleitor que ache que não vota em candidato que tenha 7, outros que guardam a superstição do 13 e alguns com antipatias por outros números. Temos a segunda democracia do mundo ocidental pelo número de votantes, e paradoxalmente a primeira convocação não é de conscientização nem chamamento do dever cívico, mas ensinar a votar e sugerir aquilo que nas escolas é pecado: colar.

O grande ausente da democracia brasileira continua sendo o partido político. Nesta eleição nem falar. Todos, quando não silenciavam, escondiam a sigla em letras quase ilegíveis. E não existe democracia forte sem partido político forte.

O nosso sistema eleitoral do voto proporcional uninominal só existe no Brasil. É desintegrador dos partidos e não estimula lealdades nem a idéias nem a programas.

O Brasil não tem como aprofundar o seu processo democrático nem aperfeiçoar as instituições com esse sistema. No fundo vivemos num país de democracia formal. Os líderes políticos, matriculados em siglas que não dizem nada, são as verdadeiras instituições. É um processo de pessoas, legitimado pela conduta individual de alguns brasileiros que têm a paixão da vida pública.

Nada mais urgente do que a reforma política. Necessitamos ter a coragem de implantar o voto distrital, estabelecer critérios para criação e funcionamento de partidos políticos. Com o voto distrital sobrevivem somente os verdadeiros partidos, extinguem-se por inanição os ilegítimos, cria-se vida partidária, formam-se maiorias estáveis, surge a fidelidade como única maneira de sobrevivência de qualquer carreira política, diminuem os gastos nas eleições.

Não há democracia moderna sem esse arcabouço. O voto proporcional é um fóssil do século 19, defendido pelos positivistas, mantido pela necessidade de abrir espaços para um tempo da utopia ideológica, e nem a esta serviu.

A democracia moderna tem muito mais a ver com a governabilidade do que com a retórica. O sistema eleitoral brasileiro é caótico, não funciona e coloca sempre nas instituições à beira de um desastre. A grande reforma histórica e definitiva para o país é a reforma política. Deve ser urgente e obra de um grande pacto nacional.

O ponto de partida é o voto distrital, que pode ser puro ou misto. Qualquer modelo é melhor que este e deve vir logo.

Diários do Amapá, 26/10/2012