Há três dias a Fundação Joaquim Nabuco lançou, no Palácio do Planalto, um livro que se destina a ser raro e fazer escola: dois volumes de entrevistas com os chefes de comunicação da Presidência da República, desde JK a Lula. É, no fundo, a primeira publicação sobre os segredos do poder presidencial, como se tomam decisões, e os bastidores de como elas chegam ao público. Foi uma inovadora iniciativa do ex-porta-voz André Singer com fotos de Orlando Brito. As entrevistas são excelentes e revelam a tensão permanente entre o governo e os comunicadores, jornalistas em síntese.
O Brasil não tem o hábito de fazer História com fontes primárias. Em geral, são degraus repetindo uns aos outros. Autobiografias de presidentes, nem pensar. Campos Sales escreveu um livro medíocre, que é mais o relato da campanha republicana paulista. O diário de Getulio é uma sequência de fofocas diárias sem nenhuma visão prospectiva, sem as fontes nem as razões de decisão. O de Juscelino, escrito a quatro mãos, tem altos e baixos. O primeiro volume, sobre sua infância e vida, é primoroso. Os demais são relatos bem escritos, porém mais relativos a Brasília que a ele mesmo. Epitácio Pessoa guardou seu ressentimento na geladeira, como dizia Tancredo – e colocou-o para fora nos livros de defesa irada do seu governo.
Nos Estados Unidos a literatura de como se tomam as decisões na Casa Branca (título de um livro de Theodore Sorensen) é farta. Há uns 25 anos, Michael Nielson, professor da Vanderbilt University e jornalista do Washington Post, publicou um trabalho de profundidade sobre o assunto: A Presidência e o sistema político. Valeu-se de muitas informações de porta-vozes. Chegou a algumas conclusões: os presidentes que perseguiram e desejaram o poder saíam mais fortes do que entravam (veja-se Lula, cá, Roosevelt e Wilson, lá).
A inflação dá a base de popularidade dos presidentes. Quanto mais baixa, mais popular. Arthur Schlesinger Jr., a exemplo do que fizera seu pai em 1948 e 1962, classificou, em 1996, depois de ouvidos 719 historiadores, acadêmicos e cientistas políticos, o desempenho dos presidentes norte-americanos – bons, regulares e ruins. Os bons quase sempre eram displicentes quanto à burocracia, se engajavam na liderança e exerciam o poder com energia e desenvoltura. “Idealismo” e “flexibilidade”, avaliados previamente pelo sociólogo Gary Maranell, já não eram importantes para o julgamento final do governo. No fundo, o que pesa mesmo é o que ficou para a História. O circunstancial não conta.
Quem sabe, depois deste livro, cada porta-voz ficará tentado a escrever suas memórias da Presidência. Será bom para o Brasil e sua História, baseada em fonte direta.
Folha de São Paulo,17/9/2010