Na rua, um frio de seis graus negativos. A neve, caindo sem parar, ensejava um belo espetáculo para os nossos olhos acostumados à luz dos trópicos. Em companhia dos escritores pernambucanos Antônio Campos e Gilberto Freyre Neto, escolhemos uma quarta-feira de março para visitar a Academia Sueca, onde fomos gentilmente recebidos pelo seu diretor geral, Odd Zschiedrich.
É uma emoção percorrer as instalações da entidade que atribui, anualmente, o Prêmio Nobel de Literatura. A Academia Sueca tem uma longa história. Foi fundada em 1786 pelo rei Gustavo III, com a finalidade de promover a língua e a literatura da Suécia, ainda hoje o seu principal objetivo. Nisso se assemelha à Academia Brasileira de Letras, que nasceu cerca de 100 anos depois, fundada por jovens escritores, sob a liderança do imortal Machado de Assis.
Conhecemos os seus corredores, as salas de trabalho, o plenário em que se reúnem, semanalmente, os 18 membros da Academia Sueca, a imensa biblioteca de 220 mil exemplares, com ênfase na moderna literatura e na linguística. Pergunto sobre obras em português e me são mostrados livros de Eduardo Lourenço, glória da literatura de Portugal. Quando pergunto sobre trabalhos de escritores brasileiros, é chamada a bibliotecária-chefe, que logo depois vem triunfalmente em nossa direção, com dois livros, um em cada mão, como se fossem as tábuas do profeta Moisés: Réquiem, de Lêdo Ivo, e Tempo de Espera, de Antônio Olinto. Passamos ao capítulo dos dicionários e vocabulários. Ergo os olhos para a estante e encontro os trabalhos de Cândido de Figueiredo e o Michaelis (Editora Melhoramentos).
Não encontro as obras fundamentais da Academia Brasileira de Letras. O administrador sueco fica ligeiramente embaraçado, mas não encontra o Dicionário nem o Vocabulário Ortográfico, que são nossas obras-primas. Prometo obsequiá-los, assim que voltar ao Rio de Janeiro (o que foi feito de imediato, via Sedex).
Falamos sobre o Prêmio Nobel de Literatura, a mais importante láurea mundial. Não só pelo valor pecuniário, mas principalmente pela repercussão no mundo da cultura. Criado pelo industrial e pesquisador Alfred Nobel, em 1895, destina-se a distribuir parte da sua grande herança por todos aqueles que tenham se destacado, no ano anterior, no mundo do pensamento. Passou a ser atribuído pela Academia de Estocolmo a partir de 1901, quando venceu Sully Prudhome (França), seguindo-se nomes mais ou menos conhecidos, entre outros, como Rudyard Kipling (1907), Romain Rolland (1915), Anatole France (1921), George Bernard Shaw (1925), Luigi Pirandello (1934), Gabriela Mistral (1945), Bertrand Russell (1950), Boris Pasternak (1958), Jean Paul Sartre (1964), Samuel Agnon (1966), Pablo Neruda (1971), Saul Bellow (1976), Isaac Bashevis Singer (1978), Camilo José Cela (1989), Octavio Paz (1990), Dario Fo (1997) e José Saramago (1998), este o primeiro e único em língua portuguesa.
A Academia Sueca destaca cinco dos seus membros, a cada três anos, para coordenar a escolha. O primeiro filtro passa por 350 especialistas que analisam indicações do mundo inteiro, inclusive da Academia Brasileira de Letras. Quando chegará a vez de um brasileiro?
Jormal do Commercio (RJ), 14/5/2010