Quando morreu Carolina, Machado de Assis compôs um dos mais belos sonetos em língua portuguesa. Sem extravasar a sua angústia, por ter perdido a doce companheira de trinta e quatro anos, Nabuco, o grande amigo de sempre, lhe escrevera para consolá-lo do rude golpe sofrido com a morte de Carolina.
Quis consolá-lo da morte da esposa e o fez com raro brilho epistolográfico. Não poderia ter sido mais grandioso nas poucas, amáveis e amigas palavras que ofereceu ao amigo de tantos anos.
Machado respondeu a Nabuco, acentuando que o amigo não avaliava a grande desgraça que se abateu sobre ele. "Foi-se a melhor parte de minha vida e aqui estou, só no mundo". Acrescentando que não há espaço que não acorde e a vigília aumenta a falta da pessoa amada.
É o sentimento que ocorre a todos que perderam o ente querido mais próximo de sua vida, a esposa, a solícita companheira que tanto pode na vida de cada um de nós.
Machado fala ainda que esperava a sua própria morte antes da morte da Carolina querida, e o destino quis o contrário. Machado já se considerava, como escreve, à beira da aposentadoria eterna, que ele iria passar com Carolina. "Irei vê-la que ela me espera. (...) É o que na esposa que agora me falta eu também espero ir vê-la, e juntos teremos a eternidade para continuar o doce e mágico convívio terreno". Quando um e outro cumpriu sua missão na vida, a missão imposta por Deus.
Ao encerrar sua carta, Machado pede desculpas ao amigo Nabuco que o releve, por faltar com esse dever, para ele sagrado. Ele queria, apenas, falar do rude golpe sofrido, e é o que fazia, tomando o tempo do confrade e amigo, falando, como vem no Evangelho segundo São Lucas, e, com outras palavras, "que a boca falava tudo de que estava cheio o coração". E este batia seu ritmo com o de Carolina, já no outro mundo à sua espera.
Reproduzo, sumuladas as cartas, por uma e outra responderem ao que sinto.
Diário do Comércio (São Paulo) 10/02/2005