O CONTO
Há muitos anos, vivia um homem que era capaz de amar e perdoar a todos que encontrava em seu caminho. Por causa disso, Deus enviou um anjo para conversar com ele.
– Deus pediu que eu viesse visitá-lo, e lhe dizer que Ele quer recompensá-lo por sua bondade – disse o anjo. – Qualquer graça que desejar, lhe será concedida. Você gostaria de ter o dom de curar?
– De maneira nenhuma – respondeu o homem. – Prefiro que o próprio Deus selecione aqueles que devem ser curados.
– E que tal trazer os pecadores para o caminho da Verdade?
– Isso é uma tarefa de anjos como você. Eu não quero ser venerado por ninguém, e ficar servindo de exemplo o tempo todo.
– Eu não posso voltar para o céu sem ter lhe concedido um milagre. Se não escolher, será obrigado a aceitar um.
O homem refletiu um pouco, e terminou respondendo:
– Então, eu desejo que o bem seja feito por meu intermédio, mas sem que ninguém perceba – nem eu mesmo, que poderei pecar por vaidade.
E o anjo fez com que a sombra daquele homem tivesse o poder de cura, mas só quando o sol estivesse batendo em seu rosto. Desta maneira, por onde passasse, os doentes eram curados, a terra voltava a ser fértil, e as pessoas tristes recuperavam a alegria.
O homem caminhou muitos anos pela Terra, sem jamais se dar conta dos milagres que realizava, porque – quando estava de frente para o sol, a sombra estava sempre nas suas costas. Desta maneira, pôde viver e morrer sem ter consciência da própria santidade.
O FATO
O místico Ramakrishna começou a dedicar-se à vida espiritual desde a idade de 16 anos. No começo, chorava amargamente por não conseguir nenhum resultado – apesar de sua dedicação ao trabalho no templo. Explicando mais tarde esta etapa de sua vida, ele disse:
“Se um ladrão passasse a noite em uma sala, com apenas uma parede fina separando-o de um quarto cheio de ouro, ele conseguiria dormir? Ficaria acordado a noite inteira, arquitetando planos. Quando eu era jovem, desejava Deus mais ardentemente do que o ladrão desejaria aquele ouro, e me custou muito a aprender a maior virtude da busca espiritual: a paciência.”
A REFLEXÃO
De Anthony de Mello, S.J. (Abandonar-se a Deus):
“Ficar em silêncio não é apenas deixar de falar, mas educar os ouvidos para escutar tudo que está a nossa volta. Mesmo no meio de um som estrondoso de uma orquestra, o bom maestro consegue reconhecer uma flauta que esteja desafinada; da mesma maneira, nós precisamos treinar nossa audição, até que ela seja capaz de ouvir a voz de Deus no meio do mercado.”
“O homem moderno considera o silêncio algo muito aborrecido. Acha difícil ficar quieto – está sempre ansioso para fazer algo, dar um conselho, colocar um trabalho de pé; e termina escravo de sua compulsão para agir.”
“Quando você se acostumar à quietude, quando conseguir passar alguns minutos do seu dia em silêncio, então terá realmente liberdade para decidir sobre sua vida. Diz o poeta Gibran: “Quando o seu pensamento não encontra raízes em seu coração, tende a ficar o tempo todo em sua boca.”
Diário da Manhã (GO) 4/2/2007