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São Bilibeu

 

Abril, chuvas mil. Maio, trovões e raio. Este é um ditado que se repete para definir o tempo das chuvas no Maranhão. O Padre Vieira foi quem primeiro definiu inverno/verão, o tempo das chuvas e o que não chove. Assim as estações, que no mundo são quatro, no Maranhão são duas. O diabo é que elas não coincidem nem com primavera, nem com verão, nem com outono, nem com inverno. No Maranhão se chama de inverno o tempo que chove, que vai de dezembro a junho, e de verão, o sem chuva, de junho a dezembro.

Isso faz com que as festas populares sejam influenciadas pelo tempo, e as estações de meteorologia, com as mudanças climáticas, não ajudam, não sabem mais prever as chuvas, que agora chovem no verão e nem sempre no inverno.

Evidentemente que o tempo tem influência em tudo, e as chuvas, muito mais. Nos folguedos populares do Maranhão, portanto, também. Como se entrelaçam com as datas festivas da Igreja, o carnaval é debaixo de chuva e o Natal é tempo de sol, embora as chuvas façam suas incursões, que a crença popular já conhece. Por exemplo, no 8 de dezembro, dia de Nossa Senhora, sempre chove, e se diz que é o princípio do inverno, bem como o 20 de janeiro, São Sebastião, é quando começam as chuvas de pingo grosso e as chuvaradas que quebram todas as normas e chovem as 24 horas do dia.

Girão Barroso, um poeta brilhante do Ceará, que passou uma temporada em São Luís, definiu a nossa cidade como sendo “uma ilha, cercada de água por todos os lados, inclusive por cima.”

Mas o que eu queria mesmo falar era das festas de São João, que aconteciam em junho. Já hoje se prolongam por julho e se antecipam pela metade de maio. Se justifica como o treinamento da brincadeira, como é chamado popularmente o Bumba meu Boi. Mais do que o carnaval, é um tempo de festa, tambores, com suas variedades de ritmos e de batuques, que hoje já têm autonomia própria: o Boi de Matraca, que é acompanhado por dois pequenos retângulos de madeira, que acompanham o ritmo da música; o Boi de Tambor, que foi copiado dos terreiros de mina e acompanham os ritmos de cada um dos tambores; o Tambor de Pandeiros, o boi de música de sopro, que começou em Axixá, com a variante do tambor tradicional, que era só de percussão.

Acredito que o Maranhão seja o Estado mais rico em folguedos populares. De tudo o povo tira pretexto para criar uma brincadeira encantada, com suas histórias próprias.

Quem primeiro descobriu a riqueza do folclore maranhense, representado por essas imensas festas populares, foi Mário de Andrade, que, quando aqui passou, colheu o grande material que enriquece o Centro Cultural São Paulo. Hoje a eletrônica e outros meios de criação dos sons fizeram com que os ritmos se multiplicassem e cada um desses tomasse seu rumo próprio. E eu fiquei surpreendido, nos meus 93 anos, com São Bilibeu ainda vivo, fazendo safadezas na Baixada, onde também tem o nome de Santo Horácio, que desembarcou na casa de Antero Roxo, durante uma festa de carnaval, num lugar chamado Santeiro, no município de Viana, na Baixada Maranhense, região de lagos e campos, onde eu também nasci, na cidade de Pinheiro.

Ele é saudado “Bico-Bilico, bili-Bilibeu, santinho assanhado, calunguinha de breu!” A festa se mistura com o carnaval e tem motivos religiosos e africanos. Segundo Albani Ramos, Bilibeu é um santinho namorista, cujo trabalho pesado é mamar nos seios apojados das mulheres, depois de lhes garantir a mais impossível gravidez. Veste-se como homem, mas não tem preconceitos: também aparece como mulher. Afora isso, o santo protege os bichos de casa, os doentes e os perdidos. E as pessoas lhe fazem promessas e oferecem crias dos bichos que Bilibeu curou ou encontrou. E conclui Albani: “Aí o negrinho responde pela farra, que vai do Domingo à Terça-Feira Gorda, com levantamento de mastro, baile e ladainha, recitada num latim estropiado, conforme pertence a um festim carnavalesco.”

Mas o que quero dizer é que o carnaval e o São João do Maranhão são os melhores e mais autênticos do Brasil, com o Tambor de Crioula, o Curiá da dona Tetê e o carnaval, que traz modos e gingados, desde o tempo em que açorianos saltaram no Brasil com o boi que se derramou pelo Brasil no Boi Bumbá do resto do Nordeste, no Boi de Mamão de Santa Catarina e no nosso Bumba meu Boi, acompanhado do Tambor de Crioula, com as dançantes de saia rodada.

Imirante, 11/07/2023