A cada dia somos surpreendidos com incríveis inovações na educação brasileira. Tudo é tão estranho que parece uma armação para que continuemos a patinar nas piores classificações internacionais de qualidade do ensino.
Cresce a nossa economia, estamos na lista das dez maiores nações do mundo, chega-se a pensar na escolha do Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, mas há como que uma força que impele a educação para trás.
O jornal "O Dia", do Rio de Janeiro, denunciou que o Ministério da Educação aprovou para compra uma obra inacreditável de língua portuguesa, destinada a alunos do EJA (Educação de Jovens e Adultos). Trata-se do livro "Por uma Vida Melhor", da coleção Viver e Aprender, adotado por 4.236 escolas públicas de todo o país e destinado a alunos do antigo supletivo do sexto ao nono ano (volume 6). Quase 500 mil exemplares.
Nele vem a clássica exploração, naturalmente demagógica, do que se entende por expressões populares. Um bom exemplo é o "nós pega o peixe". Os autores se defendem com a afirmação de que podemos também adotar, em lugar da norma culta, a norma popular da língua portuguesa, o que francamente não existe, sobretudo quando se examina o sentido pedagógico da escola, como instrumento de elevação cultural.
Se alguém disser, como querem os autores da obra citada, "os livro ilustrado mais importante estão emprestado", quando o aluno for vitimado por essa construção linguística, não se poderá alegar preconceito contra ele. É uma forma de falar ou de escrever que irá esbarrar na necessidade de aprendizado da norma culta, aquela que é utilizada em concursos e testes de todas as maneiras.
Brinca-se muito com a frase "um chops e dois pastel", que seria corrente na vida do paulistano. Isso é objeto de gracejos e ninguém vai defender essa maneira de falar como sendo expressão popular. É ignorância propriamente dita. Variações linguísticas são defensáveis, afinal temos um país em que prevalece a diversidade cultural, mas tudo tem seus limites.
O pior mesmo é quando isso é adotado oficialmente, fazendo da exceção a regra e, o que é mais grave, levando à desmoralização do pretendido pelo EJA, um programa crescente, destinado a alunos vitimados pela distorção idade/série em nossas escolas.
Sobra razão à professora Alzira Batalha, da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), quando afirma que "livros como esse reforçam a exclusão social." Quando o aluno assim (des)preparado for levado a um teste de emprego, sem falar em concursos, será logo discriminado. Se ele, ao se defender, disser que aprendeu a falar dessa maneira na escola, pouca gente acreditará na verdade da afirmação.
Todo autor tem liberdade de expressão, assegurada pelos princípios democráticos da Constituição brasileira. Cabe ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), no entanto, escolher as obras mais adequadas à nossa realidade. Encher os municípios de livros que procuram os caminhos tortuosos da nossa língua é medida despropositada. A menos que exista mesmo uma armação para se chegar ao quanto pior, melhor.
Jornal do Commercio (RJ), 20/5/2011