Portuguese English French German Italian Russian Spanish
Início > Artigos > Os voos de Ari Vidal

Os voos de Ari Vidal

 

Foi um desses convívios inesquecíveis.  Éramos jovens, pouco mais de 10 anos de idade,  e nossas famílias tiveram a mesma ideia de nos matricular no ginásio do Colégio Vera Cruz, na rua Hadock Lobo, na Tijuca.  Frequentamos as mesmas turmas, a partir da primeira série, e a lembrança dos professores por vezes nos unia, em papos agradáveis.  Lembra do Afro? E do dr. Oswaldo?  (ríamos porque ele era médico e dava excelentes aulas de matemática).  E a d. Maria da Conceição, que lecionava desenho e chamávamos de dona Teteca? Bons tempos, bons tempos.
                                              
A escola tinha um enorme campo de futebol.  Nossas aulas de educação física eram animadíssimas peladas, apitadas pelo prof. Adair.  Eu jogava no meio do campo, com um fôlego elogiável, e o Ari Ventura Vidal agarrava no gol, alto que era, com uma competência extraordinária para a sua idade.  Tinha  muita elasticidade e seus voos em busca da bola se tornaram célebres.  Acabou ganhando o apelido de “Ari Borboleta”.
                                             
Anos depois, encontramo-nos novamente, no campeonato carioca de basquetebol (categoria juvenil).  Ele atuando pelo Tijuca T.C., eu defendendo as cores do América F.C.  Houve um fato histórico: o AFC, arrancando recursos não se sabe de onde, resolveu construir o seu ginásio, no espaço paralelo à rua Gonçalves Crespo.  Era o fim da quadra de saibro que dava para a famosa barreira de Campos Sales.  Jogo de estreia: América x Tijuca.  Lá estavam os dois colegas e amigos, um de cada lado.  Lembro que o primeiro arremesso da partia foi feito pelo Ari.  A bola bateu no aro e voltou para as minhas mãos.  Corri para o garrafão adversário e, pressentindo a brecha, entrei por ali e arremessei.  A  bola  bateu na tabela, quicou no  aro, e sobrou para o altão Arnolfo Pimenta de Melo (de uma família de atletas) e ele, com um leve toque, inaugurou o marcador do novo ginásio.  Eu e o Ari, depois comentando, revelamos a nossa frustração pelas chances perdidas.
                                           
A vida seguiu para cada um de nós e ele se tornou um belíssimo treinador de basquetebol.  Foi medalha de bronze no Mundial de Manila, em 1978, e conquistou o título do Pan, em 1987.  Numa decisão épica, o Brasil venceu os Estados Unidos, em seu território, por 120 a 115, com atuações espetaculares de Marcel e Oscar, que se tornaram, graças à inteligente estratégia de Ari, os reis do garrafão.
                                           
O meu amigo foi técnico do Tijuca, Flamengo, Vasco, Fluminense, Minas e Cortinthians de Santa Cruz do Sul(RS), pelo qual foi campeão brasileiro de 1994.  Comandou a seleção masculina brasileira em 16 competições, sempre com muita argúcia, duas delas nas olimpíadas de Seul-1988 (5º lugar) e Atlanta 1996 (6º. Lugar).  Também dirigiu a seleção brasileira feminina em 11 partidas, vitorioso em 8 delas.  Com ele, nossos times se tornaram mais agressivos, arriscando  mais as cestas de três pontos.  Teve  no treinador Kanela o seu modelo de técnico.  Tentou fazer um timaço no América, mas não lhe foi dada a devida cobertura.  Morreu aos 77 anos de idade, bem antes do tempo, mas com uma carreira brilhante de jogador e técnico.  Deixa saudade.

Folha Dirigida (RJ), 7/2/2013