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Opinião: Chávez em seu labirinto

 

Quando discutíamos com Alfonsín e Sanguinetti, em 1985, o que seria a integração da América Latina, a começar pelo Cone Sul, duas coisas surgiram como excludentes de quaisquer outras: a democracia e o crescimento. Era um tempo em que quase a maioria dos países desta área eram ditaduras. Tínhamos duas pedras grandes em nosso caminho: o Chile de Pinochet e o Paraguai de Stroessner. A cláusula democrática os excluiu, apesar de participarem do nosso espaço econômico e geográfico. A democracia era prioritária. Eu mesmo afirmei nas Nações Unidas que o caminho do desenvolvimento passava pela democracia. "Crescer juntos" foi nosso slogan.


Com esse pensamento tive meu primeiro contacto com Stroessner quando fomos inaugurar a implantação das turbinas de Itaipu. Tinham feito na gigantesca obra um local reservado para uma conversa a dois. Nessa oportunidade, com muito jeito, comecei a falar com o general presidente sobre os novos tempos e com habilidade coloquei-lhe o tema da "democracia". Falei da necessidade de termos uma América Latina com respeito aos direitos civis e humanos, liberdade e justiça social e que ele devia promover a abertura política em seu país. Ouviu-me em silêncio e depois, com voz pausada, começou a dissertar sobre as excelências do regime democrático, de suas virtudes e de sua necessidade. Em seguida iniciou uma longa explanação sobre a "democracia paraguaia", o funcionamento dos partidos blanco y colorado e do apoio que ele tinha tido nas últimas eleições: 95% dos votos. "Presidente Sarney, o Paraguai não é nada disso que dizem. Somos uma democracia avançada…". Mas não deixou de acrescentar: "O que não posso é agradar todo mundo. Querer isso é o caminho da desordem".


Fiquei encabulado. Parecia até que era eu o defensor das ditaduras diante do grande liberal. Os anos de poder absoluto o tinham embutido de tal modo que fiquei com a convicção de que ele acreditava no que estava dizendo.


Relembro esta pequena história para dizer que acho que até Chávez acredita no que está dizendo: "Pátria, socialismo ou morte". E no "verdadeiro regime do século 21" que ele está fazendo: sem oposição, sem Congresso livre, governando por decretos, sem tribunais independentes, sem liberdade de imprensa e com direito a reeleições sucessivas. Aterrou-me sua declaração de que "a revolução na Venezuela é pacífica, mas não desprovida de armas", numa ameaça que devemos colocar de molho com os foguetes que comprou. Lembro Lênin: "Camaradas, agora não necessitamos de oposição, é melhor discutir com os rifles".


Essa é a democracia bolivariana? Acho muito parecida com a que me descreveu Stroessner.


Jornal do Brasil (RJ) 12/1/2007