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Mandato de cinco anos trará instabilidade

 

O TEMA relativo ao mandato de cinco anos para presidente e governador parece empolgar certos segmentos da política brasileira, inclusive integrantes do Congresso Nacional. Nosso país já viveu no passado essa nefasta experiência. Daí a necessidade de recordarmos os graves inconvenientes e as repercussões sabidamente adversas a exigir um exame acurado da lógica do modelo de calendário eleitoral adotado na Constituição de 1988.


Não vou aludir aos 40 anos em que vivemos sob a égide da Constituição de 1891, a primeira Constituição republicana. Tomarei como marco inicial o período que se convencionou chamar de República Liberal, sob o regime da Constituição de 18 de setembro de 1946, que vigorou até 1967.


O imprevisto dos fatos políticos ocorridos entre a convocação das eleições em 28 de maio de 1945 e a deposição do presidente Vargas em 29 de outubro explicitou a precariedade do calendário eleitoral adotado pela Constituinte: mandatos de cinco anos para o presidente e alguns governadores; de quatro anos para outros governadores; de oito para senadores; e de quatro para deputados federais, estaduais, prefeitos e vereadores.


O mesmo ocorreu na vigência da Constituição de 1967 e da emenda nº 1, de 1969. Sob o regime militar, a supressão das eleições diretas para a escolha do presidente da República, de governadores, de prefeitos das capitais, dos municípios declarados de interesse da segurança nacional e dos localizados em faixa de fronteira reduziu drasticamente o direito de sufrágio. Mas nem por isso se racionalizou a sucessão dos pleitos eleitorais, apesar de a duração dos mandatos dos governadores ter sido unificada em quatro anos.


Com a Constituição de 1988 e a emenda constitucional de revisão nº 5, de 1994, terminamos, finalmente, por adotar o atual calendário, cuja lógica se baseia na realização de eleições a cada dois anos, separando as eleições gerais dos pleitos locais. Com esse recurso, nem se municipalizam as eleições nacionais e regionais, nem se federalizam os pleitos municipais, e assegura-se que as escolhas dos chefes do Poder Executivo ocorram concomitantemente com as dos membros do respectivo Legislativo.


Incluir um mandato presidencial de cinco anos nesse modelo implica realizarmos três eleições a cada quatro anos, o que vai gerar os mesmos inconvenientes sob os quais vivemos no regime da Constituição liberal de 1946. Como conseqüência, o país ficará sempre dominado pelo fator eleitoral e teremos significativo aumento de despesas não somente com a mobilização da Justiça Eleitoral, dos partidos políticos, mas também por causa da propaganda supostamente gratuita em rádio e televisão.


Ademais, se formos olhar as grandes crises institucionais brasileiras, a partir da segunda metade do século 20, vamos verificar que guardam relação com a falta de racionalização do calendário eleitoral.


O suicídio de Getúlio Vargas ocorreu, talvez, em razão de dificuldade crescente no seu relacionamento com o Congresso Nacional, agravada pelas eleições de governadores com mandatos de quatro e de cinco anos.


Jânio Quadros, quando tomou posse na Presidência da República, encontrou Congresso anteriormente eleito, majoritariamente em oposição, o que o levou à renúncia, provocou grave crise institucional e o estabelecimento de um parlamentarismo de ocasião.


Por fim, tivemos o impeachment de Fernando Collor. Eleito em 1989, tomou posse em 1990. A seguir, em outubro de 1990, houve eleição para membros do Congresso, que tomaram posse em 1991. Esse Congresso estava em franca divergência com o presidente, que adotara uma série de medidas de repercussão negativa na sociedade brasileira, inclusive o confisco de ativos. Tudo isso levou novamente a um impasse entre o presidente da República e o Congresso.


A democracia brasileira, tantas vezes testada e tantas vezes vítima, requer, de nossa parte, ponderação, equilíbrio, serenidade e, sobretudo, a consciência de mantermos a racionalidade do calendário eleitoral vigente.


Folha de S. Paulo (SP) 19/4/2008