Os palavrões e grosserias com que o presidente da República ofende a população desde a sua posse empalidecem se comparados à agressividade do deputado Eduardo Bolsonaro ameaçando reeditar o AI-5 em caso de “radicalização da esquerda”. Comparável só os elogios recorrentes do próprio presidente ao coronel Brilhante Ustra. Trata-se, em ambos os casos, do elogio de uma ditadura que a democracia proscreveu. Alguém ainda duvida da empatia de pai e filho com o regime autoritário?
Ambos usam palavras como armas com que ferem a dignidade das vítimas do AI-5 e da tortura e a de todos os democratas, não só os que viveram aqueles tempos tenebrosos, também os que hoje não renunciam a um futuro com liberdade.
A ameaça é a expressão máxima de uma escalada de brutalidade verbal que vem se acumulando no debate político, sobretudo no campo virtual, transformado em praça de guerra. Envenena o espaço público, contamina a vida privada, divide famílias, separa amigos.
É difícil dizer quando e por que isso começou. É provável que a impunidade garantida na internet pelo anonimato tenha facilitado essa deriva. Valentões são mais valentes quando não mostram a cara, usam pseudônimos, programam robôs para distribuir insultos.
A violência, dando o tom da convivência, pavimenta o caminho da ditadura. Interessa aos autoritários. Aumentar a temperatura dos conflitos é uma estratégia diabólica. Último ato, nomear para a Secretaria de Cultura o cidadão cuja qualificação é ter insultado Fernanda Montenegro.
A resposta democrática de quem não é boçal e recusa o embrutecimento é defender e ampliar os espaços de civilidade. A violência verbal, como as ameaças, é o prenúncio da violência física. As mulheres que apanham que o digam.
Implícita na civilidade está uma ética que começa em cada um e ganha substância na relação com os outros: família, amizades, amores, redes de pertencimento. A civilidade não é apenas uma virtude privada. Hoje é também um ato de resistência. A civilidade é a linguagem da democracia.