-Você usa Viagra?- Viá...? Viagra? Ah, sim, não, não uso, só vi uma vez, na mão do João Pato, que me disse que também não usa, era uma amostra grátis que um médico amigo tinha dado a ele. Feliz-mente nunca precisei, não gosto de tomar remédio, melhor ficar no natural. De vez em quando eu tomo um chazinho de catuaba, mas é mais pelo efeito revigorante. Mas não tenha dúvida: se precisar, eu uso, não acho nada demais, é uma conquista da ciência moderna que a gente teve a sorte de ainda pegar.
- É, pois é, eu também não tomo. Você vê assim, tou chegando a 7.2, mas não tenho problema nenhum nessa área. Não vou te dizer que funciona igual a no tempo em que eu traçava o mulherio de meio Rio de Janeiro...
- Menos, cara, menos. Tá certo que tu tinha cartaz com as mulheres, tirava uma onda de Robert Taylor e tinha um De Soto conversível hidramático cheio de chinfras. Lembro uma vez nós dois no carrão e aquelas duas alemãs malucas no Joá, tu te lembra? Ah, nada substitui aqueles tempos... Sim, mas tu também não passou pelas armas meio Rio de Janeiro. Algumas eu sei, mas...
- Ah, tu não sabe de nada. Minha especialidade era mulher de aliança no dedo, as mais fáceis, sem o problema da virgindade que tinha naquela época. Mas tinha que ter discrição, garçonnière caprichada, bons relacionamentos em todas as áreas, não era coisa para qualquer um, não. Hoje não tem mais nada disso, não existe romantismo, aquele chamego que dá tanto molho à relação. Eu te digo sinceramente, não me interesso mais nem por ver essas mulheres peladas das revistas, acho que vulgarizou demais, não há um certo mistério, que tinha seu grande valor, vamos convir. Se me interessasse, não ia ter problema, pegava aí uma menina de seus quarentinha, na idade em que a mulher é mais mulher, numa boa. Conheço vários lugares onde você entra e tem mulher saindo pelo ladrão, tudo a fim de uma boa conjunção carnal, como diz o Chico. E é como eu te falei, no natural, nada desses trecos, eu sou safenado, sei lá se esse negócio não me afeta. Mas é que eu não me interesso mesmo.
- Você tem razão, as mulheres andam loucas por homem. Essa geração nova, esses caras que vivem pra malhar, tudo tomando anabolizante, os caras não são de nada. Eu almoço muito ali perto do edifício Avenida Central, tem uma turma de moças que trabalha num daqueles lojões e elas me contam sempre que os caras gostam mesmo é de olhar pro espelho, que não querem nada mesmo, são broxas de corpo e mente, é horrível. Ali, no dia que eu quiser...
- Você está coberto de razão. É uma coisa impressionante. A gente passa em certas ruas, tudo quanto é boteco, de todas as classes, cheio de mulher, mas desacompanhadas, ou senão acompanhadas de um mais velho, um careca esperto, um gordinho baixinho, elas encaram qualquer coisa, a escassez é grande. Inflação de demanda, como diriam lá no escritório.
- Pra não falar no aspecto financeiro, não esqueça isso, nunca esqueça o valor de um cartão de crédito. Eu tenho vários e um especial, que não tem medo de nada, internacional, sem limite. Quando é que esses frangotes, como dizia o meu velho, quando é que esses frangotes vão poder levar uma mulher aonde a gente pode levar, a começar pelo restaurante e a terminar pela suíte imperial do motel?
- É, nunca, nunca. No nosso tempo não tinha motel, mas mulher sempre gostou de grana. Aliás, quem não gosta? Ainda mais grana gasta sem suar nada para ganhar, ali à vontade, como ela nunca ia ver desses caras que só falam em surfe e rock com um vocabulário de 16 palavras. O dinheiro da maioria mal dá pro chiclete que eles parecem que têm por obrigação mastigar o tempo todo. Chega a dar pena.
- Era isso que eu ia dizendo, eu também sinto pena dessa juventude desperdiçada, desses meninos que não sabem aproveitar a vida. E as dificuldades que eles enfrentam? No nosso tempo, qual era a doença que a gente pegava com certas mulheres? Tudo besteira, gonorréia, sífilis muito dificilmente e por aí a gente ficava. E tinha chato também, você teve chato?
- Não, nunca tive.
- Nem eu. Aliás, nem gonorréia eu tive, não tive nada mesmo. E hoje o que é que você vê? A maioria desses meninos e meninas de hoje nunca transou sem camisinha¡ Tu já imaginou um negócio desses? De camisinha sempre, cara, que tragédia¡ Até hoje eu não suporto esse troço, que no nosso tempo era até palavrão e ninguém tinha coragem de comprar quando a balconista era mulher. E, mesmo com homem, era cochichado.
- É mesmo, faz pena. Toda essa liberdade e tanta limitação.
- Já imaginou o mulherio assim liberado, no nosso tempo?
- Nem me fale, não gosto nem de pensar.
- Você tem pegado alguma gatinha ultimamente? Duvido que sua pinta de Cesar Romero não faça sucesso.
- Não, não tenho.
- Mas, nos lugares que você freqüenta...
- Pois é, tem muita mulher. Se eu quisesse, qualquer daqueles brotinhos ia sair comigo numa boa. É que eu não gosto de mulher de cabeça oca.
- Pois é, nem eu. E é só o que você encontra. De um lado umas mulheres burras, que não sabem nem onde fica Paris. Do outro, esses rapazes quase efeminados, assexuados, narcisistas, que não se interessam por mulher. Quer dizer, se não fossem os homens de nosso tope, a situação delas seria desesperadora. Dá pena mesmo, essa juventude.
O Globo (RJ) 1/6/2008