Enquanto a Europa em crise está majoritariamente em mãos conservadoras, a América Latina pende à esquerda e vai cada vez melhor. A crise americana de 2008 — que está agora abrindo o capítulo da guerra cambial — atingiu todo o mundo.
Nós aqui na América Latina tínhamos feito o que os neoconservadores chamam de "lição de casa", e começávamos um processo de crescimento mais acelerado, ainda não no ritmo chinês ou indiano, mas suficiente para conseguirmos uma redução significativa da pobreza.
A Europa viveu a crise de absorção dos países do Leste, libertos do jugo soviético, e as dolorosas guerras dos Bálcãs. Os conservadores foram aos poucos tomando o poder.
A esquerda persistiu na Espanha, na Grécia e em Portugal, onde a crise se destaca. O problema talvez se explique em parte porque a esquerda europeia, que tinha como centro de sua política a conquistas das grandes reformas do Estado, perdeu o fôlego e abandonou esse tema, tomado pelos neoliberais, que encontravam pela frente os poderosos estados do bem-estar social montados ao longo do século e que garantiam uma qualidade de vida que podia ser considerada a melhor do mundo.
Por outro lado os neoliberais europeus foram, numa primeira fase, muito bem sucedidos em suas reformas, que tinham como centro a redução do tamanho do Estado, sem atingir o núcleo da proteção social.
Na América Latina, a vigência do neoliberalismo, com a exceção que foge à regra do Chile, foi muito menos bem sucedida.
Se por um lado conseguiu ordenar as bases financeiras e monetárias que permitiram a retomada do crescimento, por outro lado tiveram um crescimento muito reduzido ou mesmo negativo, que impactou cruelmente as populações mais pobres e a classe média, tornando-as atraídas pela promessa — em muitos casos bem sucedida, de um modelo de desenvolvimento que implicasse em ascensão social.
Volto à Europa: no seu documentário sobre saúde — Sicko - SOS Saúde —, Michael Moore, ao denunciar o modelo americano de bem-estar social, apresenta o sistema hospitalar inglês como exemplo de atendimento em que todos os que precisam recebem um atendimento de qualidade sem ter que pagar nada.
Os franceses, agora, resistem ao aumento de dois anos na idade mínima para aposentadoria, mas têm um sistema de 35 horas semanais de trabalho. São uns poucos exemplos em que o "wellfare state" sobrevive às reformas neoliberais.
No Brasil, nós conseguimos um extraordinário progresso entre os mais pobres. Mais de 30 milhões cruzaram a linha de pobreza. Mais de 14 milhões de empregos foram gerados. A classe média passou a comprar bens com que há muito sonhava.
A esquerda da América Latina na verdade se divide em duas. Uma populista, declaratória, assistencialista, a de Chaves. Outra a de Lula, responsável, segura, cumpridora dos seus compromissos externos e internos, que estabelece um padrão de confiança.
Esta é a esquerda que ultrapassou a direita e avança com êxito em busca de novas condições de vida.