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Deputado gosta de apanhar

 

No passado, dizia-se que mulher de malandro apanhava e gostava. Hoje sabemos que ela não reagia porque não podia. Mas aquela história pode ser contada em nossos dias, tendo no papel os deputados brasileiros. Segundo arrotos recentes de Bolsonaro, a Câmara "já assegurou o quorum para aprovar o projeto de lei" que anistia os terroristas do 8/1 —anistia que se estenderia num perdão a ele próprio. Essa maioria inclui, diz ele, além dos deputados de oposição, outros pertencentes a partidos nominalmente aliados do governo.

Se isso é verdade, a Câmara mereceu que arruaceiros golpistas invadissem e depredassem suas dependências e cuspissem e urinassem em suas bancadas. Diante de tal quadro, mesmo dois anos depois, jamais poderia haver uma composição política para passar o pano. A instituição que eles representam foi aviltada como nunca na história e, se eles acham que isso pode ser ignorado, é porque são indignos de se sentarem em suas cadeiras e tão vis quanto os baderneiros que a atacaram.

A alegação de que é "injusto condenar a 15 ou 17 anos de prisão mães de família e senhoras de Bíblia na mão" deixará também muito mal os machões que se organizaram, se armaram e partiram para a destruição, sob as vistas grossas de militares simpáticos a suas causas e seus métodos. Afinal, a anistia a esses brutamontes se dará na esteira da anistia àquelas senhoras tão inofensivas. A valentia por trás da farda é compreensível. Mas por trás das saias de pias donas de casa, de avental sujo de ovo?

Já o Exército deverá ter uma atitude mais digna diante de seus acusados. Não reagirá à denúncia de generais metidos em conspirações que envolveram tentativa de golpe de Estado e assassinatos. É a única maneira de mostrar que não foi a Arma que se deixou corromper por Bolsonaro, mas apenas alguns de seus maus membros.

Em breve saberemos se os 15 ou 17 anos de cadeia foram justos ou exagerados para os instigados por Bolsonaro. Vai depender de quantos anos caberão ao próprio Bolsonaro.

Folha de São Paulo, 19/02/2025